Por Rodrigo Fonseca
Especial para o Correio da Manhã
Nenhum dos filmes que você vai descobrir nesta página se encaixa no rótulo de "Originais" que as plataformas digitais aplicam a produções que foram gestadas por elas e para elas, mas eles só chegaram ao Brasil graças à streaminguesfera, passando batido pelo circuito, pesar de todos os prêmios em seus currículos.
CONCORRÊNCIA OFICIAL ("Competência Oficial"), de Mariano Cohn e Gaston Duprat: Saído da competição pelo Leão de Ouro de Veneza, em 2021, esta hilariante comédia da dupla de argentinos por trás de "O Cidadão Ilustre" (2016) correu San Sebastián, Cairo e Tribeca antes de chegar no streaming. Penélope Cruz tem uma atuação arrebatadora vivendo uma abilolada cineasta de vanguarda que atrai dois atores de perfil distinto, um politizado interprete de peças de resistência (Oscar Martinez) e uma vedete dos holofotes (Antonio Banderas), para estrelarem um filme com pretensões autorais. O set com eles vira um campo de batalha. Está na grade da Star .
PLEASURE (2020), de Ninja Thyberg: Uma polêmica imersão da realizadora sueca na indústria pornô a partir da chegada de uma escandinava, Bella (Sofia Kappel), ao mercado audiovisual do sexo. Divas do setor como Dana DeArmond e (a diretora) Aiden Starr fazem participações no elenco do longa, que faz uma leitura ácida da submissão em um universo criativo alheio às regras da correção política. Tá na MUBI (www.mubi.com)
WOLFWALKERS, de Tomm Moore e Ross Stewart: A Apple trouxe pra cinefilia brasileira este exuberante desenho que concorreu ao Oscar de Melhor longa de animação, em 2021. Na trama, uma jovem caçadora aprendiz e seu pai viajam para a Irlanda para ajudar a acabar com a última matilha de lobos. Mas tudo muda quando ela faz amizade com uma garota misteriosa que, segundo os rumores, transforma-se em um lobo à noite e faz parte de um povo fera.
O BOM PATRÃO ("El Buen Patrón"): A Star trouxe para o Brasil a comédia espanhola que ganhou seis troféus Goya, incluindo o de Melhor Filme e Melhor Ator, coroando o talento de Javier Bardem. Ele exulta trapaça no papel de Hernán Blanco, dono de uma metalúrgica que se faz passar por um pai para seus empregados, mas é capaz de explorar a boa vontade deles sem nenhum pudor. Da mesma forma, ele disfarça seu sexismo numa postura avessa a práticas machistas, mas abusa das mulheres que o cercam, em nome do prazer. Uma funcionária (Almudena Amor) vai ser alvo de sua lábia, abrindo precedente para uma discussão sobre desrespeito e inequidade de gêneros no ambiente profissional.
FURIOZA (2022), de Cyprian T. Olencki: Chove adrenalina sobre este thriller baseado nos hooligans, gangues associadas a torcidas de grandes times que espalham a violência. Numa Polônia onde a corrupção corre solta, uma policial, Dzika (Weronika Ksiazkiewicz, impecável em cena), tem que recorrer a um amor do passado, o médico David (Mateusz Banasiuk), para que ele possa se infiltrar numa organização de lutas clandestinas de seu irmão, a fim de delatar crimes que são encobertos pela brutalidade em estádios. A narrativa é vertiginosa e aprofunda dilemas morais para cartografar as mazelas de seu país. Tá na Netflix.
GREAT FREEDOM ("Große Freiheit"), de Sebastian Meise: Este chegou a ser exibido no RJ, pelo Grupo Estação, durante o Dia dos Namorados, mas saiu de lá diretamente para a MUBI. Laureado com o Prêmio do Júri da seção Un Certain Regard, esse drama de época reconstitui a homofobia alemã no pós-guerra, centrada numa interpretação genial de Franz Rogowski. Em sua narrativa, Meise revisita um delito estatal da Alemanha: a criminalização da homoafetividade, encerrada só nos anos 1990. Seu protagonista é Hans Hoffmann (papel de Franz), que, repetidamente, é encarcerado por ser homossexual. A única relação estável na sua vida torna-se o seu companheiro de cela, Viktor (Georg Friedrich). O que começa com a repulsa transforma-se em uma paixão, que nasce silenciosa e violenta.
A VERDADE ("La Verité", 2012), de Hirokazu Kore-Eda: Filme de abertura do Festival de Veneza de 2019, convidado para o evento na esteira da consagração de seu realizador com a Palma de Ouro de 2018, dada a seu "Assunto de Família". Chega pra gente via HBO Max. Aqui, Kore-Eda dá uma pausa em seu idioma de berço, o Japonês, e investe em sotaques americanos e franceses. Catherine Deneuve brilha em cena no papel de Fabienne, estrela dos palcos e das telas, muito vaidosa, que vai lançar sua autobiografia. Porém, o conteúdo do livro preocupa sua filha, a roteirista Lumir (interpretada por Juliette Binoche), e seu genro, o ator Hank (encarnado por um Ethan Hawke em estado de graça). O medo do casal envolve o tipo de revelação que Fabienne possa fazer em relação a seu pretérito, imperfeito até o tutano.