Passei meu carnaval trancado dentro da G.R.E.S Acadêmicos de Casa. Vi o desfile, a Beija-Flor ganhou, o pessoal chiou e continua um calor do inferno. Inevitável falar de Neguinho, a voz do samba por meio século na avenida, que se despede das avenidas. Jamelão aplaudiria com certeza.
E quando se fala de Beija-Flor, é impossível deixar passar gente como Laíla e Joãozinho Trinta, personagens fundamentais na história da escola de Nilópolis.
Você pensa em um, vem outro e outro, mais outro e pensa: cara, o Rio teve e tem tantos craques, né? Alguns cariocas da gema, outros devidamente importados mas com tamanha integração à terra carioca que, mesmo tendo nascido fora do Brasil, têm a nossa cara. Em alguns casos, vale até alienígena. Há - e houve - quem é famoso nacionalmente, enquanto outros mal passaram da condição de lendas do próprio bairro. Não importa: botaram pra quebrar, mantendo raízes eternas por aqui.
Só do samba e carnaval você pegaria brincando duzentos nomes, imagine do resto? Quantos livros de verbetes não seriam produzidos? Enciclopédias inteiras. Vou deixar alguns por aqui: Clóvis Bornay, Evandro de Castro e Lima, Fernando Pamplona, Arlindo Rodrigues.
Deitado, espiando o Instagram, me deparo com um vídeo mágico de Monsieur Limá, ícone da discotecagem. As conexões são instantâneas: Ademir Lemos e Big Boy. O Rio dos anos 1970, onde o couro comia literalmente. Música é um mar que carrega de Carlos Imperial a Nelson Motta. Dancin' Days. Frenéticas! Fervo!
Velha guarda? Marlene, Emilinha, Cauby. Ítalo Rossi, Sérgio Britto, Tônia Carrero. Cronistas? Paulo Mendes Campos, Fernando Sabino, Rubem Braga, Carlinhos Oliveira. Cabeças pensantes? Oscar Niemeyer, Darcy Ribeiro, Anísio Teixeira.
Multitarefas? Stanislaw Ponte Preta, ou Sérgio Porto para as finalidades formais; Otelo Caçador, João Saldanha, Nelson Rodrigues, Oduvaldo Vianna Filho. Augusto Boal. O teatro, teatro!
Cinema Novo inteiro. A Bossa Nova. Olhar o passado dos grandes sambas e beber da fonte de Cartola, Nelson Cavaquinho, Guilherme de Brito e ainda mais atrás, com Donga, Pixinguinha, Ismael Silva, contando com Noel Rosa de volante?
A gente prestou atenção direito em Glauce Rocha, Myriam Pérsia, Maria do Rosário e Odete Lara? Deveria, pelo menos. E quem já ouviu falar das melhores histórias de Hugo Bidet, Guerreirinho e Roniquito?
Os catedráticos de Copacabana sabem dizer de Mr. Éter, Sr. Bolinha e Ramiro? E o Baiano da Raimundo Corrêa? Um Rio tão rico que de alguma forma até os sofridos homens em situação de rua eram celebridades. Isso sem contar de Lina, que usava vestidos finos e falava idiomas enquanto esmolava na esquina da rua Tenreiro Aranha.
Já tivemos tantos craques da terra que um deles, lógico, não era carioca de nascença e sequer morava no Brasil, mas passou décadas falando do Botafogo, de Tânia Boscoli e de outras pérolas da Guanabara: Mr. Ivan Lessa, enraizado em Londres dos trinta e poucos anos até a morte, mas sempre com o par de binóculos apontado para o Atlântico Sul.
Sim! O nosso time é realmente da pesada.