Visto por 3 milhões de pagantes no Brasil, depois de faturar US$ 957 milhões nas bilheterias internacionais, "Oppenheimer" já está no streaming, na Apple TV. Pode ser acessado por uma merreca na Amazon Prime Video Store, na Google Play e na YouTube Filmes. Agora, de volta às salas de projeção, pode bater a barreira do bilhão. Foi a terceira maior arrecadação mundial de lavra hollywoodiana em 2023, atrás apenas de "Barbie" (a primeirona da fila, com US$ 1.441.717.724,00 de lucro) e de "Super Mario Bros. Movie" (US$ 1,3 bilhão de receita).
Estima-se que, neste domingo, na cerimônia da Academia, Robert Downey Jr. seja oscarizado como melhor ator coadjuvante. Eternizado no imaginário pop como Tony Stark, o Homem de Ferro, no momento de exorcismo do fantasma da dependência química, Downey Jr. é o hidrogênio que areja a atmosfera plúmbea de um filme construído para "ser pra sempre".
Uma postagem na internet do cineasta Paul Schrader, diretor de "Fé Corrompida" (2017) "A Marca da Pantera" (1982) e roteirista de "Taxi Driver" (1976), resume tudo o que o Nolan conseguiu sintetizar ao longo de três horas de pura excelência. Schrader disse: "É o melhor, o mais importante filme deste século".
O superlativo impressiona e até espanta, não só por soar prematura, mas por ter sido emitido por um criador sábio, extremamente avesso a (quase) tudo o que a indústria hollywoodiana produz.
O que justifica sua fala seja justamente o fato de Nolan não ser aquilo que os estúdios cismam em produzir e, sim, um diretor autor que dirige narrativas personalíssimas, de teor filosófico, em forma de espetáculo, como é o caso do estonteante "Oppenheimer". Basta dois diálogos para que toda sua força dramatúrgica fique evidente: a) "Genialidade não garante sabedoria"; b) "Vocês procuram o sol, só que o Poder reside nas sombras". Essa joia aí ao lado é dita pelo almirante Lewis Strauss, intelectual autodidata que busca exterminar a reputação do físico J. Robert Oppenheimer depois de sugar dele aquilo de que a América necessitava em meio à II Guerra: a criação de uma arma nuclear suprema.
O jogo de sedução mefistofélico, mais tarde convertido em caça às bruxas, empreendido por Lewis pode dar a Downey Jr. o Oscar que há décadas ele merece. O filme é quaaaase dele, mas em seu caminho há uma pedra (preciosa) que se chama Cillian Murphy, mas evoca Burt Lancaster... e bem aquele Burt Lancaster de "O Leopardo" (1963). É Cillian quem encarna o gênio científico por trás da bomba mais assustadora de que a Humanidade tem notícia.
Estruturado na aparência como se fosse uma aula de geopolítica sobre a corrida nuclear, o filme carrega toda a assinatura formal e filosófica do realizador despontou aos olhos da crítica com "Amnésia", em 2000 e virou objeto de culto (e também de ódio) com a trilogia "Batman" (2005-2012). Tal assinatura se faz viva: 1) no fascínio em relação a episódios que mudaram a História, como visto em "Dunkirk" (2017); 2) o interesse pela gênese do mal e sua banalidade, como visto em "Insônia" (2002); 3) o encanto pela dimensão humanista da Ciência, o que foi o alimento de seu trabalho mais incensado - e ao mesmo tempo, mais incompreendido - que é "Interestelar" (2014); e 4) o interesse em fazer uma autopsia em corpo vivo das cicatrizes da Guerra Fria, como visto em "Tenet" (2020).
Assombrado por uma implicância rastaquera de parte da crítica de que seus roteiros são por demais explicadinhos (#sqn), Nolan trouxe o sueco Ludwig Göransson para compor a trilha e convocou seu habitual colaborador, o suíço Hoyte Van Hoytema, para assinar a direção de fotografia, alternando um colorido retinto e um preto & branco em tons de chumbo. Com o suporte deles, o diretor (egresso de uma formação em literatura e irmão do escritor Jonathan Nolan) revirou as páginas de "Oppenheimer: O triunfo e a tragédia do Prometeu americano, de Kai Bird e Martin J. Sherwin (traduzido aqui por George Schlesinger), grifando passagens mais próximas da ontologia e do existencialismo que da lógica matemática.
Ressalte, no filme, a presença Tom Conti (o Mr. Lawrence de "Furyo: Em Nome da Honra") como Albert Einstein.