Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

O método Sandrine Kiberlain no Bafici

Sandrine Kiberlain (à esquerda) no set de' Les Barbares', de Julie Delpy | Foto: Divulgação

 

Laureada duas vezes com o troféu César, por "Ter ou Não Ter" (1996) e "Uma Juíza Sem Juízo" (2014), Sandrine Kiberlain fez (e faz) fama como um dos rostos símbolos da comédia francesa contemporânea, seja dramática ou romântica ou seja ainda uma crônica de costumes das mais ácidas, como "Les Barbares", um dos destaques da 26ª edição do Bafici.

Risadas tomaram conta do Festival Internacional de Cinema Independente de Buenos Aires, em solo argentino, a cada sessão do longa-metragem dirigido pela atriz Julie Delpy (de "A Igualdade É Branca"). Sandrine é um dos destaques de um elenco pluralíssimo. A trama ironiza o bom-mocismo da política assistencial da França. No enredo, os cidadãos da Bretanha decidiram por unanimidade aceitar refugiados ucranianos em troca de subsídios do governo. No entanto, em vez de ver receber uma leva de imigrantes da Ucrânia, a prefeitura local acolhe (por engano) imigrantes sírios, o que causa uma série de conflitos ligados a práticas de xenofobia.

"Situações de guerra sempre geram histórias atrozes, mas também abrem brecha para causos de coragem", disse Sandrine ao Correio da Manhã, nas filmagens de "Les Barbares", em meio ao lançamento de "A Garota Radiante", seu primeiro longa como cineasta.

Aos 57 anos, Sandrine é uma das estrelas mais prolíficas de sua pátria na atualidade, sempre atenta a temas polêmicos da contemporaneidade, como os ranços xenófobos da Europa. Tem três filmes no forno neste momento, para chegarem às telas até dezembro: "Banquise", de Emmanuel Courcol; "L'Accident de Piano", de Quentin Dupieux; e "Personne d'Autre", de Jean-Baptiste Léonetti. "Eu busco expressar vivências, sem jamais incorrer em caricaturas", disse a atriz ao Correio. "Na História do cinema francês, nós aprendemos com François Truffaut que a doçura é uma forma de falar de inquietações do nosso tempo. Busco filmes que encontrem uma forma doce de expor crises angústias".

Popularizada entre os cinéfilos brasileiros por "Betty Fisher e Outras Histórias" (2001) e "O Pequeno Nicolau" (2009), a atriz participou de fenômenos recentes da venda de ingresso como "Novembro - Paris Atacada", de Cédric Jimenez, visto em seu país por cerca de 2,3 milhões de pagantes, em 2022. Brilhou ainda no recém-lançado "Crônica de uma Relação Passageira", que saiu de Cannes com o status de cult. "Les Barbares" encontra o mesmo destino no Bafici, onde se firma como um ímã das plateias portenhas.

"Tenho me empenhado em histórias que tragam uma afirmação da vida nesta era de medo", disse Sandrine via Zoom.

Com estreias a caminho até domingo, quando encerra sua programação, o Bafici emplacou mais um queridinho no coração dos argentinos: a produção paraguaia "Bajo Las Banderas, El Sol", de Juanjo Pereira. Sete anos depois da consagração de "As Herdeiras", nuestros hermanos paraguaios voltam a se destacar no coração dos grandes festivais do mundo. Em competição no É Tudo Verdade, no RJ e em SP, o documentário é um mosaico de exuberante montagem. Sua estrutura formal é uma reação à recordações latinas de 1989, ano da queda da ditadura de 35 anos de Alfredo Stroessner. Sua saída do Poder marcou o fim de um dos regimes autoritários mais duradouros do mundo. Isso também levou ao abandono dos arquivos audiovisuais que haviam consolidado seu comando. Esse material, criado para moldar uma identidade nacional e celebrar um regime de direita, foi deixado para desaparecer da memória. Juanjo cuidou para evitar esse destino.