Por: William França

BRASILIANAS | BRASÍLIA VISUALMENTE POLUÍDA (1): Série de "Brasilianas", que começa hoje, irá apontar abusos que poluem e sujam visualmente Brasília, Patrimônio da Humanidade

Os 28 painéis publicitários do Conjunto Nacional integram a proposta original de Lúcio Costa para o Setor de Diversões Norte e Sul | Foto: Divulgação/Conjunto

Macaque in the trees
Toda essa fachada do Conic voltada para o Setor Hoteleiro Norte seria transformado num paredão de LED, segundo proposta (vetada) dos deputados distritais | Foto: Wikimapia

Conic e Conjunto Nacional como quadradões cercados por LEDs
Distritais quase conseguiram transformar todo o Setor de Diversões Sul e o Norte em cercados de painéis publicitários gigantes, formado por paredões de de LED por todos os lados

Há quase 37 anos, desde que Brasília passou a ser detentora da maior área tombada do mundo - 112,25 km² - e foi inscrita pela UNESCO na lista de bens do Patrimônio Mundial, sendo o único bem contemporâneo a merecer essa distinção, que há forças políticas e econômicas tentando desfigurar o projeto urbanístico original de Lúcio Costa e as obras de Oscar Niemeyer.

Por uma única assinatura, Brasília escapou de ver transformado o conjunto de prédios do Setor de Diversões Sul (que também é chamado de Conic, por conta do primeiro dos 14 prédios que compõe o setor) e o Conjunto Nacional (que ocupa o lado Norte do setor) num imenso quarteirão que seria forrado por painéis de LED, gigantes.

Os deputados distritais Wellington Luiz (MDB) e Jorge Vianna (PSD) propuseram e, com tramitação célere de um único ano - e sem ouvir as entidades envolvidas com a preservação do Patrimônio - conseguiram aprovar um projeto de lei, o 985/2024, que previa importantes alterações nas duas áreas.

(Antes, uma importante explicação: foi o próprio Lúcio Costa quem estabeleceu que nesses dois setores seria possível instalar painéis publicitários voltados para a Esplanada dos Ministérios. São os que existem hoje: 3 painéis horizontais gigantes no Conic e 28 outros, verticais, no Conjunto Nacional.)

Pela proposta, além das fachadas que hoje já existem e exibem propagandas, as demais laterais também poderiam receber semelhantes letreiros luminosos gigantescos. Estariam voltados para os setores Hoteleiro, Comercial e Cultural. Formariam um "quadradão" luminoso.

"É com pesar que acompanho essas propostas de descaracterização galopante da cidade", lamenta Vera Ramos, que presidiu até 2022 o Instituto Histórico e Geográfico do DF (IHGDF) e trabalhou, em diversos órgãos, na preservação do patrimônio urbano da cidade por quase 40 anos. "Falta respeito pelo que foi pensado pelos criadores de Brasília", afirma a arquiteta, criticando ainda a falta de comprometimento dos deputados distritais, "que fazem intervenções equivocadas - ou mesmo, mal-intencionadas" na cidade.

E a tal assinatura que faltou?

Era do governador Ibaneis Rocha (MDB). Ele decidiu não assinar e vetar na íntegra a proposta de lei "dos distritais dos painéis de LED". A Lei Orgânica do DF reserva ao governador a iniciativa para legislar sobre temas como o plano diretor de ordenamento territorial, uso e ocupação do solo, plano de preservação do conjunto urbanístico e planos de desenvolvimento local.

Assim, o projeto de lei foi considerado inconstitucional devido a vício de iniciativa, segundo o Palácio do Buriti. Procurados por "Brasilianas", as assessorias dos distritais não responderam aos questionamentos.

Assim, por ora, seguem preservados os icônicos letreiros do Conjunto Nacional e mantida a vontade de Lúcio Costa, que no Conic pretendia resgatar as vivências cotidianas da tradição carioca de vida pública, como as da Rua do Ouvidor, que inspirou as galerias cobertas, calçadas largas, vielas e terraços do nosso SDS.