Por Rodrigo Fonseca
Especial para o Correio da Manhã
Novo endereço da invenção para as artes plásticas no Rio, o nº 318 da Avenida Alexandre Ferreira, no Jardim Botânico, abriga vivências afetivas do ator Chico Diaz, acolhendo em suas paredes quadros que ele produziu ao longo das últimas três décadas.
Não é só o colorido das tintas que carrega um pedaço do astro de cults como "Os Matadores" (1997) e "Amarelo Manga" (2002). Foi naquele lugar que ele cresceu com a mãe - a tradutora Maria Cândida Rocha - e o pai - o educador paraguaio Juan Enrique Díaz Bordenave, autor de livros seminais como "O Que é a Comunicação" e "Além dos Meios e Mensagens" - rodeado de irmãs e irmãos.
As telas de sua autoria que lá estão expostas traduzem momentos de sua trajetória pessoal. É um voo de volta à sua saudade. "Nesse processo de andar às voltas com o tempo, decidi voltar à casa da formação para fincar raízes", diz Chico, que incluiu em sua galeria quadros que pintou em Lisboa, onde viveu durante a pandemia.
"A casa tem o aspecto de uma construção latino-americana, com madeira toda trabalhada. Minha intervenção nela foi apenas limpar e iluminar para receber os convidados, resgatando o espírito da nossa família. Contei a nossa história com quadro que pintei há 20, 30 anos e com trabalhos mais recentes".
Não por acaso a exposição que inaugura a galeria é "Casa da Infância" e ela fica aberta para visitação até o dia 30, de quinta a domingo, das 17h às 20h. Cada quadro carrega uma inquietação e um alumbramento, ilustrando a cartografia sentimental de um dos mais talentosos atores do país, que se prepara para encarnar o padre Santo no remake da novela "Renascer", de 1993.
"Na inauguração, a casa roubou a atenção do público, com sua arquitetura imponente, que casava bem com os quadros. Tenho um desejo de fazer dela um centro cultural para além de minha pintura, pois há espaço para conversas, debates, música. Preciso de alguém para empreender isso, mas a vontade existe", conta Chico, que vai exibir sua obra como artista visual também em Portugal, na Casa da Cidadania, em Coimbra, em outubro. "Como a gente vive muito à deriva no ofício de ator, a pintura tem me validado uma busca por sentido. Tem sido uma escuta de mim, um espaço de autoficção para a escrita de mim mesmo, para a escrita do meu inconsciente".
Em 2020, Chico surpreendeu o cinema europeu ao protagonizar o longa luso "O Ano da Morte de Ricardo Reis", de João Botelho. Tem para estrear filmes inéditos como "Vermelho Monet", do cearense Halder Gomes, e "Casa do Girassol Vermelho", do mineiro Eder Santos. No ar na novela "Todas as Flores", trabalha um documentário sobre seu pai. Recentemente, dirigiu o doc "Diário Dentro da Noite". Pode ser visto ainda na Netflix no longa acreano "Noites Alienígenas".
"O processo de 'Renascer', com o padre que estou criando, tá sendo muito forte", diz o ator, que revisita sua gênese sentimental a cada visita à casa de infância. "As camadas que foram formando a mim e a minhas irmãs e irmãos estão ali".