Por: Pedro Sobreiro

CRÍTICA FILME - DIVERTIDA MENTE 2: A ansiedade é só o começo

Em 'Divertida Mente 2", a jovem Riley chega na puberdade e começa a ter de lidar com novas emoções, como a Ansiedade e a Inveja | Foto: Disney/Pixar

Lançado em 2015, 'Divertida Mente' foi um respiro para a Pixar, que enfrentava a primeira crise de credibilidade de sua história. Até 2010, quando lançou o fenômeno 'Toy Story 3', o estúdio de animação 3D se tornou referência ao lançar 11 filmes espetaculares em sequência. Praticamente dona da categoria de 'Melhor Animação' do Oscar, a Pixar tornava realidade a imaginação de crianças e adultos com histórias sem iguais.

Porém a partir de 2011, o estúdio passou por mudanças internas e apostou em continuações e histórias menos espetaculares. Não que fossem filmes ruins, mas naquela altura do campeonato, nada que não fosse no mínimo excepcional seria capaz de fazer justiça ao nome e nível alcançados pela Pixar desde 1995, quando lançou o primeiro 'Toy Story' e revolucionou os longas animados.

Em meio a essa "seca de criatividade", surgiu "Divertida Mente", um filme de extremos. Ao mesmo tempo que apostava em um visual de cores primárias e formas simples para seus personagens, a trama escondia uma complexidade absurda de sintetizar nessas pequenas emoções antropomórficas conceitos da psicologia e da neurociência.

Mais do que isso, o diretor Peter Docter conseguiu contar essa história de forma emocionante, sensível e compreensível para todas as idades. Na trama, a pequena Riley vive um grande marco na infância de muitos, que é a mudança para uma cidade nova, tendo de deixar para trás seus amigos e a vida como sempre conheceu.

Neste cenário de caos, suas emoções ficam abaladas, já que a Tristeza tenta tomar o controle, mas a Alegria impede a emoção de se expressar. Dessa forma, as emoções partem em uma aventura pela mente de Riley, enquanto a menina fica emocionalmente instável.

O longa foi um espetáculo ao abordar de forma bem orgânica o amadurecimento e a dificuldade de expressar emoções, levando a um princípio de depressão. Tudo isso com um roteiro repleto de humor, aventura e emoção. Não por acaso, 'Divertida Mente' ganhou praticamente tudo que disputou naquela temporada de premiações.

Agora, nove anos depois, vivendo uma nova crise intensificada pela pandemia, a Pixar volta a apostar nas emoções de Riley para recuperar aquele prestígio de outras épocas. E provavelmente vão conseguir, porque 'Divertida Mente 2' é espetacular.

O veterano Peter Docter deixou a direção para que Kelsey Mann a assumisse. E cativa que ele não tenta replicar o trabalho do diretor anterior, ele aposta em sua própria visão para a história, que ganha mais participações das outras emoções, principalmente do Raiva e da grande antagonista da vez, a Ansiedade.

Estruturalmente falando, a trama do filme lembra bastante a do primeiro. A Alegria vive em paz com as outras emoções até que uma nova emoção surge e tenta tomar o controle, causando um pequeno caos na aparente paz que estava a vida de Riley. Elas discutem e a Alegria acaba perdendo seu posto na sala de controle, precisando encontrar uma forma de retornar a ela e salvar a menina.

A grande diferença da vez é que a Ansiedade, diferentemente da Tristeza, assume um papel mais de antagonista. Ela claramente tem boas intenções, mas acaba tirando a paz de todos e fazendo com que as amigas da Riley se afastem dela. Porque, na vida real, é isso que a Ansiedade faz com as pessoas. Ela muda e faz com que o próprio indivíduo se esqueça quem é.

Para complicar mais as coisas, Riley entra na tão temida puberdade e descobre que suas melhores amigas vão mudar de escola. Um dos maiores pesadelos da adolescência.

Com esse caos típico da idade, Kelsey Mann adota uma série de situações facilmente identificáveis por públicos de diferentes idades, como a autocobrança excessiva, a competitividade e como esses exageros mexem com a cabeça das pessoas.

Esse filme chega na melhor época possível para abordar essa vilã silenciosa, vivida brilhantemente por Tatá Werneck na versão brasileira. Segundo um levantamento da Organização Mundial da Saúde, cerca de 300 milhões de pessoas no mundo têm ansiedade, sendo o Brasil o país com maior incidência do transtorno. De acordo com a pesquisa da startup 'Guia da Alma', mais de 60% dos brasileiros apresentam alto nível de ansiedade.

Diante disso, 'Divertida Mente 2' se constrói como um filme que se aproxima da grandiosidade dos tempos de ouro do estúdio ao entender bem seu público e contar uma história com a qual pessoas de todas as idades vão se divertir e identificar. Ele traz também uma mensagem de esperança para todos que sofrem com as tão temidas crises de ansiedade, mostrando que sempre há uma saída. Talvez tenha faltado um pouquinho mais da ousadia do primeiro filme, mas não é nada que atrapalhe ou comprometa esse novo clássico Pixar. Nota: 9