Por Gabriela Gallo
Nos últimos meses, o Correio da Manhã vem tratando sobre as "mães de Haia", mulheres envolvidas em disputas judiciais causadas por interpretações automáticas e distorcidas do tratado internacional Convenção de Haia. Fundado em 1980, o tratado foi criado para proteger crianças retiradas de sua terra natal por sequestro internacional. Porém, diversos depoimentos o criticam de agir de maneira automática, de forma a priorizar a posição geográfica da criança, e não sua segurança e bem-estar. Casos como o da brasileira Raquel Cantarelli, que teve as duas filhas levadas para a Irlanda, não são poucos, mas ainda são pouco conhecidos.
E alguém que conhece Raquel Cantarelli e tenta ajudá-la a ganhar a causa é a supermodelo e empresária Luiza Brunet. Em entrevista exclusiva ao Correio da Manhã, ela contou que está propondo com o Instituto Nós por Elas organizar um seminário em Brasília sobre mães de Haia, a fim de trazer maior visibilidade sobre o tema. A expectativa é que o seminário seja realizado em março, mês da mulher. Para a reportagem, ela reforçou que seminários dão uma amplitude muito grande ao tema, já que com ele se dá voz às vítimas e é possível propor sugestões e alternativas de como chegar a uma solução para o problema.
"Eu admiro mulheres que se colocam diante da sociedade como vítimas porque isso traz um alerta para as próximas vítimas. Eu acho que toda informação de vítima é importante porque ela já tem uma cartilha pronta dentro dela com todo protocolo pronto para alertar e ensinar outras mulheres", reforçou a modelo.
Haia
Para Luiza Brunet, a Convenção de Haia precisa ser revista. "Eu acho que essa convenção tem de ser adaptada para hoje em dia, porque as violências são mais reconhecidas. As próprias violências contra as mulheres só foram reconhecidas há muito pouco tempo, através de instrumentos como, no Brasil, a Lei Maria Penha, que foi discutida também na convenção de Haia", destacou.
Luiza reforçou que o debate e discussão sobre as mães de Haia precisa ser enfático, para ganhar a autonomia necessária e não perder o peso ou ser esquecido.
"Hoje em dia, todo mundo sabe o que é violência doméstica, racismo, homofobia. São temas que as pessoas falam de uns anos para cá. É algo recente. 'Mães de Haia', por ser algo recente, vem com uma carga de preconceito, as pessoas têm muito medo de falar. É preciso dar continuidade ao debate, senão o assunto morre. É preciso ter um compromisso de 'não deixar a peteca cair' e nós da sociedade também precisamos contribuir para que o assunto não morra. Mas isso só vai acontecer a partir do momento em que exista uma comunicação", destacou Brunet.
Ela afirmou que reconhece que podem existir casos em que há retaliação do parente, mas os casos precisam ser avaliados e as vítimas verdadeiramente ouvidas, especialmente as crianças. "A criança não mente", afirmou.
Mãe de dois filhos, dentre eles a também modelo Yasmin Brunet, que no momento participa do programa Big Brother Brasil (BBB), da TV Globo, Luiza relatou com dor no coração a angústia que sente ao escutar as lutas das mães em Haia para cuidar dos seus filhos, que também sofrem com a luta judicial. "É muito duro ser mãe, a gente só quer a segurança e o melhor para os nossos filhos. Quando se é mãe e você vê essas crianças no meio de uma luta é muito ruim", disse.
Violência
Além de ser modelo, empresária e atriz de sucesso, Luiza Brunet é extremamente engajada em pautas de gênero e combate à violência doméstica. É embaixadora do programa Mãos EmPENHAdas do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul (TJMS). Viaja realizando palestras e projetos de proteção e acolhimento à mulheres. Já falou sobre o tema no Parlamento Europeu em Bruxelas (Bélgica). Além de ter fundado, juntamente com outras quatro mulheres, o Instituto Nós por Elas para proteger meninas e mulheres jovens e adultas.
Para a reportagem, ela contou que presenciou a violência doméstica desde a infância, dentro de casa. O pai era alcoólatra e batia na mãe. Ela começou a se engajar na causa quando começou a participar do Instituto Avon, que cuida de mulheres vítimas de câncer de mama e que sofreram violência doméstica. "Eu comecei a revisitar minha história e ver que de fato, era um problema que eu tinha vivido na infância. Eu fui vendo que a mulher o tempo inteiro é assediada de alguma forma", contou.
Mas ela se tornou oficialmente uma ativista pelos direitos das mulheres e contra a violência de gênero depois de ter sido ela mesma vítima de violência doméstica. Em 2016, Luiza Brunet foi agredida pelo ex-companheiro, o empresário Lírio Parisotto, em Nova York, nos Estados Unidos. Ao voltar ao Brasil, ela pediu providências à justiça e obteve em seu favor medidas protetivas, previstas na Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006).
"Eu decidi me aprofundar mais nas questões de violência contra as mulheres, as conquistas, o direito da mulher, eu fui me aprofundando no tema. Por que não me envolver nessas histórias se eu posso? Toda a sociedade deveria olhar para fora e ver que o sofrimento pode estar batendo na nossa porta sem a gente saber", ela reforçou à reportagem.
"Eu acho que todas nós mulheres temos a obrigação de apoiar as mulheres que passam por isso [mães de Haia]. A minha vantagem é ter sido uma mulher famosa, ter credibilidade, o que traz o alcance da pauta. Mas eu converso com muitas mulheres e digo: 'Apoiem outras mulheres!'. Porque o problema da violência, seja ela qual for, está batendo na nossa porta o tempo inteiro. A gente precisa dessa união feminina", reiterou Brunet.