Isso a Marvel não mostra

Com referências ao ABC do pop, o longa 'Cansei De Ser Nerd' fecha suas filmagens com aura de cult e fome de sucesso pra fazer de Fernando Caruso um Clark Kent carioca

Por Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

Os personagens Airton (Fernando Caruso) e Ulisses (Pedro Benevides) em cena são como Sam e Frodo, de 'O Senhor dos Anéis'

No peito do Homem de Aço bate um coração que usa óculos. Já no peito de Aírton, o Clark Kent vivido por Fernando Caruso no set do longa-metragem "Cansei de Ser Nerd", diástoles e sístoles fazem spinning no compasso da Liga da Justiça inteira. Dela e dos demais vigilantes que serviam como fator de cura para a solidão de um CDF gente fina, que, em sua juventude, foi acusado injustamente pelo sumiço e pelo suposto assassinato de uma colega.

Apesar de seu jeitão Charlie Brown de ser, ele chegou a ser preso por um crime que Lex Luthor algum seria capaz de ensiná-lo a cometer. Mas, no enredo filmado por um dos mais respeitados diretores de arte do cinema brasileiro - Gualter Pupo, estreante como realizador de longas -, o tempo, essa máquina de fazer monstros, pode transformar alguém que um dia teve esqueleto de Adamantium (ainda que só em sua imaginação) num mané como outro qualquer.

Essa é a intenção de Aírton: perder os superpoderes do sonhar e enfiar o pé na jaca da mesmice, a nua e crua realidade de quem confunde o Príncipe Namor com o Aquaman. Esse parece ser o seu destino na trama que está sendo filmada em Santa Teresa, tendo o Shazam da luz, Gustavo Hadba, como seu diretor de fotografia.

Produtora delegada de um filme que une as todo-poderosas Hungry Man e A Fábrica, Fernanda Kalume levou o Correio da Manhã no Castelo de Grayskull de Gualter, no pico da rodagem. Lá, o diretor conduzia o que parecia ser a Porta dos Desesperados do Sérgio Mallandro em versão Zé do Caixão. Ou seja: festa estranha, com gente esquisita, mais desmorta do que viva, numa sequência com cara de clímax que - olhada de fora - traduz um primor de engenharia visual.

"Eu me dei conta de que estava fazendo meu primeiro longa como diretor aos 55 anos, falando do que me alimentou a cabeça desde criança: gibi, seriados de televisão, filme pop... Sei que é arriscado misturar gêneros no Brasil, combinando humor, terror, suspense, sci-fi. Mas sinto que sou capaz de transformar esse mundo fantástico em algo lúdico na metáfora do adolescente que vira adulto evoluindo com isso, no meio de uma alegoria", transbordava Gualter, na alegria do iniciante que é senhor em muitos saberes (nas artes plásticas, na instalação), fazendo de sua locação uma maletinha do Gato Félix, de onde tudo pode sair.

"Você olha pra essa casa, adereçada, e vê 'Um Convidado Bem Trapalhão' (clássico de Blake Edwards, com Peter Sellers). Mas isso aqui vai virar um cubo, com eclipse, seita, alienígena...".