Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

CRÍTICA CINEMA - ASSASSINO POR ACASO: Antes do funeral

'Assassino Por Acaso' se candidata a cult explorando as peripécias de um falso matador de aluguel | Foto: Divulgação

Nasceu um cult no limiar entra a comédia e o thriller de onde menos se esperava: da lavra autoral de Richard Linklater. "Assassino Por Acaso" ("Hit Man") se firma como um dos mais badalados filmes desta temporada à força da maneia sinuosa como o realizador de sucessos como "Boyhood" (2014) transforma em ficção uma história real nas raias do absurdo.

Seu personagem, Gary Johnson, é um professor de Filosofia que, para complementar a renda, faz um trabalho muito exótico para a polícia de Nova Orleans: ele se passa por matador de aluguel. Não mata uma mosca, não atira, não intimida. Ele apenas conversa com pessoas que estão dispostas a dar um fim a seus desafetos, flagrando intenções (e encomendas) de assassinato, o que leva essa sua "clientela" ao xilindró. Esse enredo vem de um artigo de 2001 da revista "Texas Monthly", escrito por Skip Hollandsworth a partir dos feitos reais de Johnson. A produção, com orçamento estimado em US$ 8,8 milhões, é roteirizada por Linklater em duo com seu protagonista, Glen Powell (o novo Brad Pitt), que está impecável em cena.

Nas raias do humor, Powell compõe Johnson como uma figura complexa: é um intelectual que se enfia no universo policial não por uma crença na Justiça, mas por dinheiro, sendo capaz de se disfarçar das figuras mais inusitadas para encarar pessoas que querem ver seus inimigos mortos. Inclua entre "inimigos" sócios, maridos e esposas. A fotografia apolínea de Shane F. Kelly ilumina essa narrativa sem grandes invenções plásticas. Já a montagem de Sandra Adair dá um ritmo tenso às viradas que se passam com o personagem. Seu maior contratempo é sua paixão por uma quase cliente: Madison Figueroa (a ótima atriz porto-riquenha Adria Arjona).

Madison quer se livrar do esposo absudador, mas, encantado por ela, Johnson a demove de se envolver num crime e recomenda que ela simplesmente o abandone. Mas os dois começam a ter um envolvimento, o que é ilícito aos olhos da Lei.

Conhecido por falar de processos de amadurecimento afetivo, a julgar pela trilogia aberta com "Antes do Amanhecer" (1995), Linklater aplica sua marca de autor aqui ao retratar a forma como Johnson se reinventa ao trombar com o amor. Como já havia flertado com a ação no passado, com "Newton Boys: Irmãos Fora-da-Lei" (1998), ele se sai bem das sequências de perseguição e tensão, explorando sempre as fragilidades do anti-herói encarnado com ginga por Powell.