Por: POR RUDOLFO LAGO

CORREIO POLÍTICO | A esquerda está se distanciando das pessoas?

A esquerda compreende como o brasileiro se enxerga? | Foto: Tânia Rego/Agência Brasil

Em 2007, o cientista político e sociólogo Alberto Carlos de Almeida escreveu o livro "A Cabeça do Brasileiro". A partir de pesquisas, Alberto Carlos comprovava teses do antropólogo Roberto da Matta e outros pesquisadores a respeito de como pensa a sociedade brasileira. Demonstrava, por exemplo, que há no imaginário do cidadão médio uma ideia hierárquica, que compromete a igualdade efetiva. Em uma das perguntas da pesquisa, por exemplo, o cientista político perguntava às pessoas qual deveria ser a atitude de um empregado caso o patrão lhe dissesse que ele poderia usar a piscina do edifício. A resposta de 65% foi de que ele deveria agradecer e não tomar banho na piscina. Para ele, tal imaginário não pode ser desprezado.

 

Distanciamento

Não que Alberto Carlos ratifique ou defenda tal comportamento. Mas, para ele, ao tentar forçar situações que a sociedade brasileira estranha, a esquerda estaria se distanciando do brasileiro médio. "O pardo, por exemplo, não acha que é negro", exemplifica.

Identitária

Para Alberto Carlos de Almeida, algumas das pautas identitárias não seriam bem assimiladas. E podem ser a causa dos problemas eleitorais da esquerda no momento. "A esquerda não deveria apenas importar essas pautas. Mas entendê-las no contexto brasileiro".

Lula não cometeria esse mesmo erro

Lula teria melhor compreensão da cabeça das pessoas | Foto: Ricardo Stuckert/PR

Na avaliação de Alberto Carlos de Almeida, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não cometeria esse erro. Ele consegue ter uma visão mais próxima da cabeça do brasileiro médio. E fala a língua dessas pessoas na forma como elas compreendem. Por isso, teria na maioria das vezes um desempenho individual melhor que o do PT ou da esquerda na média. "Lula sempre foi muito povo brasileiro", considera o cientista político. Assim, o próprio Lula continuará tendo um papel político importante, com chance grande de reeleição. Mas acentuando as dificuldades de agora, convivendo com um Congresso conservador e minoria agora de prefeituras.

Adaptação

Para Alberto Carlos de Almeida, o caminho seria conseguir chegar a um meio termo no qual as questões de gênero e raciais fossem abordadas levando em conta a cabeça média do brasileiro, a forma como ele se enxerga e enxerga sua vida e seus problemas.

Aborto

Quando, por exemplo, para o cientista político, avançou-se sobre o que se tornou legal sobre a questão do aborto, foi quando o tema foi tratado como questão social e de saúde pública, no contexto das dificuldades vividas pelas mulheres especialmente na periferia.

Violência

"O grande problema de gênero no país é a violência doméstica", sustenta Alberto Carlos. "Nesse sentido, a questão é compreendida bem melhor do que quando se fala da suposta liberdade da mulher sobre seu corpo, um discurso não bem compreendido".

Cotas

Da mesma forma, o Brasil conseguiu avançar na política de cotas também a partir da percepção da desigualdade social. "É possível abordar a questão racial e de gênero a partir da própria experiência brasileira, respeitando a forma como a sociedade se enxerga".