Em meio à comemoração dos 85 anos do Batman
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São indícios de que estamos no ano de 1981, momento histórico no qual o filósofo francês Jean Baudrillard (1929-2007) passa o pop (sobretudo o dos EUA) em revista para entender o que seus colegas Arnold Toynbee e Jean-François Lyotard chamaram de Modernidade Tardia, ou, para os íntimos, pós-modernidade, um animal de plumas, com hidrofobia terminal.
Esse tal de pós-modernidade é a gênese do Coringa que Joaquin Phoenix divinamente constrói... algo bem diferente do retrato do vilão de HQs composto por Jerry Robinson em 1940... e bem distante do retrato camp, afetadíssimo, dele feito pelo ator Cesar Romero no seriado do Homem-Morcego para a TV, nos anos 1960. Ali tínhamos o Moderno... algo calçado por um tratado, um paradigma, um manifesto... no caso, a noção de que o Bem vence o Mal e espanta o temporal. No "Coringa" que comemora cinco anos de seu lançamento não há embasamentos éticos metidos a estéticos.
Há apenas sinais de desaparição, da atomização dos cintos de segurança ideológicos que mantinham as aparências de controle e de harmonia entre as civilizações. Agora, isso acabou, pela mesma lógica de que falava Baudrillard, nos anos 1980: "Deus não vai sumir pela escassez e sim pelo excesso, pela proliferação desmedida, pela reprodutibilidade". A profecia do bruxo filósofo de "A transparência do Mal" deu em "Joker", de Todd Phillips.
Na era Biden, o Deus da caridade, da inclusão, do respeito sumiu pelo uso vão de seu santo nome em programas de TV, de streaming, de terrorismo midiático. Deus aqui deve ser encarado como um sinônimo para "valores" de dignidade, do Humano. Valores que Fleck vai perdendo a cada cena da produção Warner Bros.
Há um lastro de glória (mas também de precipício) no Coringa dele. Dezesseis anos depois de Christopher Nolan ter usado os quadrinhos para produzir a mais sombria alegoria sobre a era Bush e o desamparo moral do século XXI, em "Batman - O Cavaleiro das Trevas" (2008), o Yorick de Gotham City volta a aprontar das suas e nos dá o que pode ser definido como um estandarte do descontrole político, coroado por San Sebastián, que festejou o desempenho de Lady Gaga.
Desde 2022, filmes baseados em HQs andam em baixa, com exceções como o bilionário "Deapool & Wolverine", mas o Coringa pode surrupiar as atenções de seus concorrentes e fazer do filão uma febre de novo.