Golaço da cultura latino-americana em nossas terras, a exposição sobre o legado do seriado humorístico "Chaves", no MIS Experience, em São Paulo, diariamente lotada, dedica um trecho substancial (e comovente) de seu acervo à dublagem nacional do programa de Roberto Gómez Bolaños (1929-2014), o Chavinho em pessoa. Feita pela cooperativa Maga, de Marcelo Gastaldi (1944-1995), para a TVS (hoje SBT), no início dos anos 1980, a "versão brasileira" do programa reuniu talentos da arte de interpretar apenas com a voz. Por lá passaram Carlos Seidl (o Seu Madruga); Marta Volpiani (Dona Florinda); Helena Samara (D. Clotilde, a Bruxa do 71); Sandra Mara Azevedo (Chiquinha, depois confiada à atriz Cecília Lemes); Nelson Machado (Quico); Potiguara Lopes (Professor Girafales, depois encampado por Osmiro Campos); e Mário Villela (Seu Barriga e Nhonho). O próprio Gastaldi interpretava Chaves em português, adaptando do espanhol mexicano bordões como "Isso! Isso! Isso!" e "Ninguém tem paciência comigo". Quando o MIS resgata talentos como o dele e sua equipe, com fotos e arquivos de som, o que o museu promove é um tributo a um tempo no qual a invenção artística não recorria a softwares como os ChatGPTs da vida, que hoje são usados com desculpa de economia. De tempo, de custos com pessoal.
Mas o capitalismo não contava com a astúcia da classe de dubladoras e dubladores do Brasil, que está reagindo, com voracidade, nas redes sociais, ao sua "androidificação", numa troca de gente de carne e osso por "elencos" virtuais. O público está aderindo bem à causa, com razão.
Talentos GG do setor como Miriam Ficher (que dubla Nicole Kidman); Nizo Neto (intérprete de Daniel LaRusso, em "Cobra Kai"); Priscila Amorim (sempre ouvida nas versões nacionais de Jessica Chastain); Raul Labancca (o Eddie de "Game of Thrones") e o imparável (que bom, aliás!) Márcio Simões (o Gênio de "Aladdin") soltaram o verbo no Instagram no fim de semana. Essa trupe usa o pleito "Eu quero a dublagem viva".
Na internet, o #dublagemviva pode conduzir internautas à campanha. Wendel Bezerra, genial dublador do Bob Esponja, postou um vídeo em sua conta do Instagram fazendo um precioso resumo do caso. Trocar artistas por construtos digitais é desumanizar uma prática artística, além de ser um convite ao desemprego.