Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

CRÍTICA FILME - ENTREVISTA COM O DEMÔNIO: Transmissão diabólica

O apresentador Jack Delroy, vivido por David Dastmalchian vai ter um plá com o Coisa Ruim | Foto: Divulgação/IFC Films Courtesy Everett Collection

Chama-se found footage o dispositivo narrativo - muito característico de longas de terror - no qual imagens de arquivo (em VHS, película, fitas Beta e afins) são usados para reconstituir uma trama que, em geral, terminou em tragédia, como é o caso de "Holocausto Canibal" (1980), de Ruggero Deodato. É uma forma de alusão às ferramentas legitimadoras do real do cinema documental, ainda que a não-ficção seja fake.

Um dos usos recentes mais engenhosos dessa técnica pode ser conferido em "Entrevista Com O Demônio" ("Late Night With The Devil"), que rendeu o prêmio de melhor roteiro do Festival de Sitges a seus diretores, Cameron Cairnes e Colin Cairnes. A premissa: a reconstituição de um Halloween tenebroso de 1977. A discussão de base: uma reflexão sobre a falta de limites éticos na indústria da mídia, sobretudo na TV. O maior achado: a atuação memorável do protagonista, David Dastmalchian

Cabe a ele interpretar o apresentador Jack Delroy, estrela do programa noturno "Night Owls", que luta desesperadamente para se manter no ar conforme despenca no Ibope americano. A saída para sustenta-lo aparece num Dia das Bruxas com a proposta de levar uma menina que, supostamente, está sob ataque do Diabo, no caso uma entidade satânica chamada Abraxas. A noite em que a menina se apresenta parece correr bem, com distintas reflexões teológicas, até que manifestações sobrenaturais começam a acontecer, expondo pecados de Delroy. É na montagem febril que as situações fantásticas dessa pequena produção ganham um vulto de surpresa, movimentando uma trama cheia de ironia com a engenharia da televisão. Mas o medo, por vezes, consegue se fazer presente em diálogos, como a alusão a um lugar chamado Árvores Altas, onde rituais pagãos são realizados.