Revolução pela alegria
Na harmonia do samba e da sociologia, o documentário 'Não Vamos Sucumbir', de Miguel Przewodowski, aborda os bastidores dos desfiles de carnaval num retrato político e poético
Pedacinho colorido de saudade, o confete faz estrela em "Não Vamos Sucumbir", inventário cinematográfico de cicatrizes, resiliências e batuques ligados ao maior espetáculo da Terra nos quesitos samba e integração social. Com olho de antropólogo e lente de poeta, o cineasta Miguel Przewodowski leva às telas, a partir desta quinta-feira (19), um registro (obrigatório) de um tempo em que o apito carnavalesco quase foi silenciado, parte pelo terror da covid-19, parte pela mordaça de um governo avesso à diversidade e à cultura.
Seu filme entra em circuito cartografando a luta de quem sua a camisa, ano a ano, para honrar a majestade de Rei Momo na Sapucaí. Seu mapeamento parte de uma geopolítica de guerra. A guerra que toda a comunidade do carnaval travou quando a cidade fechou suas portas - ali por março de 2020 - e adiou parte de seus sonhos, acossada pelo coronavírus. O gemido das cuícas deu lugar a tosses ferozes.
Em 2021, não havia como se falar em blocos, em carros alegóricos. No entanto, muita gente almejou voltar para a Avenida, o que só aconteceu em 2022. É dessa gente que Przewodowski fala, a partir de uma poética trança de memórias do quanto se batalhou para a festa daquele ano existir.
Interessado em dinâmicas sociais, o cineasta visitou barracões, acompanhou ensaios, filmou a peleja de um povo que faz tudo para a Quarta-Feira de Cinzas valer a pena. Pensou ainda toda a gênese desse evento de reverberação transcontinental que é a disputa anual dos grêmios recreativos do samba.
Alternando análises e vivências in loco, "Não Vamos Sucumbir" promove uma viagem pelos bastidores das escolas de samba sob o olhar de seus mais importantes pensadores, de suas realizadoras/de seus realizadores, de quem dança, de quem toca.