Por: Cláudio Magnavita*

Sem autorização prévia para adquirir terras na Brasil, a sino-indonésia Paper Excellence quer alterar marco legal

Paper Excellence | Foto: Reprodução/Paper Excellence

A disputa pela Eldorado Celulose, uma das gigantes do setor no país, pertencente ao grupo brasileiro J&F, e a sino-indonésia Paper Excellence, detonou uma articulação para pressionar o governo e o Judiciário para promover um liberou geral na aquisição de terras por estrangeiros.

Tal mudança de regra jurídica é o caminho encontrado pela Paper para fazer valer um negócio distante da legislação que ela pretende emplacar.

Do que se trata?

O grupo sino-indonésio não cumpriu uma obrigação legal exigida de qualquer empresa estrangeira que pretende comprar um negócio que envolva posse ou arrendamento de terras no Brasil - como é o caso da Eldorado, que tem 285 mil hectares de florestas plantadas de eucalipto e 121 mil hectares de florestas destinadas à conservação.

A lei determina que, para aquisição ou arrendamento de imóveis rurais por estrangeiros e sociedades estrangeiras ou sociedades brasileiras que tenham a maioria de capital estrangeiro (para evitar a aquisição ou exploração indireta), é necessária a autorização governamental prévia, exceto para as aquisições de áreas pequenas por pessoas físicas, iniciando-se pelo pedido de autorização direcionado ao INCRA e, em alguns casos, chegando a necessidade de autorização do Congresso Nacional.

Ou seja: é permitida a compra de terras por estrangeiros, desde que as disposições legais sejam obedecidas.

Foi essa lei que a Paper não observou ao fazer o negócio no Brasil e, ao assinar o contrato de compra e venda da Eldorado, teria declarado que tinha todas as autorizações legais exigidas. Tal situação torna o contrato nulo, segundo o entendimento do próprio INCRA, do Ministério Público Federal e da Advocacia-Geral da União.

Agora, a empresa busca formar um "movimento" de reação à lei, argumentando que esse tipo de exigência causaria insegurança jurídica e colocaria em risco todos os investimentos estrangeiros feitos no Brasil.

No entanto, os investimentos no segmento de Agricultura, Pecuária e Extrativa Mineral registraram volumes expressivos desde 2010, ano em que a lei 5.709/71 recebeu uma nova interpretação da Advocacia Geral da União. O setor foi responsável por 12% do total investido por estrangeiros em 2022, último dado disponível, chegando ao pico de 16% em 2010.

Ou seja, a Paper emite sinais que não está preocupada com os investimentos no país ou a segurança do agronegócio. A movimentação jurídica aponta que a estratégia será de fazer valer sua conveniência de um negócio que, neste cenário, contraria a lei em vigor.

Comparando o cenário global pode-se afirmar, inclusive, ser a legislação brasileira atual uma das mais liberais do mundo, certamente a mais amigável ao investimento estrangeiro entre os grandes produtores de commodities agrícolas do mundo, ao lado do Brasil: Índia, China, Estados Unidos e Rússia. A China, que tem grandes investimentos no grupo a que pertence a Paper Excellence, por exemplo, veta a posse de terras por entidades estrangeiras. Parece aquele hóspede inconveniente — que quer fazer na sua casa o que não permite fazer na dele próprio.

A sino-indonésia Paper Excellence, renovou o seu contrato com o ex-presidente Michel Temer, segundo publicou o colunista Lauro Jardim, e o ex-dignatário, por coincidência, passou a atuar na defesa da mudança da legislação para permitir que estrangeiros sejam dispensados da autorização prévia para aquisição de longo trechos do território nacionais. "Guardando-se — devidas proporções o caso seria semelhante a contratação do ex-presidente americano Barack Obama, que também é advogado, para defender a liberação de territórios norte-americanos para empresas russas", afirma um advogado especializado no assunto que complementa "aqui, como não temos embargos para os chineses, como os EUA fazem com a Rússia, não seria ilegal, mas cria um conflito com os interesses nacionais". Em tempo: foi na gestão Temer que o cenário legal começou a sofrer pressões de mudanças, alegando uma insegurança jurídica que não existe. O âmago da questão é a necessidade de uma autorização prévia, que empresas como a sino-indonésia Paper Excellence, não obtiveram, ao firmar contratos que lhes dariam um quinhão relevante do território nacional.

 

*Diretor de Redação do Correio da Manhã