Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

A micareta da Unifrance

De arma em punho no longa de Woody Allen, 'Golpe de Sorte', Melvil Poupaud ganha prêmio honorário nesta quinta no Rendez-vous da Unifrance | Foto: Divulgação

 

Astro de múltiplos filmes de François Ozon e Mathieu Amalric, protagonista do novo e ainda inédito Woody Allen ("Golpe de Sorte"), Melvil Poupaud será homenageado esta noite em Paris, com um prêmio pelo conjunto de sua carreira, que atrai holofotes para uma das mais sólidas ações de marketing da indústria audiovisual francesa.

Entra em fricção de hoje até segunda a edição de número 26 do fórum Rendez-vous Avec Le Cinéma Français, que teve uma inauguração formal na terça, para exibidores, com a projeção de "Le Tableau Volé", de Pascal Bonitzer, e passa a mobilizar jornalistas do mundo inteiro a partir desta quinta. Instalações de luxo do Hôtel du Collectionneur se transformam num estúdio vivo nesse evento, que promete mobilizar 130 artistas (da produção, de elenco, de animação, de documentários). Quem faz essa festa acontecer é a Unifrance, instituição ligada ao Ministério da Cultura da pátria (hoje) presidida por Emmanuel Macron, cujo foco é apoiar a circulação dos filmes (e das séries, vide "Lupin") feitas por lá. Nesta sexta, o Rendez-vous liberta um de seus mais potentes tentáculos: o MyFrenchFilmFestival. Trata-se de uma mostra online, que pode ser vista no mundo todo, via web, com 11 longas e 15 curtas.

Esses filmes são submetidos a dois júris, um de profissionais do mercado cinematográfico (a diretora brasileira Lillah Halla, consagrada por "Levante", é parte dele) e um de repórteres e integrantes de associações da crítica (onde o Brasil tem como representante Leticia Alassë). Produções como "Fairplay", de Zoel Aeschbacher; (o ótimo) "The Summer Holidays", de Valentine Cadic; "Fast", de Paul Rigoux; e "The Green Perfume", de Nicolas Pariser, podem ser vistos no https://www.myfrenchfilmfestival.com/.

Há muito que se comemorar na Unifrance, uma vez que a receita dos longas lançados pela França de janeiro a dezembro de 2023 superou a ressaca provocada pela pandemia, que secou as salas de exibição, esvaziando-as sob o assombro da covid-19. Acostumados a ver filmes venderem 10 milhões de ingressos ou até mais - "Intocáveis", que revelou Omar Sy, foi visto em circuito por 19,5 milhões de espectadores -, as salas de projeção parisienses (assim como as de Nice, Marselha, Toulouse e arredores) amargaram dias difíceis com efeito do coronavírus, sofrendo retração de plateias e encarando uma pesada concorrência com as plataformas de streaming. O maior sucesso que aquele mercado emplacou em 2022 foi "Qu'Est-ce Qu'On a Tous Fait Au Bon Dieu?", que vendeu 2.429.450 tíquetes. É a terceira parte da franquia de humor "Que Mal Eu Fiz A Deus", iniciada em 2014. É um número expressivo pra vida pós pandemia, mas comparado à receita dos outros dois longas da cinessérie - o primeiro foi visto por 12,3 mil pagantes e o segundo, de 2019, por 6,6 mil pessoas.

Já no ano passado, as cifras foram bem mais alta, a começar pelo fato de "Astérix & Obélix: O Reino do Meio" (lançado aqui via Netflix) ter vendido 4,5 milhões de tíquetes de fevereiro a maio. Nas aventuras animadas produzidas em estúdios da França, 2023 também foi de gáudio, com cerca de 1,6 milhão de espectadores no currículo do thriller infantojuvenil "Miraculous: As Aventuras de Ladybug: O Filme". Também impressionou a receita de "Nina: A Heroína dos Sete Mares", lançado aqui em novembro: 863 mil pagantes.

Vale citar a força que teve "Jeanne DuBarry", melodrama de época que marcou o regresso de Johnny Depp às telas (após a árdua batalha judicial contra sua ex- a atriz Amber Heard), sob a direção de Maïwenn. Vendeu 764 mil bilhetes em territórios francófonos logo depois de ter sido exibido na abertura do Festival de Cannes.

Nos festivais classe AA do mundo, a França deitou e rolou também. Já em fevereiro passado, ela papou o Urso de Ouro da Berlinale com "No Adamant", de Nicolas Philibert, visto por 125 mil franceses. Em maio, ganhou a Palma de Ouro de Cannes com "Anatomia de uma Queda", que rendeu o Globo de Ouro de Melhor Filme de Língua Não Inglesa e o de Melhor Roteiro para a diretora Justine Triet. Esse estudo sobre sexismo em forma de drama judicial (de roer as unhas) estreia por aqui no dia 25, mas, antes, no dia 23, deve ser citado entre os indicados ao Oscar, quiçá o de Melhor Atriz, coroando a alemã Sandra Hüller. Ela interpreta uma escritora que é acusada da morte do marido, vítima de um (aparente) tombo do telhado.

Todas essas conquistas serão celebradas pela França no Rendez-vous, que promove ainda o que pode (e deve) vir a barulho nas principais maratonas de exibição do planisfério cinéfilo. Uma das apostas é "Dans Le Viseur", de André Téchiné. Nesse suspense, a onipresente diva Isabelle Huppert empresta seu talento ao mestre europeu na saga de uma policial que se afeiçoa por seus novos vizinhos até entrar em dilema ao descobrir que um deles tem um passado de crimes.

 

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