'Alien', 45 anos de terror e sucesso
Metáfora para a xenofobia, a criatura celebrizada em cult de Ridley Scott, de 1979, vai ser alvo de debates no festival 'Terrível', do Estação
Faltam 15 dias cravados para sir Ridley Scott, hoje com 86 anos, estrear "Gladiador II" e se firmar, uma vez mais, como candidato ao Oscar, sendo que Denzel Washington, de acordo com as primeiras críticas ao filme, tem tudo para papar uma indicação da Academia de Hollywood por seu desempenho como um estrategista ligado ao Coliseu.
Enquanto o filme não chega por aqui, o circuito brasileiro pode celebrar o cineasta inglês a partir de uma de suas criações mais seminais, que está comemorando 45 anos de sucesso. Neste domingo, às 20h30, a mostra Terrível: Parte 3, do Grupo Estação, leva ao NET Botafogo, ali na Voluntário da Pátria 88, um cult da sci-fi que se mescla ao horror: "Alien - o 8° Passageiro". Foi em 1979 que a criatura de saliva ácida, inspirada em pinturas e referências gráficas surrealistas do suíço Hans Ruedi Giger (1940-2014) chegaram às telas pela primeira vez, faturando cerca de US$ 187 milhões - cerca de 17 vezes mais do que seu custo de produção, estimado em US$ 11 milhões. Era um tempo assolado por "Star Wars", que estreou em 1977, fazendo Hollywood desejar tramas espaciais a granel. Eis que Scott somou, com competência invejável, dois filões: sci-fi e filme de monstro. Nasceu ali um fenômeno.
Quando a Fox idealizou o projeto, realizadores como Peter Yates, Jack Clayton e Robert Aldrich foram considerados como potenciais pilotos para a jornada espacial da tenente Ripley, papel que celebrizou Sigourney Weaver, laureada este ano com o Leão de Ouro Honorário, dado pelo Festival de Veneza. Na ocasião, o roteirista Dan O'Bannon e os produtores precisavam de um jovem talento com mais estilo, para impedir que o projeto pudesse parecer um filme B. Eis que o sucesso de "Os Duelistas" (1977), que deu Ridley o prêmio de Melhor Filme de Estreia em Cannes, fez desse publicitário britânico a escolha precisa.
Somando-se as bilheterias dos sete filmes da série Alien, mais os dois (desastrosos) derivados nos quais o Predador é o algoz, totaliza-se uma receita de US$ 1,8 bilhão para os cofres os cofres da Fox e da própria ficção científica, que tem do monstrengo uma mina de ouro, mas também de controvérsia. Um novo capítulo, "Romulus", dirigido por Fede Alvarez, foi lançado este ano e arrecadou US$ 351 milhões.
O que existe nessa franquia de mais precioso (ou melhor, de perverso), nestes tempos em que Donald Trump pode voltar ao Poder nos EUA, é o refinado tratamento que o veterano diretor inglês dá à questão dos "estrangeiros", das invasões bárbaras, não esquecendo que tudo nesta grife milionária começou com a ideia do oitavo passageiro, ou seja, do intruso de outra nacionalidade. No filme original, uma obra-prima, uma nave com sete tripulantes se dava conta de um membro número oito, de outra origem territorial, que ali entrava para explorar os "recursos naturais" da embarcação - ou seja, comer e se reproduzir. Foi uma abordagem politizada, embalada em uma direção de arte sofisticada, que acabou sendo coroada com um Oscar de cenografia.
Seu lançamento se deu em dias de extrema direita na América. Era o fim dos anos 1970, encerrados numa ressaca de ideologias e desbundes. Nada mais adequado, portanto, do que um filme carregado da paranoia que ditaria as regras da política nos anos seguintes: invadir sempre que possível; ser invadido, nunca. É um período em que a América vira um porto para os degredados cubanos e para desertores eslavos. Mas qualquer presença "alienígena" é um sinal de alerta. Hollywood e a TV até apostam nos alienígenas "do Bem", tipo o ET de Spielberg e Alf, da série homônima de TV, o ETeimoso, aqui dublada por Orlando Drummond. Mas mesmo eles são ilegais, causam alarde, mudam regras, quebram normas de conduta. Eram tempos de Reagan. Agora são tempos de Trump. Há semelhanças, vis simetrias. Eis o Alien de volta, para fazer o trabalho sujo de nos lembrar que a ameaça maior é biológica, viva. E, por outro lado, menos visível, indicar que esta "sensação de ameaça" é um traço xenofóbico, racista, totalitário. Nada mais adequado, em meio ao totalitarismo atual, do que sua volta aos cinemas, na retrospectiva do Estação, que exibe cinco filmes nesta quinta. Às 14h, tem "Psicose"; às 16h10, rola "Carrie, a Estranha"; às 18h05, passa "Banho de Sangue"; às 19h50, vai ser projetado "A Noiva Cadáver", e às 21h30, será a vez de "O Gabinete do Dr. Caligari'.