BRASILIANAS | Anta resgatada em incêndio no Parque Nacional passa bem
Ela sofreu queimaduras nas quatro patas e inalou fumaça. Fuga de animais silvestres para áreas urbanas aumenta os atropelamentos
Ela sofreu queimaduras nas quatro patas e inalou fumaça. Fuga de animais silvestres para áreas urbanas aumenta os atropelamentos
Passa bem e está sob cuidados intensos o filhote de anta que foi resgatada na tarde de quarta-feira (18) na área atingida pelo incêndio florestal que atingiu o Parque Nacional de Brasília, esta semana.
O animal é uma anta jovem (cerca de 5 anos), macho, que estava com 73 quilos ao ser recolhida pelos brigadistas do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). Ela foi levada ao Zoológico de Brasília e, segundo a equipe médica que a atendeu, as quatro patas estavam feridas por queimaduras e sem as unhas.
A equipe do Zoológico também identificou que a anta estava desidratada e que havia inalado fumaça. "Apesar dos ferimentos, o animal está responsivo e já tomou água. Ele será medicado com analgésicos e posteriormente alimentado", disse o boletim emitido pelo Zoo, no final da manhã de ontem.
Os médicos veterinários do Zoo colocaram uma espécie de botinha nas patas do animal, mas não há ainda previsão para que ele recupere os movimentos. A anta ficou numa área isolada, para evitar estresse - além do que já sofreu no incêndio.
O animal foi recuperado numa área onde acontecem os chamados incêndios subterrâneos. Esse fogo pode atravessar até mesmo rios, por debaixo da terra, e queimar árvores pelas raízes. Esse tipo de fogo deixa o terreno cheio de brasas - o que acaba queimando a pata dos animais, como foi o caso da anta que conseguiu ser resgatada.
Na operação de resgate, os brigadistas do ICMBio tiveram de sedar o animal - uma vez que ele estava agitado e com muitas dores. Em vídeos feitos pelas equipes, no momento do resgate, é possível ouvir seus gritos.
A anta é o maior mamífero terrestre do Brasil e o segundo da América do Sul, tendo até 300 quilos de peso. Podem viver até 35 anos de idade. Ela é listada como vulnerável pela União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais e habita principalmente ambientes próximos a cursos d'água permanentes.
A anta que está no Zoo Brasília - por ora - é o único animal que foi resgatado no incêndio do Parque Nacional de Brasília, que começou na tarde do último domingo. As chamas se alastraram rapidamente pelo terreno em razão do clima quente e seco e, no último balanço, indicavam que o fogo consumiu 2,4 mil hectares de vegetação. A suspeita é que o incêndio tenha sido criminoso.
Zoo atende animais feridos por atropelamento
Diariamente, o Hospital Veterinário do Zoológico de Brasília presta assistência não só aos animais que vivem na instituição, mas também aos resgatados e vítimas de atropelamentos, incêndios florestais ou outros crimes ambientais. Após receberem tratamento pelas equipes e serem submetidos a exames - ou cirurgias, se necessário -, os animais passam por reabilitação e reintrodução ao habitat natural, quando é possível.
O diretor-presidente da Fundação Jardim Zoológico de Brasília, Wallison Couto, explica que há uma parceria com outros órgãos ambientais como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o Instituto Brasília Ambiental e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), em que os animais podem ser direcionados ao Hospital e Centro de Reabilitação da Fauna Silvestre (Hfaus) ou ao Zoológico, que possui infraestrutura para atender animais de grande porte.
"Nós temos uma equipe bem qualificada que trabalha junto a esses órgãos e aos Centros de Triagem de Animais Silvestres (Cetas). Ainda não veio nenhum animal da Flona [Floresta Nacional de Brasília] até agora, mas se precisar desse apoio, a equipe já está aguardando. Temos feito algumas visitas lá para ver se tem algum animal que precisa de apoio. A equipe de nutrição levou algumas dietas para a alimentação de animais no local, estamos fazendo esse acompanhamento", afirma.
O diretor-presidente esclarece, ainda, que não é porque o animal foi tratado no Zoológico que ele vai ficar para exposição. "É feita uma avaliação com o Ibama ou a instituição que deixa o animal conosco. Então, há animais que recebemos, são tratados e continuam no Zoo, e há outros que são reintroduzidos na natureza."
São 30 animais em tratamento
Atualmente, há em torno de 30 animais externos, que não fazem parte do Zoológico, sendo tratados no Hospital Veterinário da instituição. Entre eles, uma fêmea de cachorro-do-mato que chegou mancando, com suspeita de atropelamento. Ela passou por exames, fez raio-X, foi avaliada e tem realizado sessões de acupuntura, cromoterapia e fisioterapia.
Um filhote de onça-parda também é tratado na unidade veterinária do Zoo, encontrado após as equipes constatarem o abandono da mãe. Desidratado, o animal foi colocado no recinto, onde tem recebido alimentação e suplementação, de acordo com indicações da zootecnista.
Segundo a diretora do hospital veterinário do Zoo, Tânia Borges, a unidade conta com um centro cirúrgico, equipamentos de raio-X e parceiros que apoiam com outros tipos de exames, além de uma equipe treinada com cirurgiões e anestesistas trabalhando com os animais de forma frequente. Após a recuperação, os animais são microchipados e recebem uma identificação. Em seguida, realiza-se uma reunião com o Ibama para definir os próximos passos.
"Como o nosso maior objetivo é devolvê-los à natureza, tentamos o mínimo de contato possível com esses animais, fazendo apenas o necessário. Eles, sendo examinados e estando clinicamente bem e saudáveis, passam por um programa de recuperação e reintrodução, onde seguimos as normativas do Ibama, que vai definir como e para onde vão os animais", detalha.
É importante frisar que o Zoológico de Brasília não recebe animais diretamente da população, apenas por meio de órgãos ambientais. Ao encontrar um animal silvestre ferido ou perdido, a população pode entrar em contato com o Batalhão de Polícia Militar Ambiental (BPMA) pelo 190, que fará o procedimento correto de resgate junto a entidades ambientais responsáveis.
Atropelamentos: efeitos das queimadas
De acordo com o biólogo do Instituto Brasília Ambiental, Thiago Silvestre, o aumento de animais atropelados em rodovias pode ser um efeito colateral dos incêndios florestais, visto que os animais incomodados tendem a abandonar os ninhos e atravessar as pistas em fuga.
"Estão chegando muitos filhotes abandonados pelas mães, e a maioria dos animais que recebemos nas unidades veterinárias é vítima de atropelamentos, choques elétricos ou ferimentos por linha de cerol, tudo ligado a interferências humanas", ressalta.
O biólogo explica que é natural os animais migrarem de uma área para outra à procura de parceiros para reprodução. Contudo, as espécies estavam adaptadas a queimadas de grande porte um ano sim, um ano não, e não todos os anos, como tem ocorrido em grandes áreas de conservação.
"Os animais que conseguem fugir podem ficar desnorteados e muitos acabam morrendo por problemas respiratórios ou atropelamentos. O Cerrado é resiliente, mas da forma como isso está acontecendo, esses animais de áreas nativas não estão acostumados. Quando eles saem de uma área queimada e se deparam com outra, foi uma migração à toa. Isso tudo influencia a reprodução da espécie e aumenta muito a chance de extinção. A fauna está sentindo muito essas mudanças climáticas; elas mexem com toda a teia ecológica", frisa o especialista.
Tenda de apoio
Nesta quarta-feira (18), o Governo do Distrito Federal (GDF) instalou uma tenda de apoio dedicada ao resgate de animais domésticos e silvestres afetados pelos recentes incêndios florestais no Parque Nacional de Brasília.
A ação foi coordenada pela Secretaria do Meio Ambiente (Sema-DF) em parceria com o Instituto Brasília Ambiental, com o objetivo de proporcionar atendimento emergencial aos animais vítimas das queimadas, bem como promover a reabilitação e reintegração ao habitat natural. A iniciativa faz parte dos esforços contínuos do GDF para preservar a fauna local e minimizar os impactos das queimadas no ecossistema do Distrito Federal.