BRASILIANAS | Brasília visualmente poluída (11): "Multimídia nojento", classifica arquiteto premiado

Responsável pelo programa de placas que indicam os endereços em Brasília, Danilo Barbosa afirma, em audiência no Senado, que os painéis de LED do Metrópoles "estão destruindo a paisagem visual de Brasília"

Por William França

O arquiteto Danilo Barbosa chamou de "nojentos" os tótens de LED espalhados pela cidade. Ele é o responsável pelo projeto de sinalização de Brasíia

Responsável pelo programa de placas que indicam os endereços em Brasília, Danilo Barbosa afirma, em audiência no Senado, que os painéis de LED do Metrópoles "estão destruindo a paisagem visual de Brasília"

O premiado arquiteto e urbanista Danilo Barbosa, autor do programa de placas de sinalização de Brasília, afirmou em audiência no Senado na última sexta-feira (04), que os painéis de publicidade - sobretudo os tótens de LED - "estão destruindo a Escala Bucólica da cidade" - uma das quatro previstas no Plano Piloto proposto por Lúcio Costa. "Estamos perdendo aquela beleza do projeto limpo de Brasília", completou.

Para ajudar na compreensão do leitor: a Escala Bucólica, segundo Lúcio Costa, "se constitui dos gramados, passeios, bosques e jardins da cidade que permeiam e envolvem as superquadras, as entrequadras, os diversos setores e os conjuntos de casa e comércios locais, e a cidade inteira, imprimindo a Brasília a qualidade de cidade-parque que ela é." As outras três são as escalas Monumental, Residencial e Gregária.

Durante a audiência na Comissão de Meio Ambiente do Senado, Danilo Barbosa fez um rápido histórico do seu projeto de placas de endereços e de orientação viária, que se tornou depois o programa de sinalização da cidade. "Foi feito um projeto limpo, preocupado com a integração das placas com as escalas, avaliando as dimensões e interferências", explicou. Ele trabalhou durante um ano e meio no tema.

Pelo reconhecimento do seu valor, em 2012 o projeto de Danilo foi escolhido por um comitê do MoMA de Nova York para fazer parte do acervo permanente das obras em exposição. Atualmente, a placa (com a sinalização da quadra-modelo da cidade, a 308 Sul) com 2,5 metros de altura e 45 cm de largura está no primeiro pavimento do museu norte-americano. O MAB (Museu de Arte de Brasília) também exibe uma réplica.

Agência Brasília - Placa de sinalização que indica a 308 Sul, quadra-modelo do DF, exposta no MOMA, de Nova Iorque. Projeto do arquiteto Danilo Barbosa

De volta aos painéis de LED: Segundo o arquiteto, "a nossa Câmara Legislativa tem sido bastante benevolente com essas pessoas que exploram a publicidade". E elenão está errado. "Brasilianas" demonstrou, no episódio 10 desta série, como funciona o esquema de ajuste da legislação de publicidade às necessidades dos empresários, sobretudo do "Metrópoles" - que responde pela maioria dos tótens que infestam a cidade. "Eu não sou contra a publicidade, mas temos de conciliar esses painéis com as escalas da cidade", reafirmou.

Lúcio Costa reclamou de uma propaganda há 50 anos. Hoje, no lugar, tem um painel do "Metrópoles"

Danilo contou um episódio de quando era recém-formado, também numa audiência no Senado, há cerca de 50 anos. Na ocasião, ele acompanhava a fala do criador de Brasília, que tratava sobre o projeto "Brasília Revisitada", em que ele fez ajustes ao projeto inicial da cidade. Lúcio Costa aproveitou para reclamar de uma propaganda gigante, de um guaraná, que ficava na empena de um prédio no Setor de Diversões Sul, voltado para o Eixo Monumental.

"Nós não podemos dar as boas-vindas a quem está adentrando a Esplanada dos Ministérios com uma propaganda daquele tamanho", reclamou o criador de Brasília. Segundo Danilo narrou aos senadores, "em uma semana aquilo sumiu". Atualmente, o que existe no mesmíssimo lugar é um painel de LED, gigante, do "Metrópoles" - e que é totalmente irregular. "Hoje lá tem um multimídia... Nojento!", disse o arquiteto, para em seguida pedir desculpas à senadora Leila Barros (PDT) pela expressão.

Danilo Barbosa ainda pontuou outros locais "de poluição visual aberrante". Um deles, que denominou de "a coisa", é o que está colocado bem na entrada da Asa Sul, que recepciona a quem chega do Aeroporto JK. "Tem um edifício de LED lá. Aquela coisa é um elemento que corresponde a um prédio de 6, 8 andares", explicou. Ele disse que já teve oportunidade de questionar o Departamento de Estradas de Rodagem (DER-DF) sobre aquele painel. Obteve como resposta "que foi autorizado porque, se foi feito, é porque está dentro da lei".

Agência Brasília - Totem com indicação de Cidade Patrimônio da Humanidade, proposto pela Unesco, não existe no ponto Sul da cidade. No lugar, existe "um prédio de LED de 6, 8 andares, uma coisa", afirmou o arquiteto Danilo Barbosa

O arquiteto questionou esse ponto. Naquele mesmo local estava previsto um outro tipo de tótem - esse deveria ter apenas 7 metros de altura e 70 cm de largura - e foi proposto pela Unesco, para indicar aos visitantes que as pessoas estavam entrando numa área tombada como Patrimônio Cultural da Humanidade. A agência da ONU estabeleceu que deveria haver um tótem em cada um dos 4 pontos cardeais do Plano Piloto. Hoje existem somente os Leste (próximo ao CCBB) e o Oeste (próximo à Rodoferroviária, para quem entra no Eixo Monumental). No ponto Sul "está 'A Coisa'", afirmou.

Durante sua exposição no Senado, Danilo citou outros problemas causados pelos tótens - como a perturbação visual para quem dirige. "Eu mesmo já fiquei ofuscado por um desses painéis, um que está numa área particular no Setor de Clubes Sul. Estava dirigindo à noite e tive de parar, de repente, porque não enxerguei mais nada, ofuscado pela luz forte do painel". Citou outro exemplo, o de um tótem de LED próximo ao Palácio do Buriti, que se confunde com um semáforo. "Um carro passou direto outro dia, não deve ter visto nada", completou.

Um apelo - para evitar que Brasília seja "Las Bregas"

Num momento técnico de sua fala, Danilo Barbosa citou um trecho da Política Nacional do Meio Ambiente, que define o que seja poluição visual. "Esse tipo de poluição prejudica a própria vida dos cidadãos, é uma ofensa à sua integridade psíquica. Viola a qualidade de vida", afirmou o arquiteto. "E como adverte a legislação, a poluição visual dá-se de maneira gradativa. Pouco a pouco, e daí a gente vai se acostumando".

Aproveitando a presença do Ministério Público do DF na sessão do Senado, o arquiteto fez um apelo à promotoria: "A poluição visual deve ser contida". E ironizou: "Nós vamos transformar Brasília em que? Numa 'Las Bregas'? É isso que estou imaginando".

Agora, "Brasilianas" aproveita o gancho para fazer uma indiscreta revelação... Uma das primeiras conversas desta coluna, antes de iniciar esta série sobre poluição visual, foi com o presidente do DER-DF, Fauzi Naczur Jrl,. Naquele dia (05 de junho), ele me disse que vê "com estranheza a resistência de alguns da cidade" com os painéis de LED instalados. "As pessoas pagam uma grana para viajar, só olhar para painéis em Las Vegas. Qual o problema desses daqui?"

Talvez uma conversa de Fauzi Naczur Jr. com o arquiteto Danilo Barbosa possa responder a essa questão...