Por: Cláudia Chaves | Especial para o Correio da Manhã

A arte te pega daqui e pega de lá

CASA COMUM artista Rafael Bqueer | Foto: Takumã Kuikuro /Divulgação

Renato Rocha, desde criança, teve o olhar para a arte popular, para os ambientes diversos, reunindo grupos, ousando e ampliando fronteiras. Sua avó, pernambucana, era bordadeira. Olhava com encantamento avó e mãe no ofício poético de bordar, com as cores, os fios, as misturas.

Criança, ia para a Mangueira, conviveu com a escola de samba. Tornou-se um carnavalesco. Repete a experiência, dirigindo os carros abre-alas de grandes escolas como Grande Rio e Imperatriz Leopoldinense. Coreógrafo dos blocos Céu na Terra e Boi Tolo, faz da pista, da praça e das ruas um palco.

Renato é um metteur-em-scène, a palavra francesa para diretor, e que traduz, literalmente o que ele coloca em cena, trabalhando no campo expandido nas mais diversas interfaces de experiências e pesquisas artísticas. Uma composição de todas as artes, de todos os códigos e linguagem, de diferentes culturas.

As experiências o marcaram, pois jamais foi de um lugar apenas. Trabalhou com o grupo de circo Intrépida Trupe, com a Cia Bufomecânica e com o Grupo de Teatro Nós do Morro, na favela do Vidigal, onde morou por 13 anos, e que o alçou ao cenário internacional, para trabalhar com a Royal Shakespeare Company, em Londres.

Renato é uma referência no mundo no uso das artes como ferramenta de transformação social, engajamento de comunidades em situação de vulnerabilidade e arte como ativismo.

Criou espetáculos para a RSC, The Roundhouse, LiFT Festival, Circolombia, Bienal Internacional de Artes de Marselha, National Theatre of Scotland, Festival Internacional de Leicester, União Européia e Unicef.

Dirigiu projetos na Índia, Berlim, Tanzânia, Quênia, Egito, Paris, Nova Iorque, Edimburgo, Estocolmo, Budapeste, Portugal e Colômbia. Foi diretor artístico da Organização Street Child United (uma rede global de 20 países, no trabalho com jovens em situação de rua) e do Circus Incubator, colaboração entre França, Finlândia, Suécia, Espanha, Canadá e Brasil.

Em 2016, fundou o NAI - Núcleo de Artes Integradas, no Brasil, onde criou "Before Everything Ends" para o Festival Home/ Away em Glasgow, "S'blood", indicado ao Shell-RJ de 2018, na categoria inovação, "Entre Cinzas, Ossos e Elefantes", "Estar fora do mapa também é existir" para a ArtRio, na C.Galeria, "Fragmentos de emaranhados e esquecimentos", para o ArtCore no MAM-RJ e a plataforma internacional.

Assim, criou a Casa Comum, que ocupa o Futuros - Arte e Tecnologia (o antigo Oi Futuro), um projeto que nasce de ter convivido pelo Brasil no Nordeste, Minas e Amazônia. Estão lá as obras e experiências de artistas amazônidas e olhar direcionado a cosmovisão indígena do planeta como uma "casa comum" de todos os seres viventes.

Ao trazer para vários lugares, o projeto-plataforma, desenvolvido desde 2020, que já circulou em grandes festivais em Londres, Pará e Porto, além da COP 26, em Glasgow, Escócia, ganha escala de uma "Major Exhibition", oferecendo ao público múltiplas experiências.

O que está posto, o maior mérito do trabalho, é presenciarmos com o colonialismo ameaça mais do que as árvores. É percorrer os saberes de uma cultura intimamente ligada à natureza e profundamente consciente do impacto da atividade humana sobre ela. É lindo ver a cobra de palha, pendurada e ligando andares, as máscaras, o documentário que nos descortina novos mundos.

Renato tem uma filha, Julieta. Para ela e por causa dela, mergulha em um novo projeto: uma instalação pessoal, itinerante, um figurino de uma Cuca, nossa lendária figura ameaçadora, uma jacaroa que invoca os espíritos e traz a presença do feminino, a lembrança da avó como , na verdade, aquela que protege a floresta. A Cuca de Renato está vindo nos pegar com a sua mensagem para mostrar que a arte, a presença do popular nos leva à reflexão e ao prazer da fruição.

 

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