Coluna Magnavita | A hipocrisia natalina

Três história de Natal e a hipocrisia do período

Por Cláudio Magnavita

Espírito Natalino

Neste período de festas a marca maior do espírito natalino é a fraternidade e solidariedade. Vale a pena refletir sobre estes três tópicos.

A FALTA DE SOLIDARIEDADE NA GOL - Uma passageira do Gol 1511, no dia 09 de dezembro, embarcou em um 737-800 no aeroporto Luís Eduardo Magalhães, em Salvador, com destino a Congonhas, em São Paulo. Com apenas 1,40 cm de altura, visivelmente PCD, com encurtamento dos membros, ela pede gentilmente ao comissário Diego Gomes auxílio para colocar a sua malinha de mão no maleiro do avião. O fofo comissário não hesitou: “Não posso ajudar, não é minha obrigação!”.

Foi um constrangimento geral. Um passageiro sentado no espaço comfort, indignado se ofereceu para ajudar. A passageira, alta funcionária do governo federal, constrangida com a grosseira natural do funcionário da Gol, se dirigiu ao seu assento na poltrona 23C, e, com auxílio de outros passageiros, guardou sua mala.

Indignada e depois de reflexão e pensando em futuros passageiros PCDs, chamou a chefe de equipe durante o voo e fez o registro do seu desconforto. “A Gol foi pioneira em contratar PCDs na aviação e é por isso que relatei o que ocorreu". A chefe do voo, com um nome complicado, para surpresa de quem ouvia a história, confirmou que o comissário não tinha obrigação de ajudar os passageiros com as suas bagagens. Além de endossar o colega, disparou ainda “por que a senhora não despachou a sua bagagem?” A resposta arrancou aplausos dos passageiros curiosos pelo desfecho: “a senhora já ouviu falar de bagagem extraviada? Se a minha mala for perdida, eu não posso ir a um shopping e comprar uma roupa como você faria. Pela minha altura as minhas roupas são especiais”.

Para finalizar a história, o avião parou em posição remota em Congonhas, e a passageira PCD teve de descer a escada, degrau por degrau, sem que os comissários ou despachantes esboçassem um pingo de solidariedade.

O RACISMO DA SUNSET EM PLENO MARACANÃ - Um dos mais conceituados jornalistas de cultura do Rio e sua esposa foram ao Maracanã, no dia 22 de novembro, assistir o jogo entre o Fluminense e o Fortaleza. Ao passar pela revista na entrada do estádio, o casal foi surpreendido por uma atenção especial da esposa do jornalista, uma afrodescendente com uma linda cabeleira que valoriza a sua etnia. A funcionária da empresa de segurança Sunset, Érika Nascimento dos Santos, além da verificação externa, queria fazer uma revista no penteado da jovem esposa, em uma violência e visível sinal de discriminação.

Como houve reclamação, o gerente da Sunset levou a sua funcionária até a delegacia do Maracanã e lavrou um ato de fato atípico número 018-11187/2024, no qual o preposto informa: “que segue as normas do procedimento padrão de revista da Empresa, mas que a torcedora continuou dizendo que a comunicante não mexeria em seu cabelo. Diante da situação, o superior da comunicante direcionou todos para esta delegacia destacada para apresentação da ocorrência à Autoridade Policial em serviço.”

Por pouco a vítima era transformada em algoz e seria processada pela Sunset por não permitir a revista íntima na sua cabeleira. Um triste conluio entre a Sunset e as autoridades policiais lotadas no Maracanã.

FRATERNIDADE SÓ NO PAPEL E NA PALAVRA - No dia 14 de dezembro, em um velório, um padre e um maçom foram chamados para homenagear a personalidade falecida, conhecido pelo apoio a obras sociais e por fazer o bem. O padre falou primeiro. Usando camiseta de obra social e calçando sandálias franciscanas, pregou sobre a amizade e o momento de passagens. Leu trechos do evangélico e chegou até citar o lema liberdade, igualdade e fraternidade da maçonaria.

Sem que houvesse cumprimentos, entrou o maçom paramentado como integrante dos altos corpos e usando avental do grau 33. Leu um texto sobre fraternidade e reflexão sobre o Oriente Eterno. Falou do orgulho e da necessidade de viver uma vida justa.

Após os dois oradores terminarem, um dos presentes fez um comentário que revelou um paradoxo: os dois eram irmãos. O padre e o maçom. Não se falavam por questões de família e não por desavenças entre maçonaria e igreja. Por onde andava a fraternidade que minutos antes eles pregavam?

NATAL É TODO DIA - Estas três histórias revelam a hipocrisia social de um espírito natalino que só surge nesta época do ano. O espírito do Natal deveria ser nos 365 dias do ano e em pequenas atitudes, como ajudar um PCD no avião como deveria ter feito o comissário na Gol; o respeito à etnia como faltou ao manual da Sunset; ou com um padre e maçom que deveriam dar o exemplo e se abraçar. Na política, falar de fraternidade é hipocrisia. Muitos pensam só nos negócios que podem fazer e não no povo sofrido que precisa de apoio e justiça social.