Por Leandra Lima
A esperança traz um sentimento misto de alegria, melhora, estímulo e renovo. Ela é considerada como um marco na humanidade, onde apesar de todos os males sempre há "uma luz no fim do túnel". Nela, as pessoas compartilham um mesmo sentimento e acabam fortalecendo os elos e a partir disso conseguem encarar a realidade de uma forma diferente. Essa reflexão é uma das trabalhadas no projeto "Esperançar" criado na Casa de Cidadania de Petrópolis, com o intuito de fortalecer e empoderar mulheres.
O Esperançar surgiu em 2022 em meio às ações que a Casa da Cidadania estava produzindo para ajudar as vítimas da tragédia socioambiental que atingiu Petrópolis em fevereiro e março daquele ano. Nesse período, o espaço se tornou um ponto de recolhimento e distribuição de alimentos, com isso as famílias realizavam o cadastro na sede. A partir daí os agentes perceberam que ficava um vazio entre a época em que as pessoas doavam muito ou pouco, e entenderam que esse auxílio ia acabar se diluindo com o tempo, e o sofrimento dos sobreviventes ia ficando.
Nesse lapso, um grupo de psicólogos que promovem pelo Brasil ajuda humanitária às cidades onde existe catástrofe, realizou um trabalho na sede, onde conseguiram reunir com a equipe da casa, 40 mulheres durante um final de semana.
Após o encontro o sentimento de vazio ainda pairava, e então o Esperançar nasceu como forma de dar continuidade ao desenvolvimento do bem-estar desse grupo. O projeto é o primeiro a ser idealizado pela casa, e trabalha com mulheres vítimas das chuvas, que vivem em aluguel social e as que se encontram em vulnerabilidade. Ele é coordenado por Rosane Borsato, assistente social à frente da articulação.
Esperançar
O projeto trabalha diversas vertentes que atravessam as vidas dessas mulheres, desde questões emocionais e problemas de saúde mental e física, ao empreendedorismo.
"No conjunto das ações do projeto, nosso objetivo principal é o fortalecimento do vínculo delas. Não só familiares, mas também na comunidade e cidade. E o fortalecimento principalmente delas mesmas, para se enxergarem com pessoas que reconhecem sua importância e também seu pertencimento em Petrópolis. Agora, no segundo semestre, estamos levando-as para conhecer alguns pontos da cidade que muitas que não conhecem. Nunca entraram no museu, por exemplo. Enfim, não conhecem a própria cidade, então isso também faz parte do projeto, botar em pauta o pertencimento. Assim como também a questão do racismo, hoje temos muitas mulheres negras, e levantar a questão delas se reconhecerem como mulheres negras e a importância delas para a história da cidade é importantíssimo", explicou a coordenadora, Rosane Borsato.
Outro ponto do trabalho é o empreendedorismo feminino que estimula a criação de produtos com materiais que normalmente se tem em casa. "Hoje, por exemplo, temos uma parceria com o projeto Estrela da Manhã. Onde mostra que coisas simples podem se tornar bijuterias, como tecido e papelão. A partir disso elas fazem coisas muito bonitas, brincos, colares e pulseiras. Buscamos trabalhar dentro da realidade delas, aquilo que elas têm possibilidade de construir", ressaltou Rosane.
Rosane revela que o nome "Esperançar" surgiu pelas próprias participantes que entenderam que a esperança estava no fazer. "Elas escolheram a denominação em função de que nas nossas rodas de conversa chegaram à conclusão de que o esperançar é uma esperança fazendo. Você espera, mas espera fazendo, não parado, esperando cair do céu", disse.
O símbolo que representa o grupo é a borboleta, que traz consigo a ideia de transformação e renovação. "A borboleta representa bem, pois a ideia de ela está no casulo que é feio e depois virarem lindas borboletas, é bem simbólico e resiliente", enfatizou a coordenadora.
O esperançar funciona em ciclos, todo o ano, uma nova leva de mulheres podem se inscrever e realizar a avaliação na Casa da Cidadania. A ação recebe um recurso da prefeitura, que ajuda no transporte, no lanche e na manutenção da casa.
Relatos
Todas as participantes compartilham de um mesmo sentimento que vem do ar acolhedor e da força que cada uma passa para outra. A sintonia ficou clara no relato de Tamires do Couto, moradora da Comunidade 24 de Maio que perdeu parte de sua casa na tragédia.
"Eu cheguei no projeto através do comunicado que colocaram no grupo da comunidade onde eu morava. Vi aqui um escape. Porque quando disseram que era uma terapia em grupo falei assim, vou lá ver e tal, quando cheguei, no primeiro dia já pensei, acho que eu não vou ficar aqui não. Mas, quando a Rosane fez a entrevista comigo, percebi que aqui eu teria o acolhimento que precisava. Em meio às ações percebi que somos mulheres feridas, uma ajudando a curar a outra. Então, é... aquele negócio, ninguém solta a mão de ninguém. Percebi que aqui seria um espaço bom para eu descarregar, digamos assim, algumas emoções que carregamos no dia a dia, e acabamos nos fortificando e vencendo, nossos fantasmas", falou.
Eloisa Evangelista, outra integrante do grupo, também tem a mesma sensação. "Conheci o projeto através da Josie, da Rua 1º de Maio, e é um pouco complicado para mim, porque eu morei na 1º de maio, e fiquei soterrada, perdi as coisas tudo. E aí, através da Josie, entrei no Esperançar e consegui um psicólogo, ajuda na cesta básica e acolhimento das meninas, onde a gente se reúne toda quarta-feira, se diverte e chora muito também, porque tem vários depoimentos tristes, outros mais alegres, e uma tenta colocar a outra para frente, e vão embora, porque uma dá força para a outra", expressou.