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FOTOCRÔNICA: Leonam, o sol te aplaude

FotoCrônica 3/5/2023 | Foto: Carlos Monteiro

O astro-rei nunca recebeu homenagem tão merecida em seu ocaso. Numa tarde de semana de verão Rio 40°, nos idos de 1968 - o ano que não terminou - lá no Posto 9, nas ainda não Dunas do Barato, Carlos Leonam, acompanhado nada mais, nada menos de Jô Soares, João Saldanha, Glauber Rocha, Leila Diniz e metade da intelligentsia carioca da época, com sua irreverência elegantíssima bradou: "Moçada, esse pôr do sol está tipo exportação, merece uma salva de palmas". Imediatamente levantou-se e começou a aplaudir, entusiasticamente, aquela profusão de raios e cores, aquela bola de fogo esmaecida que se escondia no mar, por detrás dos Dois Irmãos. Foi seguido, inicialmente pelos amigos e, imediatamente por toda a moçada que por ali estava.

Ficou a tradição até hoje. Não há quem não se admire, menos os cariocas, é claro, com uma praia de Ipanema lotada, em um domingo de verão nas areias escaldantes, daquela república das mais democráticas do Planeta, com a atividade 'palmistica', aquela louvação que emana dali e se estende até o Pontal, numa espécie de frenesi em total êxtase daquela gente bronzeada, daquelas meninas coloridas pelo sol.

Esta e tantas outras histórias encantadoras ouvi em nossos muitos almoços regado à umas (muitas) caipivodkas, alguns tira-gostos e uma carne de sol de comer rezando, no bar Palinha situado no bucólico Largo dos Leões, no bairro carioca do Humaitá onde residimos.

Sempre muito bate-papo que se estendiam pela tarde toda, piadas, discussões acaloradas sobre futebol, em que eu o provocava por ser tricolor ferrenho como o Anjo Pornográfico Nelson Rodrigues, histórias do jornalismo e da fotografia, histórias de vida do cara que foi um dos fundadores do Pasquim.

Uma delas me marcou profundamente pela sua poesia filosófica. Contou-me ele que um belo dia resolveu pegar seu intrépido Fusquinha e se arribar para as terras baianas de Arembepe, acompanhado de Glauber Rocha e Miguel Paiva. Oras tantas, como costumava dizer, Glauber olha para todos e diz: "Este carro é o mundo, é a essência da vida!". Sem entenderem concordaram e o mago do cinema prosseguiu profetizando: "Aqui dentro é o presente, à frente, no para-brisa, está o futuro que chega e no retrovisor está o passado que se foi. Tudo em uma velocidade estonteante; assim é a vida, não existe o agora!".

Meu amigo-irmão se foi, está pelo firmamento com Ziraldo e Millor preparando um furo intergaláctico: vão fotografar e entrevistar Deus num pôr do sol tipo exportação do Universo.