Por: Ricardo Cravo Albin*

A voz pela Baía da Guanabara - Parte final

Enseada de Botafogo, Rio Antigo | Foto: Acervo Instituto Moreira Salles

É triste, muitíssimo triste, que a consciência ecológica sobre a Baía da Guanabara que nos alertou a todos a partir dos anos 80 ainda não tivesse sensibilizado as autoridades, em especial, as dos municípios do Rio, vizinhos e responsáveis diretos pelo abandono a que chegou nossa baía. O Programa de Despoluição da baía foi retomado pelo Governo Estadual, depois de quase cancelado por inadimplência do governo anterior. Isso significa finalmente uma possibilidade (animadora?), a de termos a baía recuperada em futuro. E o que é recuperar a baía? Promover-se de imediato a construção de estações de tratamento para que os esgotos que são jogados in natura - e o são até hoje - transformem-se em água comum, não mais poluente.

É claro que quem anda pelo Rio se aflige — e por décadas a fio — com o Canal do Mangue, com o Rio Carioca (agora canalizado e que deságua no Aterro), com línguas negras que despontam nas praias. Todos eles jogam esgoto na baía. Eu, que caminho pela Urca e Flamengo, sou testemunha ocular de esgotos que são despejados por grossas manilhas em vários pontos da baía. O que mais me horroriza, contudo, são os que a gente não vê: os esgotos que caem, reconhecidos (ou não), no entorno de toda a baía, que abriga mais cinco municípios, além de Rio e Niterói. Recuperar a baía vai custar milhões e milhões de reais. E justo que se gaste esse dinheirão? Nem pode haver a menor dúvida. Com muita indignação, é claro. Por desvio de recursos continuados e persistentes. Criminosos por certo... Mas uma reflexão se impõe: os administradores dos tantos municípios do Rio deixaram que essa situação chegasse aonde chegou, por falta de visão do futuro, por incompetência ou por reles politicagem. Há um amontoado de culpas públicas das quais é preciso que se extraia um ensinamento. A elite dirigente do Rio tem que melhorar, não a passos de cágado, mas a passos de canguru.

Macaque in the trees
Enseada de Botafogo, Rio Antigo | Foto: Acervo Instituto Moreira Salles

Aliás, falando em melhorar, venho observando que as águas da baía se renovam com as marés mais altas, que injetam nela mais água pura. O resultado é imediato: na muralha da Urca e em vários pontos do Flamengo, centenas de pescadores se achegam nesses dias para a prática da pesca por molinete.

Aliás, vale registrar aqui que, ainda no século passado, o local mais piscoso dentro da baía eram as águas que circundavam a Ilha do Governador, a maior das mais de cem ilhas (isso mesmo, cem, ao menos até o princípio do século) que existiam na Baía de Guanabara. Os indígenas chamavam-lhe de Paranapucu. Os portugueses a conheciam por Ilha de Maracajá (gato bravio), isso porque o chefe dos índios Temiminós, pai de Araribóia, tinha a alcunha de Mara-cajá-guaçu (gato grande). Já os franceses a designavam isle grande ou la belle isle.

A Ilha do Governador foi doada em 1567 ao Governador Salvador de Sá por seu tio, o Governador-geral Mem de Sá. Salvador ali montou engenhos e plantou cana. Daí o nome posterior de Ilha dos Sete Engenhos, depois Ilha do Governador, em homenagem ao primeiro capitão-mor e governador do Rio. A Ilha do Governador, de resto, foi um pomar ubérrimo desde o fim do século XIX até os meados do XX, razão por que boa parte das frutas que o Rio consumia provinha de suas terras privilegiadas. A ilha, aliás, perdeu neste século quase todas as referências históricas copiosas que sempre abrigou, como um dos lugares mais ativos da cidade desde sua fundação.

Este artigo bem como os demais três que o antecedem, são dedicados ao prof. Arno Wehling, bem como a seus colegas do IHGB (Instituto Histórico e Geográfico do Brasil), esses todos dedicados e atentos fiscais e defensores dos pontos centrais que nos cercam dentro da cidade do Rio. Pois foram alguns desses defensores da cidade do Rio que acabam de me alertar que sobre a Guanabara incidem agora também severas preocupações policiais, a envolver anomalias diferenciadas. Tais como assaltos noturnos a barcos de todas as ordens, incluindo até pequenos navios de turismo. Acrescem-se desvios outros como lançamentos de dejetos e sujície de limpeza de barcaças de médio e até grande porte. E até desembarques de contrabando e mercadorias em locais ermos dentro das águas da Baía. Meu Deus!

*Presidente do PEN Clube

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.