Por: POR RUDOLFO LAGO

CORREIO POLÍTICO | O agro é pop. Mas indígenas conseguem conter Ferrogrão

Na quinta-feira (30), comentávamos, aqui no Correio Político, as dificuldades do PT em se adaptar às mudanças do país e do mundo, e como isso acabou complicando a vida do partido e da esquerda nas eleições municipais. Mas a complexidade dos tempos revela surpresas. Hoje, o comando da área de infraestrutura do governo está totalmente na mão dos seus aliados mais conservadores. E o agronegócio tem força enorme, seja no próprio governo seja especialmente dentro do Congresso e na sociedade. O agro é pop, como diz a propaganda. Mas, por incrível que pareça, a despeito dessa força, há quase dez anos, desde o governo Michel Temer, os indígenas têm conseguido conter o avanço da Ferrogrão.

 

OIT

Muito provavelmente, um ponto que protege os indígenas é o fato de o Brasil ser signatário da Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que determina que os povos originários precisam ser consultados sobre situações que afetem as áreas que ocupam.

Contida

O fato é que, a partir disso, os advogados dos Kayapós têm conseguido conter a construção da ferrovia. Apesar de ela constar do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), ser prioridade da pasta dos Transportes e considerada fundamental para o agronegócio.

Documento de Guajajara mostra a queda de braço

Um novo capítulo dessa queda de braço acontece agora. O Correio Político teve acesso a uma longa nota técnica do Ministério dos Povos Indígenas, da ministra Sônia Guajajara, sobre a Ferrogrão. Para tentar resolver o litígio, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, estabelecera um grupo de conciliação unindo as partes interessadas em torno da ferrovia. Criou-se, então, um grupo de trabalho para discutir o tema. Em julho, os representantes dos indígenas romperam com o grupo. Agora, a nota assinada pela equipe técnica de Guajajara sugere a retomada das negociações, apontando "sugestões preliminares".

MP

O começo do rolo em torno da ferrovia foi uma Medida Provisória no governo Temer que ampliou a faixa na lateral da BR-163, avançando por 466 hectares do Parque Nacional do Jamanxim, onde vivem os Kayapós e outros povos. A MP motivou a ação, com base na OIT.

Consulta

Se os indígenas têm de ser consultados, a nota técnica encaminhada do Departamento de Mediação e Conciliação de Conflitos Fundiários ajuda nessa consulta. "Grandes obras aportam com um pacote (...) que influencia na vulnerabilidade desses povos", diz ela.

Realidades

"Esses empreendimentos, incluindo seus programas de mitigação e compensação, realizados geralmente sem o cuidado da contratação de indigenistas experientes (...) são capazes de desestruturar comunidades centenárias em curto espaço de tempo", afirma o estudo.

Tempo

A proposta do corpo técnico de Guajajara, então, pede, ao final, que seja respeitado "o tempo próprio de cada povo". Ou seja, recomenda cautela e pouca pressa. O agro é pop, a infraestrutura está com os conservadores. Mas as minorias têm seus instrumentos.