O abuso de autoridade e os vazamentos em processos de investigação envolvendo homens públicos entram na ordem do dia, com uma reunião dos líderes da Câmara com o presidente Arthur Lira.
Para um homem público, a condenação midiática traz um ônus irreparável. Ser rotulado por acusações ainda em fase de investigação e antes de um julgamento, arranha um patrimônio de imagem que é o capital político de quem ocupa cargo eletivo.
O vazamento de informações sigilosas não deve e nem pode ser usado como instrumento político. É crime. O servidor público, seja policial ou do judiciário, deve zelar pela confidencialidade dos autos. O segredo de justiça deveria ser sagrado. Nos processos da vara de família e sucessão, quando envolve menores, existe um pacto respeitoso e é raro que essa linha seja ultrapassada. Já no caso envolvendo políticos ou artistas é uma festa. Não há por parte da mídia nenhum respeito. O massacre ilegal é cometido de forma seletiva e os vazadores escolhem a dedo os jornalistas que usarão. Tornam-se fontes criminosas e viram assassinos de reputação.
Merece uma reflexão sobre o papel das empresas de comunicação em consentir esta farra de quebra de sigilo e de expor, sem documentação, homens públicos que muitas vezes não conseguem nem acesso aos processos. Um subterrâneo que causa prejuízo e efeitos colaterais insanáveis. Um governador de Estado tem uma agenda pública e responsabilidades de gestão de uma máquina de administração.
Ao ser acusado de ter praticado ilícitos e de ter o seu afastamento do cargo solicitado por uma autoridade policial, que resolveu usurpar os poderes que pertencem a um magistrado ou ao Ministério Público, o governante passa a atuar em um terreno instável. A sua autoridade, outorgada por uma vitória nas urnas, como no caso do Rio, em primeiro turno com mais de 60% dos votos, fica arranhada pelo clima de instabilidade criada.
No caso do governador do Rio, Cláudio Castro, a investigação é antiga, baseada em delações duvidosas e requentando fatos já explicados. O pior é que nenhuma das acusações se refere ao exercício do cargo de governador de Estado. O dolo do vazamento do possível indiciamento e do pedido de afastamento do cargo só se torna explosivo quando a mídia, no caso do Rio, as organizações Globo, se torna cúmplice da quebra de sigilo de uma informação em segredo de justiça. Sem o apoio da mídia não haveria efeito de condenação midiática. O lucro para o veículo é se colocar como paladino da justiça e por um homem público no pelourinho da opinião pública. Neste caso, o veículo é cúmplice de vazar uma informação protegida por lei.
É incompreensível que Frederic Kachar ou Ricardo Villela, respectivamente dirigentes dos jornais Infoglobo e da Rede Globo, não compreendam o prejuízo que causam a um governo eleito legitimamente pelas urnas e vítima de um efeito colateral provocado por reportagens apoiadas em uma criminosa quebra de sigilo?
Se um homem público for condenado depois de julgado e de um amplo direito defesa, que pague pelos seus crimes. A própria Globo enfrentou problemas com a compra da TV Montecarlo na Itália ou nas aquisições até hoje não explicadas com direitos de eventos esportivos. Ser investigado faz parte do jogo. No caso da televisão, que é uma concessão pública, usar vazamento de processos é delicado.
Estamos assistindo há meses o caso do delegado Rivaldo Barbosa, preso e acusado sem provas, que suplicou para ser ouvido. Acusado de estar envolvido na morte da vereadora Marielle Franco, ele está preso e foi massacrado pela mídia. Uma investigação que não se sustenta. Está pagando um preço pela normalização do fim da presunção de inocência por parte da mídia, que neste caso age em cumplicidade com os investigadores. Para estes algozes, ele não possui família, carreira ou vida pessoal. É um réu do perigoso achismo condenatório que virou uma infecção social sem antibióticos para combater. Os irmãos Brazão, também presos neste emaranhado, podem ser culpados de outros delitos, mas no caso de Marielle, nada foi investigado.
Já que o sigilo no caso de menores nas varas de família são respeitados, não seria o caso de pensar nas famílias, esposas, esposos, filhos e pais dos homens públicos jogados no pelourinho midiático pelo crime de vazamento? Alguém pensa na sequela da condenação midiática? A imprensa deve estar atenta para os seus excessos; se autorregular e ser ética. No caso do vazamento de informações em segredo de justiça, ela vira cúmplice de um ato criminoso.
O melhor papel que o jornalismo pode ter é exigir que os investigadores atuem tecnicamente, que cumpram a lei, que ouçam todos os envolvidos e, principalmente, que trabalhem com fatos. Fazer um indiciamento por achismo condenatório nunca deveria receber o beneplácito da mídia, especialmente de uma organização como o grupo Globo, transformado em verdugo da presunção de inocência. Agiu desta forma com Alceni Guerra, na Escola de Base; com Lula; com a Odebrecht; com a J&F; Jair Bolsonaro; com o reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, Luiz Carlos Cancellier; e muitos outros que provaram depois que eram inocentes.
*Diretor de Redação do Correio da Manhã