Fantasmas senegaleses
Longa 'Demba' arrebata fãs com a suavidade com que o realizador Mamadou Dia mescla afetos familiares com sombras políticas de chagas coloniais
Nações africanas nunca tiveram tanto destaque na Berlinale, em anos recentes, como se vê na edição nº 74 do evento, tanto na competição (via Benin com "Dahomey" e via Mauritânia, com "Black Tea"), quanto em mostras paralelas como o Fórum, onde Moçambique reina sobreano com "As Noites Ainda Cheiram A Pólvora".
Na seção Encontros, disputa de prêmios inaugurada pelo festival em 2020, um longa senegalês chamado "Demba" arrebata fãs com a suavidade com que o cineasta Mamadou Dia mescla afetos familiares com sombras políticas de chagas coloniais. Na trama, com elementos fantasmagóricos, Demba (Bem Mahmoud Mbow) está às vias de se aposentar e busca mudar sua rotina, a fim de cicatrizar a dor da morte da mulher com que viveu por anos a fio. Mas a necessidade de reinventar sua relação com seu filho vai trazer fantasmas á tona.
"Hollywoo atraiu a atenção do mundo para a África, com "Pantera Negra", mas o faz e o faz só falando de reis e rainha, deixando de lado os aspectos da vida cotidiana, como o enfretamento do luto", disse Dia ao Correio da Manhã, em Berlim.
Um dos principais adversários de Dia, na Encontros, é o longa brasileiro "Cidade; Campo", de Juliana Rojas, que arranca inspiradas atuações de Bruna Linzmeyer, Mirella Façanha e Fernanda Vianna numa trama bifurcada sobre mulheres em trânsito. A montagem é de um rigor surpreendente.