Por: William França

BRASILIANAS | Brasília visualmente poluída (6): Sem aferição, luz intensa dos painéis de LED afeta a visão

Painéis de LED com brilho excessivo ocupam as margens da Estrada-Parque Aeroporto. Luminosidade excessiva tem gerado reclamações na Promotoria de Ordem Urbanística | Foto: Fotos: Neooh/Reprodução

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À noite, painéis de LED extramente luminosos ofuscam a visão do motoristas. | Foto: Neooh/Reprodução

De dia, os totens de publicidade emporcalham a cidade. De noite, ofuscam a visão dos motoristas. E - acredite - ninguém faz a aferição da intensidade de luz dos painéis no DF

A Promotoria de Ordem Urbanística do Ministério Público do Distrito Federal está sendo abarrotada por reclamações de motoristas, incomodados com o ofuscamento da visão provocado pela luz forte, com brilho excessivo, projetada pelos painéis publicitários de LED. São reclamações individuais ou coletivas, como um abaixo-assinado de moradores do Lago Norte reclamando dos painéis do "Metrópoles", que se proliferaram por lá desde o final do ano passado.

"A luz forte na beirada da pista incomoda muita gente", disse à "Brasilianas" a promotora Laís Cerqueira, uma das 6 que atuam nas questões ligadas aos temas urbanísticos do DF - cuidados com o tombamento de Brasília, inclusive. "Além de todos os outros pontos associados, como altura excessiva, uso da área verde, ocupação do canteiro central e a interferência na Escala Bucólica da cidade", completa a promotora. "Poluem a paisagem", afirmou.

E essa questão toda do brilho excessivo nos painéis esbarra na burocracia. Ou na falta dela. Explicando: o Código de Trânsito Brasileiro não trata dessa questão da luminosidade dos painéis. Trata apenas de uso de faróis de carro, por exemplo. Das milhares de resoluções do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), nenhuma trata do tema especificamente - há indicações para tudo, de intensidade de farol até da luz da placa dos carros. Mas não tem de painéis luminosos na beira das rodovias.

O Departamento de Estradas de Rodagem (DER) do DF tem a Instrução 03, de 2022, que traz parâmetros da quantidade de brilho máximo dos painéis que são instalados na cidade. O artigo 9º estabelece que são 600 candelas por metro quadrado nas fases do amanhecer e anoitecer; 6.000 candelas/m², durante o dia e 300 candelas/m² durante a noite. Candela é a unidade de medida internacional para a intensidade luminosa.

A regra existe. Mas, na prática, segundo apurou esta coluna, cabe a cada uma das empresas cuidar de seus próprios painéis. Está no artigo 10 da Instrução do DER-DF. Segundo ele, o painel luminoso deverá possuir sensor de brilho automático, um outro controlado por software e cabe a elas (empresas) aferirem o impacto luminoso do equipamento a ser licenciado.

"Nem sempre o painel instalado é o que está no projeto. E as empresas dizem que está tudo nas regras. E ninguém confere", afirma a promotora Laís Cerqueira. "Isso porque os fiscais do DER não possuem o luxímetro (aparelho que mede o brilho dos painéis). Alguns deles, mais corajosos, escrevem isso nos laudos que cobramos do DER", afirma Laís Cerqueira.

O próprio diretor do DER, Fauzi Naczur Jr., disse à "Brasilianas" que ele mesmo costuma fazer essa fiscalização - não com aparelho, mas por passar em frente de um desses painéis e sentir-se incomodado com o brilho excessivo. "Eu ligo para a fiscalização e peço para avisar a empresa. Segundo ele, picos de energia fazem com que a configuração desses painéis seja alterada.

O Aeroporto JK é dos que lideram as queixas

E, dos painéis que mais incomodam a população do DF, os do Aeroporto JK seguem disputando a liderança. Como lá é "um território sem lei" - como mostrou o capítulo 5 desta série -, os painéis têm um brilho muito, muito intenso. São ofuscantes, sobretudo à noite.

E para piorar, não respeitam (mais uma) regra da Instrução do DER: o artigo 12 afirma que "o conteúdo publicitário veiculado no painel luminoso não poderá interferir ou desviar a atenção dos condutores dos veículos que transitam na rodovia, de modo que só será permitida a exibição de imagens estáticas no equipamento".

Mais ainda: pela norma, fica vedada a exibição de vídeos, animações e efeitos de transição entre imagens, que produza movimento e o tempo de exibição de qualquer anúncio não poderá ser inferior a 10 segundos. Basta parar um pouco em frente aos painéis do aeroporto para ver justamente o oposto disso.

Fotofobia é o nome da sensação de incômodo

O problema do brilho dos painéis de publicidade é o mesmo provocado pelos faróis de xênon. "Provocam fotofobia, essa aversão à luz que pode até mesmo causar cegueira momentânea nos motoristas, aumentando o risco de acidentes", afirma o médico oftalmologista João Eugênio Gonçalves de Medeiros, especialista em neuro-oftalmologia. "Mesmo quem tem visão perfeita podem sentir este tipo de dificuldade", completa.

O médico lembra que dados do Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) mostram que o Brasil tem 4,5 milhões de motoristas com mais de 55 anos. A partir dessa idade, destaca, as alterações na fisiologia do olho dificultam ainda mais a adaptação da visão aos diferentes níveis de luminosidade. Motoristas com mais de 60 anos que já foram operados de catarata têm maior dificuldade de dirigir contra o fluxo porque a pupila contrai.

São causas comuns da fotofobia o astigmatismo, catarata e olho seco (redução da quantidade ou qualidade de lágrima). Com menor freqüência, a fotofobia também é provocada por alergia, trauma ou cicatriz na córnea, inflamações e infecções. A recomendação do especialista para quem tem o problema é passar por consulta com um oftalmologista. A terapia, observa, varia de acordo com a causa.