BRASILIANAS | Brasília visualmente poluída (18): Estranho no ninho, Metrô-DF participa de regulação

Porque a empresa que cuida do modal de transporte tem de tratar sobre a nova versão do Plano Diretor de Publicidade do DF, ninguém consegue explicar. Nem mesmo a própria companhia

Por William França

Metrô-DF arrecadou cerca de R$ 5 milhões com publicidade em 2023

Porque a empresa que cuida do modal de transporte tem de tratar sobre a nova versão do Plano Diretor de Publicidade do DF, ninguém consegue explicar. Nem mesmo a própria companhia.

Depois de ter vetado a última tentativa dos deputados distritais de interferirem (ainda mais) nas regras que regulamentam o uso de painéis de LED e tótens publicitários pela cidade - conforme esta série tem demonstrado - o governador Ibaneis Rocha (MDB) decidiu criar um grupo de trabalho (GT) para discutir e propor nova regulamentação para o Plano Diretor de Publicidade do DF.

O decreto 45.932/2024, que criou o GT, trouxe na sua composição um elemento no mínimo curioso: a Companhia do Metropolitano do DF, o Metrô-DF. Não se sabe qual é a colaboração na formulação das regras que poderá vir da empresa dos trens - que é uma beneficiária das verbas da publicidade (como se verá adiante), o que na publicidade se chama de veículo, e não uma gestora de políticas públicas no setor.

Gestor do plano diretor é, por exemplo, a Secretaria de Comunicação Social, a Secom - que ficou fora do GT. É o órgão que faz o controle e os pagamentos dos anúncios publicitários do próprio GDF. No ano passado, foram investidos cerca de R$ 145,4 milhões para a veiculação de publicidade e propaganda do governo Ibaneis Rocha.

O mesmo grupo de trabalho também não incluiu o Departamento de Trânsito do DF (Detran-DF), que tem tudo a ver com tema, uma vez que o Código de Trânsito Brasileiro estabelece regras para a instalação de publicidade ao longo das vias (gerenciadas pelo Detran) e rodovias (gerenciadas pelo Departamento de Estradas de Rodagem - DER-DF).

Assim como o Metrô, o DER está no tal grupo de trabalho e também aparece como beneficiário de receitas de publicidade. Em 2023, o DER-DF arrecadou cerca de R$ 14 milhões com o licenciamento dos quase 2.000 painéis de LED e tótens publicitários que infestam a cidade.

A diferença entre as duas entidades é que o Metrô não tem qualquer ingerência sobre a poluição visual na cidade, enquanto o DER aparece como o principal "autorizador oficial" dela. E tem o papel institucional de fiscalização das chamadas faixas de domínio (ainda que não se saiba ao certo qual a medida das tais faixas).

Também integram o GT a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh) e o Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Distrito Federal (Brasília Ambiental) - ambos, também, formuladores de políticas públicas e em nada beneficiários das verbas publicitárias. O trabalho deste GT é coordenado pela Secretaria de Governo, que tem essa função de organizar trabalhos de múltiplos órgãos.

Receitas extra tarifárias são reforço no caixa

Voltando ao Metrô-DF... Questionada por "Brasilianas" sobre os motivos que justificariam a participação da empresa de trens como formuladora das regras de publicidade de Brasília, a assessoria de imprensa da empresa respondeu em nota que "além das receitas tarifárias, oriundas do transporte de usuários, o Metrô-DF também possui receitas extra tarifárias, oriundas da exploração comercial dos espaços físicos disponíveis nas suas estações por meio de diversos produtos, dentre eles, a publicidade".

Ou seja: confirma o que justamente esta coluna está afirmando: é captadora de recursos, um veículo, não gestora de políticas públicas. Seria o mesmo que convocar as empresas de ônibus do DF para opinarem sobre as regras dos anúncios que exibem, tanto nas suas janelas traseiras quanto nas telas internas. Qual a necessidade ou correlação com as políticas públicas? Nenhuma.

Mas, já que é um veículo, quanto o Metrô-DF arrecadou com essa exploração comercial? Em 2023, a receita extra tarifária somou R$ 5 milhões - segundo a companhia. Seria oriunda da cessão de lojas e da exploração de espaços para terminais bancários e quiosques - além da publicidade propriamente dita. Até o mês de maio deste ano, a receita extra tarifária total do Metrô-DF estava em R$ 2,3 milhões.

Divulgação/Metrô-DF - No Natal, trens do Metrô-DF ganham luzes, patrocinados por um refrigerante.

Quem usa o modal de transporte costuma encontrar alguns vagões plotados (estampados) com publicidade. No Natal, uma empresa de refrigerantes também ilumina alguns vagões, dentro da estratégia de vinculação da marca com as festividades de fim-de-ano. É uma mídia importante, tanto que a EBC (Agência Brasil, do governo federal) a utilizou, recentemente, para anunciar a sua nova programação. O Banco de Brasília (BRB) é outro usuário costumeiro.

 

Atualmente, o Metrô-DF não tem contrato com agências de publicidade, portanto não faz campanhas publicitárias. Segundo a companhia, são realizadas apenas campanhas educativas e institucionais orgânicas (sem pagamento ou impulsionamento) por meio do site e das redes sociais da empresa.

Ainda segundo o Metrô-DF, os recursos oriundos das receitas extra tarifárias são geridos pela própria companhia, "podendo ser utilizados para cobertura de diversas despesas do Metrô-DF constantes em seu orçamento". Poderiam ser usadas, por exemplo, para a reposição dos painéis com as informações sobre os horários e as linhas do trem, nas suas estações - o que não vem acontecendo. Mas isso será tema de uma outra coluna. Em breve.