O bonde da adrenalina

Responsável pelo primeiro blockbuster do ano - 'Beekeeper', com Jason Statham -, o cinema de ação se renova despertando afetos nos grandes festivais da Europa

Por Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

Sylvester Stallone está de volta em 'Armored'

Primeiro lugar nas bilheterias americanas no fim de semana passado, ainda na dianteira na venda de ingressas em vários outros países, "Argylle: O Superespião" é um filme ação, um dos mais frenéticos, que carrega a marca estética de seu realizador, o inglês Matthew Vaugh (de "Kick-Ass" e "Kingsman"). Paralelamente, no mesmo ranking, encontra-se a primeira produção lançada em 2024 a bater a marca de US$ 100 milhões: "Beekeeper - Rede de Vingança", com Jason Statham. Seu gênero: filme de ação. Filme de ação autoral, com a marca de David Ayer ("Sabotagem" e "Esquadrão Suicida").

Num outro terreno, o dos festivais, aliás, um festival famoso por seu apreço por narrativas experimentais - Roterdã -, os thrillers cheios de tiro e pancadaria fizeram a festa retratando conflitos bélicos. Dois representantes do filão explodiram no evento holandês, que encerrou sua edição no domingo: o norueguês "Konvoi", de Henrik Martin Dahlsbakken, e o cazaque "Steppenwolf", de Adilkhan Yerzhanov.

O primeiro se passa na II Guerra Mundial. Nele, Dahlsbakken retrocede no tempo e no espaço até 1942, quando a Alemanha invade a União Soviética. Naquele momento, os Aliados ficaram com a responsabilidade de enviar armas para ajudar na luta. Uma esquadra é enviada para combate, mas não está equipada para a batalha. Desse enredo nasce um candidato a cult. Essa mesma candidatura se estende a "Steppenwolf", thriller padrão "John Wick", com CEP no Cazaquistão, que ressalta a evolução do diretor de "A Doce Indiferença do Mundo" (2018), num desafio às leis da gravidade. O longa assume um criminoso que se faz passar por policial (papel do genial Berik Aitzhanov) que, em meio a uma guerra civil, ajuda uma mulher incapaz de falar (Anna Starchenko) a encontrar seu filho. A angústia dela é salvar o menino de traficantes de órgãos. Já ele só quer se aproveitar da situação para lucrar. Pelo menos até a consciência social derrubá-lo, numa rasteira ética. As sequências de tiroteio e luta são de mesmerizar olhos.

Ao anunciar os títulos que compõe sua programação de premières, fora da disputa pelo Urso de Ouro de 2024, a 74ª Berlinale (de 15 a 25 deste mês) incluiu um show de bordoadas: "The Roundup: Punishment", trama de investigação e tapas na cara, dirigida por Heo Myeong Haeng, é uma sequência de um sucesso mundial de bilheteria, gestado na Coreia do Sul, chamado "Força Bruta", lançado aqui em 2022. Ma Dong-seok, ou Don Lee, é seu protagonista: uma espécie de Dirty Harry da Ásia. Embora o Festival de Berlim tenha exibido ensaios sobre a violência em anos recentes, é curioso ver o mais politizado dos eventos cinematográficos do Velho Mundo flertar com o cinemão de gênero pela mais patrulhada das vias: os thrillers de pancadaria.

Noutras latitudes, um filme finlandês recheado de adrenalina, "Sisu", de Jalmari Helander, no qual um garimpeiro encara nazistas a picaretadas, roda festivais mundo afora e encontrar lar, entre nós, na HBO Max. Não bastasse isso, a França promete solavanco nas poltronas com "Le Salaire De La Peur", remake de "O Salário do Medo" (1953), que vai estrear sob a direção de Julien Leclercq.

Este ano, o gênero ação ainda vai ganhar sobrevida com "Ballerina", estrelado por Ana de Armas no papel de uma assassina. É um derivado de "John Wick". Tem novidades do eterno Rambo, Sylvester Stallone, também. Ele regressa às telas com "Armored", de Justin Rout, no papel de um segurança de transporte de valores que tem o caminhão perseguido por criminosos. Outro veterano que não larga o osso é Liam Neeson. Ele e o diretor norueguês Hans Petter Moland trabalham juntos uma vez mais em "Thug", thriller sobre um chefão do crime septuagenário que dá uma de Rei Lear e decide unir seus filhos, que, há tempos voaram de seu ninho. O problema é que o submundo não quer ver seu líder amolecer em seus afetos e vai desafiá-lo.

Parceiro do astro de "Rocky Balboa" na franquia "Os Mercenários", Statham deve voltar às telonas ainda este ano, em parceria com o próprio David Ayer, em "Levon's Trade". No Brasil, a acolhida aos dois, com a carreira comercial de "Beekeeper", é forte. Statham vive o Apicultor, um agente que se apresenta sob a alcunha de Adam Clay. Nos minutos iniciais do longa, uma amiga dele, uma administradora de um fundo de assistência já idosa é roubada por meio de um golpe digital armada por uma organização que limpa as contas bancárias de pessoas na terceira idade usando um vírus digital e hackeando sistemas. Mas para azar desse bando remotamente liderado por um ricaço problemático Derek Danforth (Josh Hutcherson), Apicultor vai reagir. O termo se refere a um ramo secreto do Serviço de Inteligência dos EUA que nem a CIA pode acessar. Os Apicultores são treinados para desafiar as regras da Física, da Biologia... Num dado momento, Statham pergunta: "Você quer seguir a Lei ou você quer a Justiça". Ao longo de 1h45, numa edição impecável, generosa com as sequências de diálogo e espartana nas sequências de pancadaria, o público verá um estudo sobre o justiçamento, numa fronteira perigosa entre a inadimplência do Estado e a barbárie do indivíduo.