Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

Wilson Belém: 'A experiência coletiva do cinema também passa pela memória dos espaços públicos'

Wilson Belém, ator e cantor | Foto: Divulgação

Celebração de múltiplas sinestesias entre telona e melodia, "Canções de Cinema" é um espetáculo de canto agendado para este sábado (27), às 20h, no Estação Net Botafogo, que promete usar seus 70 minutos de duração em prol dos laços de afeto travados ao largo de um século entre filmes e música. Ator premiado, Wilson Belém passa em revista suas mais doces memórias de cinéfilo na construção de seu repertório, que promete levar a plateia a devaneios de emoção.

Vão ter outras apresentações do show - que é dirigido por Eber Inácio - nos dias 5, 11, 18 e 25 de maio, às 20h. Nele, acompanhado do tecladista Vinícius Melenas, Belém abre uma discussão sobre os palácios e os poeiras onde viu longas-metragens que educaram seu olhar.

Como funciona o repertório do show e de que maneira ele traduz o seu encanto com músicas de cinema?

Wilson Belém: Na escolha do repertório, busquei conjugar uma memória que fosse íntima e pessoal com a memória da experiência coletiva de assistir aos filmes. Certamente as canções dos filmes são fundamentais para que eles se imprimam definitivamente no nosso imaginário. As grandes personagens femininas e as divas do cinema também são pilares na construção desta mitologia, por isso abro o show com canções de quatro filmes em que as mulheres são estrelas absolutas: "Bete Balanço", "As bicicletas de Belleville", "Gilda" e "A Cor Púrpura". A experiência coletiva do cinema também passa pela memória dos espaços públicos dedicados à exibição de filmes. Alguns destes espaços marcaram minha infância e adolescência, como o Cine Drive In da Lagoa, a Cinemateca do MAM e alguns cinemas de rua. Tem um momento no show em que percorro a principal rua da Tijuca, onde cresci, lembrando dos cinemas que ali existiam e os filmes que neles eu vi. É um momento meio "Retratos Fantasmas".

Que canções nacionais perpassam o seu carinho pela música de cinema?

A história do cinema nacional que eu acompanhei é a história também da tentativa de reconstrução de um país. Fui adolescente no fim da ditadura e no início da abertura. O Rock 80 buscava trazer um vigor, uma energia e uma alegria que estavam há décadas sufocadas. Por isso, abro o show com Bete Balanço, personagem que pra mim é ícone da juventude desta época, e Cazuza, o seu maior poeta. Mas outras grandes mulheres também ajudaram nesta reconstrução, como Sonia Braga e Marília Pêra, atrizes dos filmes "Tieta" e "Dias Melhores Virão", cujas canções fecham o show. No meio do show, canto "Manhã de Carnaval" do filme "Orfeu Negro", onde brilha uma das atrizes mais importantes do cinema, Léa Garcia.

Que espaço você enxerga para a canção de cinema nas rádios e no Spotify? Aliás que papel o rádio exerce hoje na formação musical?

Voltei a escutar rádio recentemente e acho uma excelente ideia que se faça uma programa dedicado aos filmes e suas canções. Rádio de certa forma é uma experiência coletiva como a do cinema, já que milhares de pessoas, de toda parte do Brasil, estão ouvindo naquele momento a mesma música. As plataformas de streaming valorizam mais a experiência individualizada, cada um em sua bolha ouvindo aquilo que quer.

De que maneira esse experimento testa suas habilidades de ator?

De todas maneiras! Muita concentração e treino pra cantar durante mais de uma hora, mantendo o corpo ativo, presente, jogando com o público, acompanhado apenas por um tecladista. É uma loucura e, às vezes, eu me pergunto por que fui inventar isso... Mas é um teste que eu preciso, em uma busca de síntese das minhas diversas experiências como ator. Além disso, eu procuro produzir um espetáculo quando realmente acho que ele tem o que dizer para o outro... e quando aquilo produz sentidos pra mim. A procura por um vínculo direto com o público que costure experiências individuais e produza uma rede de afetos coletiva é o que me move a fazer teatro.