Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

'Malês' na boca do mundo

Pitanga dirige e integra o elenco de 'Malês', que retrata a mais importante revolta do povo negro contra a escravidão no Brasil | Foto: Vantoen Pereira Jr/Divulgação

Dois anos depois de ter presidido o júri da Première Brasil, o baiano Antonio Pitanga volta ao Festival do Rio hoje, às 19h30, em sua tela mais luxuosa, a do Odeon, para projetar para o público carioca, pela primeira vez, seu tão esperado "Malês". Quase 45 anos depois de seu primeiro exercício como realizador, chamado "Na Boca do Mundo" (1978), um dos atores essenciais do Cinema Novo volta à direção filmando um enredo de Manuela Dias, que recria a Bahia do século XIX, em meados de 1830.

Na ocasião, uma rebelião começou a ser arquitetada por africanos muçulmanos. A revolta se passa no final do Ramadã, mês do calendário islâmico em que o jejum é uma forma de celebrar Alá. Após o fracasso da revolta, esses manifestantes foram duramente punidos e a repressão contra as populações pretas no país só fez aumentar. Apesar disso, o exemplo de luta e de resistência deles marcou a História não apenas por uma aula de estratégia política, mas pelo simbolismo intelectual de um povo que combateu o açoite com boas ideias.

"Fiquei 26 anos querendo fazer esse filme, que não é sobre a História do Brasil e, sim, sobre a História do povo negro", diz Pitanga ao Correio da Manhã. "Conto aqui o mais importante levante feito por negros nesse país, quando a população escravizada levantou a bandeira da democracia, pela liberdade, contra o racismo. É um movimento que o Brasil não conhece e digo que esse projeto não é do Pitanga, tem que ser de todos. Quero exibir nas escolas, nas comunidades para que a gente possa discutir e ter uma aproximação da nossa História".

Com o bamba da edição Quito Ribeiro assinando sua montagem, "Malês", traz Camila e Rocco Pitanga, filhos de Antonio, no elenco. Ao lado deles estão Bukassa Kabengele, Rodrigo dos Santos, Patrícia Pillar, Samira Carvalho e mais uma trupe de peso.

Nas filmagens, sob a produção de Flávio R. Tambellini, Pitanga divide seu tempo na direção com seu trabalho de ator, refinando a figura de Pacífico Licutan, um dos líderes do levante, que defendia a importância da participação de diferentes aldeias e religiões para o sucesso da revolta.

"O 'Malês' é um projeto que começou quando eu filmei 'Idade da Terra', do Glauber Rocha. Ele queria levar os baianos todos de volta para a Bahia, e me disse: 'Tá na hora de a gente voltar pra casa, Pitanga'. E com essa ideia de retornar, um dos projetos dele era produzir 'Malês'", conta Pitanga. "Como o Glauber morreu, o projeto ficou adormecido até que, vendo 'Amistad', do Spielberg, eu retomei a ideia. Fiz o argumento com Orlando Sena e entreguei para a Manuela Dias escrever o roteiro".

Há mais um par de sessões de "Malês": uma é na sexta, às 16h, no Estação NET Rio, e a outra é no sábado, às 18h40, no Reserva Cultural