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Episódios reais dignos de trama de novela

Por Danielle Madureira (Folhapress)

Vaidade, intrigas, vícios, traição e até mortes suspeitas. Pode parecer enredo de novela, mas essa é a realidade de boa parte das empresas familiares, seja no Brasil, seja no exterior.

Um exemplo foi o escândalo envolvendo Liliane Bettencourt, a mulher mais rica da França e herdeira do império de cosméticos L'Oréal, morta em 2017, e sua única filha, Françoise Bettencourt-Meyers, que declarou na Justiça que a mãe era "mentalmente incapaz" por dar presentes bilionários a um fotógrafo de celebridades.

No Brasil, os primos da terceira geração da família Schincariol entraram em litígio depois que dois irmãos - Adriano e Alexandre, filhos de José Nelson - venderam o controle da cervejaria para a japonesa Kirin, sem entrar em acordo com os acionistas José Augusto, Daniela e Gilberto Júnior. Estes últimos, filhos de Gilberto Schincariol, sustentavam que José Nelson enganou o irmão para se tornar majoritário na companhia. A empresa hoje pertence à holandesa Heineken.

A varejista paulista Magazine Luiza, com sede em Franca, cidade de 359 mil habitantes, a 400 quilômetros de São Paulo, não viveu esse nível de mazelas, mas guarda alguns segredos de alcova, como mostra o recém-lançado livro do jornalista Pedro Bial, "Luiza Helena - Mulher do Brasil" (ed. Gente). A obra narra a história de Luiza Helena Trajano Inácio Rodrigues, 73, atual presidente do conselho da varejista, que se tornou uma das maiores empresas do setor no país, com quase 1.500 lojas, 40 mil funcionários e mais de R$ 55 bilhões de faturamento anual.

Bial situa o leitor na genealogia da família Trajano, que teve origem com Manoel e Inês, pais de oito filhos - quatro meninas e quatro meninos. Entre as meninas, Luiza, a única dos oito filhos que não deixou descendência, criou em 1957 o Magazine Luiza. Vendedora talentosa, tomou para si a sobrinha, Luiza Helena, filha única da irmã Jacira, como discípula e herdeira natural das melhores técnicas de como agradar ao cliente.

Pelas lentes de Bial, o leitor entra na casa dos Trajanos como uma visita de cortesia - na qual as conversas são amenas, ainda que histórias mais íntimas sejam reveladas "en passant". É assim que o leitor descobre que Luiza Helena se separou do marido, Erasmo, nos anos 1980 e viveu um novo amor, para retomar o casamento seis anos depois.

Luiza Helena teve medo de que houvesse um embate na terceira geração pelo comando da companhia: Fabrício Garcia, filho do primo da empresária, Wagner, herdou as ações do pai, quando este morreu. Luiza Helena e Wagner tinham a mesma quantidade de ações na varejista, e Fabrício poderia reivindicar se tornar presidente. Mas, para alívio da matriarca, ele concordou em deixar o comando com o primo Fred e se tornou vice de operações do Magalu.

A própria Luiza Helena já tinha enfrentado, em 1991, quando assumiu o controle do Magazine Luiza, um embate familiar. O fundador, Pelegrino José Donato, marido da tia Luiza e conselheiro da empresa, não aceitava a sobrinha no comando, por machismo. Ia contra a maior parte das suas ideias de políticas de benefícios para os funcionários, como bolsas de estudo, crédito facilitado e auxílio-creche. Ele morreu em 2018, aos 94.

Mas Luiza Trajano Rodrigues está viva, com 95 anos, e sofre de demência. A sobrinha Luiza Helena dá apoio à outrora incrível vendedora, que deu o empurrão para que ela criasse um império. Mas hoje a fundadora parece alheia a tudo e ainda pensa ter 43 anos. As histórias da tia Luiza, porém, verdadeira mestra do varejo, são alguns dos pontos altos do livro.

É difícil para o leitor enxergá-la como um ser humano falível: ela é retratada como a empresária talentosa, ágil, intuitiva, generosa e preocupada com o próximo.

Bial afirmou que a ideia de escrever a biografia surgiu depois de uma entrevista feita em 2020, para o talk show Conversa com Bial, da Globo. "Ela sempre se mostrou muito refratária em fazer alguma coisa sobre a vida dela. Mas apresentamos uma proposta bastante humana, conforme ela gosta de encaminhar as coisas, ela se sentiu atraída e topou fazer."

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