Por:

Nova política da Meta infla debates entre segmentos

O anúncio mobilizou o Ministério Público Federal, que pediu explicações mais claras da empresa | Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Por Lanna Silveira

O anúncio das mudanças nas políticas de moderação de conteúdo da empresa Meta, dona de redes como o Facebook e o Instagram, iniciou uma grande discussão sobre liberdade de expressão, desinformação e discurso de ódio no Brasil, engajando não somente pessoas comuns como entidades e órgãos governamentais.

O comunicado foi emitido nesta terça-feira (7) por Mark Zuckerberg, presidente executivo da empresa, anunciando que o programa de verificação de dados atual da empresa será encerrado - inicialmente, a medida será tomada apenas nos Estados Unidos. A intenção da Meta é implementar o recurso de "notas de comunidade", em que os usuários podem adicionar informações e correções por conta própria em postagens que julguem imprudentes. Com a mudança, a plataforma terá maior dependência de denúncias feitas por usuários para o acionamento da intervenção da Meta.

Segundo Zuckerberg, o sistema de verificação de dados, com uma equipe interna e parceiros dedicados a essa função, apresentava uma performance "politicamente tendenciosa", que não atribui confiança ao serviço. Embora tenha assumido que a verificação de conteúdos por parte de usuários possa prejudicar a identificação de postagens danosas, o presidente executivo acredita que o novo sistema possa diminuir a quantidade de contas inocentes sendo derrubadas por denúncias.

Diante do anúncio, o Ministério Público Federal notificou a empresa nesta quarta-feira (8), pedindo que esta esclareça se a nova política de moderação será implementada no Brasil - algo que poderia causar um impasse semelhante ao caso da suspensão do X/Twitter em território nacional. Para o MPF, as mudanças anunciadas "alteram radicalmente" as providencias, apontadas anteriormente pelo Meta, que seriam adotadas para enfrentar a desinformação em suas redes sociais.

O órgão também pediu mais detalhes sobre as novas ações, "para avaliar em que medida elas podem, eventualmente, impactar direitos dos usuários destas plataformas que vivem em nosso país", estabelecendo 30 dias úteis para que os representantes legais da empresa no Brasil se manifestem.

Rejeição

Algumas entidades brasileiras se manifestaram abertamente contra as alterações nas políticas de moderação da Meta. Nesta quarta-feira (8), a Coalizão Direitos na Rede divulgou um manifesto de repúdio, assinado por mais de 75 entidades, que declara que as propostas colocam em risco a integridade de usuários de grupos vulneráveis que usam essas plataformas, representando também um retrocesso nos esforços para que os ambientes digitais se tornem mais seguros e democráticos.

- A empresa sinaliza que não terá mais ações de moderação de conteúdos contra desinformação, discurso de ódio e outras políticas de proteção a favor das pessoas mais vulnerabilizadas. O CEO da Meta explicitamente admite aceitar os riscos de que essas novas políticas possam filtrar menos conteúdos nocivos do que as anteriores - acrescenta o texto.

O documento é assinado, entre outras entidades, pelo Instituto de Defesa de Consumidores (Idec), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Associação Brasileira de Juristas Pela Democracia (ABJD), Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong), Ação Educativa, e Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social.

De acordo com o texto, atualmente, já são falhas as políticas de moderação de conteúdo das redes da Meta, tornando possíveis práticas de violência de gênero, ações contra a proteção de crianças e adolescentes, e permitindo o crescimento de grupos que propagam discurso de ódio e desinformação.

Para a coalizão, as novas medidas propostas pioram a situação ao negligenciar os impactos reais dessas práticas de violência online, "além de abrir caminho para a proliferação de conteúdos prejudiciais que desestabilizam sociedades e minam processos democráticos".

No estado do Rio de Janeiro, o Coordenador do Programa Estadual Rio sem LGBTIfobia, Ernane Alexandre, também expressou preocupação sobre o impacto dessas alterações na presença online de pessoas LGBTI , classificando a decisão como um dos sinais de um possível "retrocesso de lutas históricas no combate à LGBTIfobia".

- A mudança dessas diretrizes nos leva a pensar no equilíbrio da liberdade de expressão, garantida por lei no nosso país, com a proteção de grupos que são considerados vulneráveis, como a população LGBTQIAPN , e garantia de um ambiente digital saudável. O direito de se expressar deve ser limitado quando se põem em risco a dignidade de outras pessoas - declara.

Ernane destaca que as plataformas digitais deveriam pensar no aprimoramento das tecnologias de checagem de informação e identificação de discurso de ódio, frisando também a necessidade da "educação digital" dos usuários para que o comportamento dos perfis nas redes sociais apresente um equilíbrio entre o direito de expressão e a responsabilidade na propagação de ideias. "Não devemos confundir liberdade de expressão com impunidade para agressão", conclui.