CRÍTICA - FILME - O ÚLTIMO PUB: A fina escrita de Paul Laverty

Por Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

Uma fotógrafa refugiada e um dono de bar travam amizade em 'O Último Pub', longa que pode ser a obra derradeira do realizador Ken Loach

 

Quase um ano e meio depois de sua estreia mundial, na competição pela Palma de Ouro de Cannes de 2023, "O Último Pub" ("The Old Oak") faz sua estreia em circuito comercial no Brasil apoiado na grife autoral de seu realizador: o marxista inglês Ken Loach. É necessário, contudo, que os créditos de sua excelência sejam divididos com seu roteirista, que virou o dramaturgo por assinatura do aclamado cineasta: Paul Laverty.

Formado em Filosofia e depois em Direito, esse escocês nascido em Calcutá fez da América Latina das décadas de 1980 e 90 a arena para uma série de lutas sociais em prol de países marcados por ditaduras ou guerrilhas. Da Nicarágua, onde iniciou seu périplo, ele foi para El Salvador e, na sequência, partiu para a Guatemala. Após um longo périplo pelas veias abertas do território de colonização hispânica, ele resolveu procurar Loach, entusiasmado pela natureza marxista dos longas do diretor, a fim de lhe servir como consultor para o projeto que virou o filme "Uma Canção Para Carla" (1996), sobre a reinvenção de uma imigrante nicaraguense em Glasgow.

Aquela aproximação de Laverty com o audiovisual deu frutos, uma vez que Loach nunca mais o largou. Fizeram outras 15 produções já lançadas, incluindo os dois títulos que deram a Palma dourada ao realizador: "Eu, Daniel Blake" (2016) e "Ventos da Liberdade" (2006). Tudo o que havia de bom nesses dois sucessos se faz notar em "O Último Pub", que recebeu menção honrosa do Júri Ecumênico da Croisette. Laverty é parte essencial da força política da estética de Loach, com seu fraseado curto, de reflexões alarmistas sobre a engenharia da exclusão no Velho Mundo.

O "Old Oak" do título original é o nome de um bar numa cidade inglesa outrora sustentada pela exploração de suas minas - hoje esgotadas. A falência generalizada do local movimenta as vendas de cerveja e de uísque de TJ Ballatyne, o dono daquele boteco, vivido com esplendor por Dave Turner. A escrita fina de Laverty oferece a Turner munição para destilar dor no momento em que seu personagem passa a acolher (e servir) refugiados sírios que se aboletam, dia a dia, naquele lugar assombrado pela xenofobia europeia. Entre as figuras que acolhe está uma fotógrafa, Yara (Ebla Mari), cujos dramas familiares vão redesenhar o olhar de Ballantyne sobre a exclusão.

Agitado por reviravoltas violentas, o roteiro de Laverty abraça a sociologia, combinando-a com o (melo)drama numa mistura perfeita, filtrada pela fotografia sóbria de Robbie Ryan.