CRÍTICA FILME - TWISTERS: Um bom produto de sua época
Um erro recorrente na atual onda de remakes e reboots de Hollywood é o da insistência em reproduzir o original no novo filme. "Twisters", a continuação do "Twister" de 1996, brinca com essa armadilha logo no início, com um grupo novo de estudantes atrás de tornados.
De repente, um dos instrumentos meteorológicos do primeiro capítulo surge na picape dirigida por eles, como se preservado pela força da nostalgia.
A expectativa aí é que a sequência, a exemplo do sétimo "Star Wars", use o aparelho para inundar a tela de elementos, falas e personagens do antecessor. Mas o brinquedo, batizado de Dorothy, se perde em um rastro de destruição de um tornado que atinge os jovens. Nesse momento, o filme parece avisar o público de que o que vem a seguir está longe de um repeteco.
O que é uma bela mentira, em tempo, mas que pega bem para a produção --até porque a piada diverte pela sutileza. No fundo, o longa de Lee Isaac Chung segue passos parecidos com os da trama dos anos 1990, do diretor Jan de Bont.
Mas a continuação cria vantagens dentro desse cercadinho. Primeiro porque as mudanças de rumo são suficientes para deixar a trama imprevisível. Com o público, a continuação acompanha o ritmo de seus tornados, que estão sempre confundindo os protagonistas sobre a sua escala.
Um bom exemplo está na nova protagonista, Kate, vivida por Daisy Edgar-Jones. Como o personagem de Bill Paxton no original, ela volta ao corredor dos tornados americano depois de jurar uma aposentadoria precoce.
O estado do Oklahoma também mudou desde 1994, com um avanço nítido do aquecimento global. Um amigo de Kate, que a convence a voltar à região, chega a dizer que financiou a sua pesquisa do fenômeno graças à preocupação das empresas.
Para piorar, o campo da ciência do clima está dizimado. Além da iniciativa privada, que tem seus interesses escusos, Kate descobre o avanço das redes sociais na caçada. Ela encontra um grupo de YouTubers, apelidados de domadores de tornados, que vão atrás dos temporais pela adrenalina e pela audiência.
Assim, temos de novo dois grupos perseguindo as mesmas nuvens negras no interior americano. Apesar das reviravoltas, "Twisters" diverte nessas coincidências, ainda mais quando encontra a ação frenética de ir atrás e, depois, fugir de um tornado. Nesse ponto, Lee Isaac Chung não é Jan de Bont, mestre holandês da fotografia que tinha um prazer pela alta velocidade. Mas o diretor americano usa com sabedoria a câmera na mão para se aproximar da destruição, fazendo bom uso do suspense onde é possível.
Além da ação, "Twisters" tem à mão um elenco recheado de novos talentos, em uma versão anabolizada do original. Vira uma sessão de batismo de jovens astros, de Glen Powell --de "Assassino por Acaso"-- a David Corenswet --o novo Super-Homem--, que faz uma ótima imitação de Cary Elwes. Reiterações como essa reforçam o filme como experimento controlado de sua produtora, a Amblin, de Steven Spielberg. Mesmo quando a continuação acerta, ela atende mais a demandas do que a boas ideias.
Lee Isaac Chung aspira a Spielberg antes de Jan de Bont em seus impulsos artísticos. Tudo isso ajuda a reforçar a grande influência do diretor de "Jurassic Park", mas deixa "Twisters" um tanto limitado. O filme é o bom aluno e, de novo, um produto da época.