Por: Affonso Nunes

O maior craque do Engenhão

Apesar da fama, Zeca mantém o jeito simples e odeia badalações | Foto: Vitor Faria/Divulgação

No último dia 12 de agosto Zeca Pagodinho entrou no gramado do Estádio Nilton Santos, o Engenhão, para cantar com a torcida do Botafogo uma das músicas que fazem sucesso na arquibancada. Isso aconteceu minutos antes da partida de seu clube de coração contra o Internacional (RS) na comemoração dos 119 anos do clube. Mas neste domingo, o alvinegro mais famoso de Xerém (e do Brasil!) volta ao estádio para comemorar seus 65 anos de vida e 40 de sucesso absoluto relembrando seus maiores sucessos

O show de Zeca marca a abertura da turnê nacional dos 40 anos de estrada e terá a participação de artistas de peso como Alcione, Seu Jorge, Jorge Aragão, Xande de Pilares, Iza, Diogo Nogueira, Djonga e Marcelo D2, entre outras surpresas. Eles se unirão ao sambista no palco, ampliando a celebração para além das fronteiras do samba.

A abertura do evento ficará por uma grande roda de samba comandada por Pretinho da Serrinha. E esse show que promete ser histórico será registrado para ser lançado em formato de DVD. Depois do Engenhão, a turnê enacara a estrada com shows em São Paulo (21 e 22/6), Florianópolis (13/7), Campinas (27/7), Curitiba (24/8), Porto Alegre (31/8), Brasília (14/9), Salvador (5/10), Recife (19/10), Natal (25/10), Belo Horizonte (23/11) e de 6 a 9 de dezembro no Navio Zeca Pagodinho - 40 Anos.

Zeca é, de forma incontestável, sinônimo de sucesso, o maior nome do samba na atualidade. Mas a fama não foi algo que ele perseguiu. Antes de ser trazido por Beth Carvalho para o centro dos holofotes, Zeca queria ser apenas compositor. Desprezava - e despreza até hoje - a cultura de celebridade, sejam as selfies ou os pedidos de autógrafo, que o impede de ter uma vida simples, algo que só consegue quando está na sua Xerém.

Com 14 ou 15 anos, Zeca diz, ele já escrevia. Nessa época, fez um poema no estilo acróstico com o nome da filha de uma vizinha, Alessandra, quando ela nasceu. Ouvia seresta e jovem guarda com a família, e era chamado de velho por gostar de sambas antigos de Elizeth Cardoso.

Queria estudar instrumentos, mas desde a adolescência não pôde porque tinha que trabalhar - motivo pelo qual criou o Instituto Zeca Pagodinho, em que oferece aulas de música. Entrou de vez nesse universo quando conheceu Arlindo Cruz e passou a frequentar rodas de samba, em especial a do Cacique de Ramos.

Antes do Cacique, diz Zeca, o samba da velha guarda era "reto". "Lá, [os instrumentistas] tocavam baixinho, para se ouvir quem estava cantando. Tinha muita gente, mas todo mundo tocava com disciplina e suavidade. Hoje em dia ficou tudo muito rápido, acelerado, não dá nem para ouvir a letra", atesta o bamba.

SERVIÇO

ZECA PAGODINHO - 40 ANOS

Engenhão - Estádio Nilton Santos (Rua José dos Reis, 425 - Engenho de Dentro)

4/2, a partir das 15h com roda de samba | Ingressos a partir de R$ 50 taxas no site https://zecapagodinho40anos.com.br

 

Memórias de quem foi Zeca Pagodinho por uma temporada

Gustavo Gasparani conta que precisou cortar e pintar os cabelos, se bronzear e engordar um pouco para viver Zeca Pagodinho nos palcos | Foto: Divulgação

Era uma vez dois meninos. Um, nascido e criado na Zona Sul, que se descobre totalmente apaixonado por samba. O outro, nascido e criado no coração da Leopoldina, vê o samba participar desde sempre de sua vida. É do enorme talento desses dois personagens que nasce "Zeca Pagodinho, o Musical", escrito, dirigido e interpretado por Gustavo Gasparani.

É a história da peça que une esse dois artistas, que resolvemos lembrar hoje como parte das comemorações dos 65 anos de Zeca Pagodinho e de seus 40 anos de carreira.

É Gustavo Gasparani, o autor, diretor e intérprete de Zeca adulto no palco, que nos conta como foi esse encontro com o maior cantor popular do Brasil.

"A minha voz é muito mais grave que a do Zeca, eu nunca quis imitar a voz. Eu imitava a divisão, o jeito de cantar, e realmente o jeito físico dele. Quando fui na casa dele, pela primeira vez, fui com a minha cara, o cabelo que eu estava usando na época, cabelo encaracolado, grisalho em certos lugares. O filho dele ficava me olhando e pensando 'como você vai virar Zeca Pagodinho?'. Cortei o cabelo, pintei, peguei mais sol, me deixei engordar um pouco mais. Aí, encontrei o filho dele, o Lui.

'Pô, você tá muito parecido com o meu pai'. Um dia o Zeca chegou para mim e disse: 'Cheguei lá no escritório e falei: eu tô bonito nas fotos. Era você, Gasparani'", conta o ator, diretor e dramaturgo.

"Ele é muito engraçado. A minha brincadeira era pegar a irreverência do Zeca e trazer para mim. Apesar de sermos diferentes, inclusive em estilo de vida. Eu sou todo natureba, todo regradinho em se tratando de comida. Tive que destrambelhar, perder a rédea, me soltar. Tive que deixar a vida levar", explica.

"Fazer o Zeca", prossegue Gasparani, "era estar junto com Zeca, conhecer ele um pouco mais. Enfim, ele é uma figurinha. Acho ele um ser humano incrível realmente. A preocupação com outro, saber da sua força, de onde ele chegou, de onde ele veio, nunca renegar sua origem. Colocou a cultura suburbana no mapa do Brasil. Então foi isso que eu quis fazer. Depois o nome ficou o nome que eles queriam, mas o que eu queria, que eu escrevi na época, era a saga de um Zeca Pagodinho".

Gasparani acredita que, ao se deparar com Zeca, escreveu a saga de "um herói suburbano". "Porque o Zeca é esse homem do povo que venceu e que jamais largou as suas origens e é um herói para o Brasil todo, todo mundo gosta do Zeca. Ele é muito genuíno em tudo o que ele faz, divide bem pra caramba, ótimo compositor, enfim, é um artista incrível e foi muito bacana eu viver esse personagem", comenta.

Gasparani revela que na época em que encenava o espetáculo "Opereta Carioca" já era perseguido pela ideia de criar algo sobre o sambista. "Tive a ideia de estudar a obra do Zeca, de quem eu já gostava. Eu fazia dois números dele, com muito sucesso na peça. Quando acabei de estudar tudo, li no jornal que a Vitória Dannemann tinha comprado os direitos. Desisti", recorda.

Passado, uns três anos aproximadamente, a própria Vitória procura Gasparani para escrever a peça e outra pessoa para assinar a direção do espetáculo. "Passaram-se dois ou três anos e nada aconteceu. Sandro Chaim, o produtor, me ligou um dia e falou vamos fazer um trabalho sobre o Zeca Pagodinho. Disse que já existia esse projeto, que eu já havia escrito e o texto e que a produtora era a Vitória Danneman. Apresentei os dois e produziu-se, então, o musical", conta.

De acordo com Gasparani, sugeriu que ele fizesse o Zeca adulto porque estava muito difícil de encontrar o ator, mesmo tendo testado muita gente. "Tínhamos encontrado um ator maravilhoso que é o Peter Brandão para fazer a parte jovem, o primeiro ato. Então Peter fazia o primeiro ato e depois eu faria o segundo ato. Foi uma temporada ótima. Uma pena que não ficou mais tempo. Eu queria ter feito teatros bem populares. Por questões de logística e falta de patrocínio não conseguimos. Duas vezes fizemos sessões de contrapartida. Na primeira música, o teatro inteiro já batia palmas. Uma sensacional. Era o espetáculo encontrando seu público", empolga-se.

As contribuições de Zeca e Gustavo vão além de entreter o público. Mostrar as raízes do melhor de nossa cultura, ir aonde o povo está. Deixarem a vida nos levar à alegria e à felicidade que só os grandes artistas são capazes de fazer.

 

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