BRASILIANAS | A dupla face do abuso

O Metrópoles Digital agora usa irregularmente o fundo dos painéis de LED que espalhou pela cidade para fazer propaganda da rádio e do site do grupo. Outra estratégia é usar lotes particulares e colocar totens nas beiras das vias, em lugares vedados por lei. E o DER-DF, que deveria fiscalizar...

Por William França

A publicidade da Rádio Metrópoles, no fundo do painel de LED, é completamente irregular

BRASÍLIA VISUALMENTE POLUÍDA (30)

O Metrópoles Digital agora usa irregularmente o fundo dos painéis de LED que espalhou pela cidade para fazer propaganda da rádio e do site do grupo. Outra estratégia é usar lotes particulares e colocar totens nas beiras das vias, em lugares vedados por lei. E o DER-DF, que deveria fiscalizar...

Além de emporcalhar a cidade, espalhando tótens de LED por várias regiões do DF, o Metrópoles Digital agora se vale da outra face dos painéis para fazer propaganda de outras empresas do grupo, como o site de notícias "Metrópoles" e a rádio FM, que tem o mesmo nome. Antes, o fundo dos painéis era pintado de vermelho (da cor padrão da empresa).

As empresas do Grupo Metrópoles pertencem à família do ex-senador Luiz Estevão - que foi do MDB, mesmo partido do governador Ibaneis Rocha. A Metrópoles Digital está em nome de duas filhas dele.

Com essa artimanha, o Metrópoles Digital transformou cada um dos tótens de LED em um outdoor, com dupla face. De um lado é LED, com animação digital, e do outro é uma pintura em letras garrafais brancas. Na verdade, parece mais uma pichação. Só que foi feita pela própria empresa... e que divulga ela própria.

A "estratégia" do grupo é completamente irregular e fere todas as autorizações que foram concedidas pelo Departamento de Estradas de Rodagem (DER-DF). Isso porque o DER cobra por metro quadrado e por face que exibe a publicidade.

Funcionava assim (funcionava, porque as regras estão suspensas por ora): as empresas pediam ao DER autorização para instalar o painel e dizia como ele iria funcionar. Quando o painel tem duas faces, elas têm de estar previstas no projeto, que lastreia a autorização. E é com base nele que são feitas as contas para a cobrança, tanto para a instalação quanto para a "hospedagem" do tótem na cidade, que é renovada anualmente.

"Brasilianas" flagrou painéis pintados na Avenida L4 Sul (a Avenida das Nações) e nos que ficam em pistas com acesso ao Aeroporto JK, próximo ao Park Way. Ambas as rodovias são gerenciadas pelo DER-DF. Eles começaram a surgir na semana entre os recessos de Natal e de Ano Novo.

Monopólio baseado numa artimanha

"Brasilianas" apurou que o Metrópoles Digital tem 192 totens de LED instalados na cidade, o que corresponde a 52% do total que foi autorizado pelo DER-DF (que somam 370, distribuídos por mais de 30 empresas).

O "monopólio" do Metrópoles Digital se valeu de uma artimanha, criada pela empresa e endossada pelo DER-DF, que considera esses totens como "equipamentos públicos".

Segundo a leitura torpe do DER-DF, que autorizou as traquitanas, esses painéis do Metrópoles Digital têm a mesma "função pública" que um banco de praça ou um brinquedo para crianças - segundo o DER-DF, por ofertarem (sem custos para o governo) uma ação de utilidade pública. Para que ganhassem esse status, o Metrópoles acrescentou, no painel digital, a exibição de data, hora e temperatura ambiente. Assim, se comportam como "relógios" e não como painéis publicitários, que têm uma regra bem rígida.

Ivan Felix/Brasilianas - Na L2 Sul, o painel foi instalado dentro do lote de uma escola bilingue. Pelas regras vigentes, esse tóten de LED é irregular

As irregularidades se estendem agora para áreas particulares

Em junho do ano passado, o governador Ibaneis Rocha criou um Grupo de Trabalho (GT) para a regulamentação do Plano Diretor de Publicidade no DF. Este GT foi criado pelo Decreto 45.932, de 20 de junho, com prazo de 90 dias. Em setembro, foi prorrogado por mais 90 dias. O prazo extingiu-se em 20 de dezembro do ano passado - e, até agora, nada de regulamentação.

Enquanto está tratando do assunto internamente, Ibaneis determinou que nenhuma nova autorização para painéis fosse dada pelo DER-DF. Também nenhum poderia ser trocado de posição.

E enquanto o GDF não diz o que poderá (e o que não poderá ser feito), o Metrópoles Digital segue espalhando tótens irregulares pela cidade.

Já que não pode em área pública, a artimanha agora é usar os lotes particulares que ficam às margens das vias. Um deles está instalado no final da L2 Sul, dentro do lote de uma escola bilingue. A face dele fica voltada para a pista, no sentido de quem vai para o centro.

Segundo as regras (que foram ignoradas pelo Metrópoles), a L2 sul não é uma rodovia. Pela legislação, pertence ao Conjunto Urbanístico de Brasília (que é regido pelo PPCUB, esse mesmo, que o site do "Metrópoles" fez juras de amor e de fidelidade no ano passado, quando ele estava sendo discutido). Pelas regras, se houvesse um painel, ele só poderia divulgar o que funciona no lote. E é vedada a publicidade de serviços, marcas e promoções.

Outro foi instalado num lote residencial que faz fundos com a Ponte JK, na QL 26 do Lago Sul. Esse tem duas faces e vai ser visualizado tanto por quem vai quanto por quem volta para o Plano Piloto.

Segundo as regras (novamente ignoradas), lá nem poderia existir esse tóten, porque na residencial do Lago Sul nem na área pública e nem na área particular há previsão para esse tipo de artefato publicitário. É totalmente ilegal.

Renata Almeida/Brasilianas - Na QL 26, do Lago Sul, o painel tem duas faces e está em testes. Ele fica próximo à Ponte JK (ao fundo, na foto)

E o DER, que deveria fiscalizar...

... não viu nada, segundo "Brasilianas" apurou. A fiscalização não foi acionada "e nem percebeu nenhuma irregularidade", disse uma fonte à coluna. E nem dá para cobrar uma atitude do diretor-presidente da autarquia, Fauzi Naczur Jr., pois ele está de férias.

Mas, no lugar de Fauzi, está como diretor-presidente substituto... Murilo de Melo Santos. Ele mesmo. Murilo era o superintendente de Operações do DER-DF, quando foi afastado do cargo em novembro do ano passado, após se envolver em uma confusão com funcionários do órgão. Na época, foi dito que ele "caiu pra cima", porque foi nomeado superintendente-executivo - que tem, entre outras tarefas, a de assumir o DER-DF na ausência do titular.

Para relembrar você, caro leitor: foi Murilo quem assinou TODAS as autorizações para a instalação de painéis digitais na cidade, muitas delas contrariando orientações técnicas. Ele ficou quase 30 anos na função.

Murilo Santos é objeto de investigação do Ministério Público do DF e aparece também, em vários documentos, na Ação Popular que segue em curso na Vara de Meio Ambiente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT).

O juiz do caso, Carlos Maroja, chegou a determinar o desligamento dos painéis de LED nas vias públicas do DF. Mas as empresas citadas na ação - com o Metrópoles Digital à frente - conseguiu cassar a liminar. "Brasilianas" apurou que as audiências desta Ação Popular acontecerão ainda no primeiro semestre deste ano.

Vejamos agora até quando Murilo Santos continuará "não vendo nada" de irregular nessas novas artimanhas do Metrópoles Digital...

DER/Divulgação - Murilo Santos, que responde como diretor-presidente do DER-DF no momento