Por: Bruno Ghetti (Folhapress)

CRÍTICA FILME - TUDO EM FAMÍLIA: Sem escapar da mediocridade que assola o gênero

Ao longo do filme, os personagens de Kidman, King e Efron lidam com as dificuldades do amor e do sexo | Foto: Divulgação Netflix

O americano Richard LaGravenese foi o responsável pelos roteiros de alguns dos filmes mais preciosos da década de 1990. Foi ele quem escreveu, por exemplo, "O Pescador de Ilusões", de 1991, e "As Pontes de Madison", de 1995. Mas desde que passou a dirigir seus próprios filmes, em "Volta por Cima", de 1998, mostrou que seu talento tinha limitações, muito embora exista certa qualidade em qualquer de seus trabalhos.

"Tudo em Família" não é roteirizado pelo cineasta, mas é uma nova aposta dele no campo das comédias românticas, gênero no qual acabou se especializando. Desta vez, investe em uma trama sobre o amor entre um homem e uma mulher mais velha.

Zac Efron interpreta Chris, astro de filmes de ação de qualidade duvidosa, cuja carreira há anos permanece estacionada no mesmo tipo de produções e personagens descartáveis. Mas é uma estrela, com direito a uma extrema vaidade pessoal e a ter assessores para resolver qualquer minúsculo problema em sua vida.

Uma de suas funcionárias é Zara, vivida por Joey King, uma espécie de faz-tudo, que conhece detalhadamente os caprichos de seu patrão e seu comportamento nada respeitoso com as mulheres com quem se envolve.

Mas um dia o ator conhece Brooke, interpretada por Nicole Kidman, mãe de Zara e uma escritora de grande talento, e os dois iniciam um romance. O que faz a garota ficar transtornada.

Em um primeiro momento, Zara se sente péssima porque acha que sua repentina promoção profissional se explica apenas como uma gentileza do patrão, querendo fazer um agrado a sua mãe. Depois, porque ela se dá conta de que, conhecendo bem Chris como ela conhece, o ator é capaz de magoar terrivelmente Brooke, como tem feito desde sempre com suas outras namoradas.

Em grande parte do filme, a talentosa King cria uma personagem um bocado birrenta, o que nos faz suspeitar de que ela não aceita o romance por um terceiro motivo: ciúme, puro e simples. Da mãe e do patrão. Ou, mais precisamente, porque é uma garota, no fundo, bastante mimada e com uma propensão ao egoísmo.

Essa suspeita vai se confirmando com o desenrolar da trama, e embora inicialmente o público possa rejeitar esse comportamento infantilizado de Zara, com o tempo ela cresce enquanto personagem. Porque ela é um poço de contradições: entre amor, ciúme e despeito, ela se perde, e está a todo tempo cometendo erros, e tentando corrigi-los em seguida, mas não raro causando ainda mais complicações por causa disso.

Apesar de irritante, é uma boa personagem, com mais nuances que as comédias românticas, em geral, tendem a criar.

O filme também acerta ao mostrar a relação entre sogra e nora por um viés bastante incomum, de amizade e companheirismo. Kathy Bates, que interpreta a mãe do marido de Brooke, que morreu ainda muito jovem, tem poucas cenas, mas ela brilha sempre que aparece, no papel da senhora boa praça e sexualmente ouriçada.

Mas existe algo que desce quadrado na interação entre Nicole Kidman e Zac Efron. Não se trata apenas de falta de química, ou meramente de estranhamento pela diferença de idade, é que simplesmente parece uma ideia improvável demais que algum dia Nicole Kidman fosse se interessar por Zac Efron.

Ainda mais sendo o seu personagem o poço de estupidez, o vácuo cultural e a encarnação da falta de refinamento que ele é, enquanto o de Kidman é uma mulher sofisticada, madura, pé no chão.

Nos trechos de idílio romântico, quando vemos o casalzinho brincando de se vestir com figurinos de filmes, ou quando aparecem bebendo vinho em uma praia ao pôr do Sol, ao som de uma música romântica genérica, o filme atinge instantes terrivelmente embaraçosos. Não há um pingo de verdade em absolutamente nada que aparece ali.

Em grande parte, é preciso dizer, o problema talvez seja Efron como um todo: nada do que diz respeito a ele parece real, genuíno. Desde os músculos ultraestufados do ator até seu rosto estranhamente anguloso e a pele irrealmente sem vincos.

Efron foi um ídolo adolescente carismático no começo da idade adulta, mas em menos de uma década, de repente ele parece ter migrado dos 18 aos 40 anos. Mas não um envelhecimento precoce, puramente; parece antes ter passado por um processo de robotização. Hoje em dia, ele tem uma figura improvável, engessada. A cada ano, se parece mais e mais com um androide.

"Tudo em Família" tem lá seus instantes, mas não consegue escapar à mediocridade generalizada que paira sobre as comédias românticas hollywoodianas há tempos. Entre todos os gêneros, talvez seja esse o mais agonizante na atualidade.