Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

Jaione Camborda: 'Eu foco nas fronteiras'

Presidente do júri de San Sebástian este ano, Jaione Camborda exibe a Concha de Ouro que ganhou em 2023 | Foto: Divulgação SSIFF

Um ano depois de ter conquistado a Concha de Ouro - e logo em sua cidade natal, San Sebastián - tornando-se a primeira diretora espanhola a receber a láurea, Jaione Camborda retorna ao festival basco para presidir o júri oficial de 2024. O longa-metragem que a consagrou por lá, "O Corno" (também chamado de "O Corno do Centeio"), rodado em coprodução com Portugal, segue a fazer carreira comercial pela Europa, mantendo-se inédito por aqui. Ao contrário do que o seu título sugere, sua trama não fala sobre adultérios, e, sim, sobre os direitos das mulheres sobre seus corpos. Nele, Jaione volta ao passado, até os anos 1970, na fronteira de seu país com terras lusas. Vai até lá para contar a fuga de uma parteira María (Janet Novás) que ajuda uma jovem a abortar. A morte da moça faz de María um alvo da polícia, o que a obriga a sair de seu lar e buscar uma nova vida. A fotografia de Rui Poças amplia a potência estética da investigação social da cineasta, que teve o diretor Rodrigo Areias como seu produtor.

Jaione conversou com o Correio da Manhã em meio à sua vitória, destacando sua mirada feminista, que deve se fazer relevante nos resultados de Donostia deste ano.

É impossível viajarmos à Espanha da década de 1970 sem pensar no regime ditatorial de Franco. De que forma o franquismo aparece, ainda que seja como um fantasma, na trama de "O Corno"?

Jaione Camborda: O tema não é tratado explicitamente no filme, de maneira direta, mas faz parte dos muitos perigos que rondam aquele mundo. Tentei fazer com que a atmosfera por mim retratada se parecesse estilisticamente com a Espanha rural do presente. Era uma forma de buscar conexão com dilemas contemporâneos sobre as proibições impostas ao corpo feminino.

Que analogia seu filme trava entre o espaço ibérico e o corpo das mulheres?

Eu ponho foco nas fronteiras, registrando os limites culturais entre os territórios. Filmei numa região que é cortada pelo Minho, na qual se entende o galego e o português.

Seu filme denuncia violências diversas contra as mulheres, mas jamais ridiculariza os homens. Como encontrar esse limite de sobriedade na representação dos gêneros?

Nunca busquei satanizar o masculino. Eu apenas evito enquadrar homens no centro da narrativa, mantendo as mulheres em posto de protagonismo. Busquei trazer testemunhos reais de vivências femininas para montar a narrativa.