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O eleito do ódio

Sebastian Stan tem uma atuação primorosa como o jovem Trump em 'O Aprendiz' | Foto: Divulgação

Por Rodrigo Fonseca

Especial para o Correio da Manhã

Falou-se de veto judicial a "O Aprendiz" ("The Apprentice") quando a cinebiografia de Donald Trump passou em Cannes, em disputa pela Palma de Ouro, e ampliou-se essa fala quando ele foi alvo de um atentado a tiros, em julho, na Pensilvânia. Apesar de muitas ameaças, o longa-metragem de Ali Abbasi - diretor escandinavo de origem iraniana respeitado cá por "Holy Spider", de 2022 - chega hoje ao Brasil, com projeção às 22h, no Odeon. O Festival do Rio vai exibi-lo de novo amanhã, às 21h15, no Reserva Cultural, e no domingo, às 21h45, no Estação NET Gávea.

Sua passagem pela Croisette foi cercada de elogios, com destaque para o desempenho do ator Sebastian Stan. A produção é uma biopic não autorizada do ex-líder estadunidense, que sonha retornar à Casa Branca. Quem tem dúvidas sobre os ditames morais do empresário e outrora estadista tenderá a não apoiá-lo depois de assistir a esse retrato áspero de sua juventude.

"Não é um filme sobre Trump, mas sim um filme sobre o sistema, sobre como o sistema funciona e como o poder se articula com ele. A ideia de que os Estados Unidos estão divididos é uma ficção, pois as pessoas que parecem estar em lados opostos frequentam as mesmas festas. Acho que (o escritor) Kurt Vonnegut definiu bem a situação ao dizer: 'Na América só existem dois partidos: os vencedores e os derrotados'. Esse é o esquema", disse Abbasi em Cannes, onde chamou a atenção da crítica com o thriller "Border" (2018).

Para um artista que acredita não ser otimista, Abbasi anda confiante demais na boa vontade de Trump, uma vez que "O Aprendiz" devasta as supostas virtudes que seu personagem central poderia ter. O roteiro é centrado no processo de amadurecimento de Donald T entre os anos 1970 e a década de 1980 a partir da relação de aprendizado que ele estabelece com o poderoso advogado Roy Cohn, vivido por Jeremy Strong (da série "Succession"). Roy vira um mentor que ensina a seu pupilo as manhas sobre como vencer nos negócios no apogeu do capitalismo consumista. A Trump Tower é o primeiro dos acertos de seu "aluno" que, pouco a pouco, trai a confiança do mestre. Desrespeita ainda sua mulher, Ivana (Maria Bakalova), submetendo-a a uma violência sexual. Por isso (e mais um pouco), o comitê Trump quer processar o filme. Mas Abbasi não teme represálias.

"As eleições serão o nosso marketing", disse o cineasta, que arranca de Stan uma atuação magistral.

Conhecido na seara pop de Hollywood pelo papel do super-herói Soldado Invernal, da Marvel, ele ganhou o Urso de Prata de Berlim, em fevereiro, por "A Different Man". "Nossa esperança é que as pessoas vejam o filme", disse Stan ao Correio da Manhã.