Por: William França

BRASILIANAS | Brasília visualmente poluída (7): MP instaura inquérito civil público contra painéis do Metrópoles

Reprodução do primeiro grande embate entre o Metrópoles e o Poder Público: o painel gigante na empena de um edifício no Setor Bancário Sul. Essa ação gerou idas e vindas na Justiça | Foto: Metropoles

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Painel instalado bem na ponta da bifurcação da Estrada-Parque Núcleo Bandeirante (EPNB) e a Estrada-Parque Indústria e Abastecimento (EPIA), duas das mais movimentadas rodovias da cidade. Tiram o foco do motorista que tem de olhar para a pista paralela | Foto: Ivan Félix/Brasilianas

Ilegalidades flagrantes levaram a promotora responsável pela Defesa da Ordem Urbanística a coletar mais provas para embasar ação civil pública contra o Metrópoles e o DER

"O duro é que muita coisa está irregular e com o aval do Poder Público", disse à "Brasilianas" a promotora Laís Cerqueira, responsável pela 5ª Promotoria de Ordem Urbanística do Ministério Público do Distrito Federal, ao apresentar a Portaria 37/2024, com exclusividade a este colunista. "É um conjunto muito grande de irregularidades", completou a promotora - indicando que o foco desta investigação será a conduta do Departamento de Estradas de Rodagem do DF (DER-DF) com relação às autorizações dadas ao "Metrópoles" para espalhar totens luminosos por todo o DF.

Nesta 7ª nota da série sobre a poluição visual da cidade provocada pelo excesso de painéis de publicidade espalhados pelo DF - sobretudo os de LED -, "Brasilianas" detalha a decisão da Promotoria responsável por zelar pelo Plano de Ordenamento Territorial (PDOT), pela correta utilização de bens de uso comum (como áreas verdes) e pelas normas que disciplinam o sistema viário, dentre outras atribuições.

Entre as justificativas para aprofundar mais as investigações preliminares, a promotora Laís Cerqueira se valeu de informações repassadas pelos próprios servidores do DER-DF, responsáveis pela elaboração dos processos de autorização de instalação dos painéis espalhados pela cidade e da fiscalização do funcionamento correto deles.

Para isso, ela convocou inicialmente 6 servidores do DER-DF para prestarem esclarecimentos sobre as condições de trabalho da autarquia e a forma como são concedidas as autorizações (e as posteriores fiscalizações) para que o "Metrópoles" consiga espalhar e manter seus tótens luminosos por toda a cidade, em condições desiguais dos demais concorrentes.

São eles: Bruno Ferreira Oliveira, Eudivan Campos da Silva, Edvaldo Cordeiro de Oliveira, Igor Cleyton Ferreira de Sousa, Charles Bruno de Medeiros e Renan Soares de Oliveira.

Haverá ainda uma investigação sobre a conduta do Superintendente de Operações do DER-DF, Murilo de Melo Santos. O Ministério Público já tem dados que indicam que ele avocava para si o poder de avaliar, autorizar e emitir as autorizações para a instalação dos painéis, mesmo com pareceres técnicos contrários.

Entre outros documentos avaliados pelo Ministério Público, está uma listagem com 276 painéis de LED que estavam instalados na cidade, em maio deste ano, que foi repassada pelo DER somente após o seu presidente, Fauzi Naczur Jr., ser intimado por Oficial de Justiça a prestar esses esclarecimentos - até então, esse dado não era público.

De toda forma, a promotoria sabe que esse número é bem maior, porque (curiosamente) três dos painéis que já estão sob vigilância do MP (por serem objeto de reclamações de cidadãos, por infringirem as regras de luminosidade excessiva) não constam dessa lista. E o MP quer, agora, saber os motivos pelos quais o DER não forneceu a lista correta ou porque omitiu esses painéis da relação. E quer saber quantos são, na verdade, os painéis luminosos existentes no DF (que ninguém sabe!).

"Das 276 autorizações que estavam em vigor, segundo a lista, 155 deles (ou 54,52%) foram expedidos em favor da empresa Metrópoles Mídia Digital Ltda., o que viola os princípios de isonomia (ou da igualdade) e da impessoalidade", afirma a promotora. Os demais 121 painéis publicitários instalados no DF estão em nome de 33 outras empresas, o que dá uma média de 3,6 painéis por empresa - número desproporcional quando comparado com o "Metrópoles".

E tem mais... "Das 155 autorizações, 44 permitem a afixação dos painéis em rodovias não previstas na lei do Plano de Publicidade do DF. Destes, 35 estão na Estrada-Parque das Nações (DF 004) e outros 9 na Estrada-Parque Indústrias Gráficas", afirma Lais Cerqueira, complementando: "Por sua vez, isso viola o princípio da legalidade".

"Brasilianas" apurou que o plano estratégico do "Metrópoles" é (ou era) o de chegar ao final de 2024 com cerca de 500 painéis publicitários em todo o DF. Ah... também será ouvido, pelo MP, o engenheiro eletricista Deivid da Silva Lima, que prestou serviços ao "Metrópoles" e assinou laudos técnicos. Há dúvidas sobre eles.

Mistura de conceitos técnicos, omissão e falta de licitação estão entre os agravantes

Segundo o MP, uma das formas encontradas para que o "Metrópoles" obtenha tantas autorizações está a mistura de conceitos técnicos. Pela lei, não pode haver engenhos publicitários instalados nos canteiros centrais das rodovias, por exemplo.

Para driblar essa questão, o DER decidiu chamar esses painéis luminosos de mobiliários urbanos. "É uma deturpação da lei", afirma a promotora. "Mobiliários urbanos não podem ter a publicidade como seu fim, como é o caso". Para entender melhor: equipamentos urbanos com publicidade são, por exemplo, parquinhos de diversão, paradas de ônibus e estações de bicicletas que, quando adotadas ou geridas por empresas, podem trazer anúncios de seus patrocinadores em suas áreas, mas proporcionalmente pequenas em relação ao espaço ocupado.

Outro drible, encontrado pelo MP, foi um ajuste na definição do destino de uso do painel. Segundo o "Metrópoles", eles prestariam serviço de utilidade pública porque informariam data, hora e temperatura ambiente. Mas, qualquer um que se posicionar frente aos engenhos publicitários da empresa não vê esse "serviço essencial" (ainda mais em tempos de celular). O que se tem é tão-somente autopromoção (de seu portal de notícias e de shows e eventos patrocinados pelo site).

Para complementar esse ponto da investigação, o Ministério Público está requisitando à Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh) uma série de documentos para entender como - e porque - a secretaria orientou o DER a considerar os painéis do "Metrópoles" como mobiliário urbano, e, assim, se instalar nas vias e rodovias de todo o DF.

Da mesma forma, a Promotoria de Ordem Urbanística quer entender o papel do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) nesse processo todo. Há indícios que o órgão, tido como guardião da preservação do tombamento de Brasília como Patrimônio Cultural da Humanidade, também foi conivente com o licenciamento no modelo "mobiliário urbano".

Outra pendência que será objeto de mais diligências pelo MP é quanto à justificativa, usada pelo DER, para conceder as autorizações de instalação dos painéis eletrônicos na chamada Faixa de Domínio das rodovias. Pela legislação, o DER deveria ter um plano de ocupação que determinasse, previamente, onde poderiam ser instalados esses engenhos publicitários.

"Mas o que acontece é o inverso. Alegando que não tem ainda um plano de ocupação, o DER diz que as autorizações são precárias (podem ser cassadas a qualquer momento) e que por isso não faz licitações", explica a promotora. Essa omissão reforça o desrespeito a impessoalidade, igualdade de oportunidades e isonomia com que o DER trata as autorizações para o "Metrópoles".

Tão logo consiga reunir os elementos de convicção necessários para embasar a atuação do MPDFT, a promotora deverá instaurar a ação civil pública. Daí deverá solicitar à Justiça que os envolvidos se tornem réus e possam ser investigados nessa condição.

Amanhã teremos mais novidades! Aguardem!