Por: Sérgio Cabral*

Mulheres e Cidadania

Peço a Deus que abra a mente do povo brasileiro | Foto: Divulgação/ Freestocks.org

O que é cidadania? Qual a extensão do conceito? Depende, cara leitora, do país em que você vive.

Se você, do sexo feminino, mora na Comunidade Europeia, África do Sul, Argentina, Uruguai, México, Estados Unidos, Canadá, China, Japão, Nova Zelândia e Austrália, por exemplo, e deseja interromper uma gravidez indesejada, terá o amparo do serviço de saúde, público e/ou privado, para te acolher nesse momento tão doloroso para a mulher. Isso é cidadania!

Você, querido leitor, que more nesses países, pode acompanhar sua filha, neta, namorada, noiva, esposa, amante, amiga, sem ter que procurar uma clínica clandestina para o procedimento médico.

Países que evoluíram muito nas condições de cidadania para seus habitantes. No aspecto financeiro, social, habitacional, urbanístico, ambiental, e, Last But Not Least, os direitos humanos, nele incluído o direito ao aborto.

A turma do slogan oportunista e distorcido “Deus, Pátria e Família”, carrega nas tintas na demonização do direito à interrupção da gravidez. Mas não menciona que nos países democráticos e desenvolvidos e com fortes raízes cristãs, o aborto é legal.

Insatisfeitos com a atual legislação brasileira sobre o tema, que já é pífia e absurdamente restrita, os fascistas querem agora criminalizar a mulher, no grau de homicídio, caso a gestação passe de 22 semanas, mesmo em caso de estupro! Seria cômico se não fosse trágico.

A mídia liberal e progressista tem diante de si a oportunidade de colocar na pauta esse assunto de maneira perene. Para isso precisa ter coragem. Não basta reprovar o absurdo que se quer fazer agora. É preciso que a imprensa que acredita em direitos civis, que seus proprietários e executivos tenham a coragem de ter posição editorial progressista. Vamos enfrentar esse debate de maneira transparente. Vamos ouvir especialistas em saúde pública, ginecologistas e obstetras, profissionais do SUS que recebem mulheres o ano todo em busca de reparações de danos causados por abortos mal feitos em lugares clandestinos. O número não é pequeno: mais de 200 mil pacientes retornam ao SUS por essa razão, por ano. Fora os óbitos. Vamos convidar profissionais e entidades dos países citados acima, para troca de experiências e informações.

Peço a Deus que abra a mente do povo brasileiro. Como abriu de inúmeras sociedades cristãs. Lembro-me do plebiscito sobre a legalização do aborto na Itália, em 1978. Eu tinha quinze anos e já interessado nos assuntos coletivos, perguntei muito aos meus pais sobre o que era plebiscito e o que significava o aborto. A campanha do plebiscito na Itália foi muito dura e agressiva. O Vaticano jogou pesado contra. Políticos conservadores foram impiedosos. Na mesma linha dos fascistas cristãos brasileiros que bradam: “assassinas! assassinas” às mulheres que lutam pelo direito ao aborto. Pois bem, na Itália venceu o direito da mulher interromper sua gravidez indesejada. O Vaticano foi derrotado.

Todos esses países têm serviços psicológicos e assistenciais às pacientes. O procedimento é entender, de maneira transversal, o contexto em que a mulher se encontra física e emocionalmente. Como princípio convencê-la a pensar muito sobre a decisão. E só depois disso, haver o procedimento, caso não a convença do contrário. A mulher é a protagonista desse debate. Nós homens somos coadjuvantes. A mulher não está sendo ouvida!

*Jornalista. Instagram: @sergiocabral_filho