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Deu Brasil no Leopardo

Por Rodrigo Fonseca

Especial para o Correio da Manhã

Edeu Brasil na cabeça no 75º Festival de Locarno, com o Leopardo de Ouro dado a "Regra 34", de Julia Murat, e o prêmio de melhor curta de autor para "Big Bang", de Carlos Segundo. A potente seleção deste ano confirmou, uma vez mais, o projeto estético iniciado pelo crítico Giona A. Nazzaro em 2021, quando assumiu a curadoria do evento suíço, considerado um dos maiores fóruns de debates sobre o futuro do audiovisual e popularizado por sua competição oficial. Conheça a seguir as produções que mais e melhor celebrizaram a seleção de Nazzaro, candidatando-se à eternidade.

TENGO SUEÑOS ELÉCTRICOS, de Valentina Maurel

Eis "O" filme de Locarno, com CEP na Costa Rica, e concentrado na reestruturação afetiva de uma família, após uma separação, com foco no processo de amadurecimento de uma adolescente criada num ambiente artístico. Eva (Daniela Marín Navarro) e seu gato são amigos inseparáveis que passam por problemas depois que a mãe decide expulsar o felino de seu lar. A saída para menina é viver com o pai: um tradutor e aspirante a poeta (Reinaldo Amien Gutiérrez) que não parece muito disposto a crescer, mas ama a filha sobre todas as coisas. A fotografia de Nicolás Wong Diaz é um assombro.

NOSSA SENHORA DA LOJA DO CHINÊS, de Ery Claver

Potente entrada de Angola na cena dos grandes festivais. Uma crônica de costumes, a partir de uma montagem nervosa realismo mágico. A chegada de uma estátua da Mãe de Jesus a um 1,99 de Luanda deflagra uma mudança em uma série de pessoas acossadas pelo desamparo. Animado pela visão da padroeira, um rapaz vai fazer uma vingança, uma mãe vai buscar as pazes com seu luto e um culto nada sagrado há de surgir.

PARADISE HIGHWAY, de Anna Gutto

Juliette Binoche transcende mesmo as mais estilizadas personagens de sua carreira, ao encarnar uma caminhoneira calejada pela dor. A estrela deixa seu francês parisiense de berço de lado, e atua em Inglês, vivendo Sally, motorista que aceita conduzir cargas ilegais para ajudar seu irmão, o presidiário Dennis (Frank Grillo, em impecável atuação). Uma dessas cargas é uma menina, Leila (Hala Finley), que será negociada num esquema de tráfico sexual. Morgan Freeman integra o elenco, vivendo um consultor do FBI.

REGRA 34, de Julia Murat

O concorrente brasileiro de longas ganhou o Leopardo de Ouro de Locarno com sua direção de arte detalhista e sua abordagem política do sexo. Sua protagonista, Sol Miranda, arrebatou elogios com atuação fina. Sol vive uma estudante de Direito que embarca em práticas sexuais BDSM (prazer com dor) e encontra na asfixia uma curiosidade que fascina e põe em xeque suas novas formas de curtir sua libido. Numa sequência de diálogo primorosa, o ator Rodrigo Bolzan faz um monólogo devastador sobre Direito Criminal.

BOWLING SATURN, de Patricia Mazuy

Um toque de adrenalina essencial a todo festival que se propõe a ser plural. Elogiada pela revista "Cahiers du Cinéma" pela força imagética de sua imersão nos códigos das narrativas policiais, Patricia Mazuy refina seu estilo, consagrado com "Paul Sanchez Está De Volta" (2018), num thriller de tons existencialistas, sobre a fraternidade. Sem medo da violência, a cineasta faz um ensaio sobre a fraternidade ao narrar o conflito entre um ambicioso oficial da polícia francesa, Guillaume (Arieh Worthalter), e seu irmão picareta, Armand (Achille Reggiani). Os problemas entre eles começam quando o pai morre e deixa como herança um clube de boliche. Guillaume crê que deixar o negócio nas mãos de Armand pode salvar o sujeito do ócio e do erro. Mas… Os enquadramentos da cineasta são enervantes.

PIAFFE, de Ann Oren

Um clima de mistério digno do cinema de Apichatpong Weerasethakul se faz sentir nesta crônica urbana, nas raias do extra-ordinário, a tendência do momento na fantasia, na qual fatos inusitados ocorrem, sem explicação. Neste caso, tudo envolve uma relação entre irmãs. Abalada pela crise nervosa de sua mana, Eva assume um trabalho como captadora de som na filmagem de um comercial. Mas seu corpo vai entrar em mutação. E é uma mutação que faz seus sentimentos desabrocharem.

LAST DANCE, de Delphine Lehericey

Aos 70 anos, François Berléand presenteou Locarno com sua mais tocante interpretação nesta produção suíça que retrata a dança contemporânea de um modo raras vezes visto no cinema. Berléand é um aposentado septuagenário que aprende a dançar para honrar a memória de sua finada mulher.

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