Por: Livia Maria
Três dias após serem acordados com suas casas inundadas pelo rio Capibaribe, a comunidade B13, no bairro da Várzea, no Recife, agora encontra acolhimento e assistência nas salas de aula, no pátio e na cantina de uma escola do bairro que foi transformada em abrigo temporário.
No fim da tarde desta terça-feira (31), o número de mortes na região metropolitana da capital pernambucana subiu para 106, com 10 pessoas ainda desaparecidas. Coordenadores dos abrigos tentam garantir que os sobreviventes tenham acesso a alimentação e medicamentos e um espaço para dormir.
Responsável pelo abrigo improvisado na escola municipal Celia Arraes, Ana Beatriz da Silva diz que atualmente 75 pessoas estão no local, incluindo 19 crianças -o número total aumento na hora da refeição.
A maior parte de quem está ali mora a há décadas na região e relata ter passado por momentos de tensão por causa das chuvas. "Foi tão rápido, não deu tempo de levar nada. Eram 5h, já levantamos com todos gritando, juntamos o que deu e saímos de casa", conta Joselma Pereira de Lima, 44, que chegou na comunidade ainda criança.
Desde segunda-feira (30), dois recreadores infantis voluntários têm ido à escola pela manhã e à tarde para entreter as crianças, que tem acesso ao parquinho da escola. São três horas em cada turno ao lado dos pequenos moradores da B13, que se lembram dos brinquedos, livros escolares e outros pertences que perderam na enchente.
Nelson Roberto, 47, é um dos monitores e diz que uma das crianças fez um desenho do momento em que a água subiu em sua casa. "A gente pediu para eles desenharem e ela fez a cheia, fez o redemoinho da água com vários objetos. As águas, os móveis, os objetos saindo e depois disso ela colocou um arco-íris, como se fosse uma esperança", comenta.
"Desde ontem à tarde, a gente já percebeu que eles passaram a socializar mais, elas estão mais alegres, pensando em brincar e correr", diz.
Sem previsão concreta de quando poderão retornar às suas casas, os moradores têm encontrado no abrigo também um apoio da comunicade. "A gente ficou muito desesperado, porque não é brincadeira né? Mas aqui todos estão ajudando o outro e ficamos todos unidos até para limpar a lama da casa", diz Joelma.
Helena Maria da Conceição teve sua casa quase submersa, perdeu eletrodomésticos e outros objetos de valor, mas já faz planos sobre o que irá fazer para recuperar os bens.
"Eu perdi duas televisões agora, mas vou recomprar, se Deus quiser. Vou fazer muitas faxinas, minhas tranças e tapetes... Eu faço, vendo e compro minhas coisinhas", comenta.
Ela também afirma que quer recuperar as fotos dos filhos, de quem fala com orgulho, especialmente do mais velho, que cursa doutorado em biologia na UFPE (Universidade Federal de Pernambuco).
"A água acabou com a minha vida, quando eu vi minhas fotos, tudo acabou. Eu tinha os meus filhos aqui, com tanto orgulho, mas eu vou imprimir de novo", conta Helena.
Os abrigados no Celia Arraes têm também recebido apoio de ONGs, do município e de voluntários.
Nesta terça-feira (31), uma equipe da prefeitura estava no abrigo dando início ao processo para tirar novas vias dos documentos dos moradores da comunidade. Todos puderam recuperar suas certidões de nascimento, de casamento e documentos de identidades que foram perdidos na enchente.
Uma equipe médica também ganhou uma sala no Celia Arraes, onde atende a comunidade e faz encaminhamentos para unidades de saúde especializadas, caso necessário. Tanto adultos quanto crianças também estão sendo atendidos por uma equipe de psicólogos.