Enquanto a plateia argentina se delicia com a vasta oferta de animações do 26º Bafici ("Angelo Dans La Forêt Mystérieuse", "Sunburnt Unicorn", "Writing Home", "Space Cadet", com direito a filme inédito do mestre francês Jean-François Laguionie ("Slocum et Moi") no festival anual de Buenos Aires, um dos diretores de maior prestígio da América Latina quando o assunto envolve técnicas de desenho e stop-motion prepara um par de produções para ampliar uma obra que une humor e poesia. Juan Pablo Zaramella é seu nome.
Um nome que se tornou conhecido no Brasil quando o hoje extinto Anima Mundi (maratona cinéfila realizada no Rio e em São Paulo de 1993 a 2019) promoveu uma mostra de seus curtas, incluindo "Lapsus" (2007) e "Viaje a Marte" (2005). Na quarta, ele completou 53 anos, em plena atividade, em sua base operações, no estúdio portenho onde desenvolveu animações impagáveis, como "Luminaris" (2011) e "El Hombre Más Chiquito Del Mundo", que virou série, em 2017. Na entrevista a seguir, Zaramella fala de suas peripécias e faz um balanço da arte de animar nas telas de sua pátria.
Como você avalia o setor de animação na Argentina atualmente e quais são os canais de conexão entre os animadores de Buenos Aires (e arredores) e os diretores de desenhos animados, stop-motion, rotoscopia e similares em outros países da América Latina?
Juan Pablo Zaramella: A animação argentina está em uma situação contraditória. Por um lado, o setor cresceu muito na última década, apesar de ter sido muito difícil para o mundo audiovisual entender as particularidades dos processos de produção de animação. Estávamos ganhando terreno, dando pequenos passos para melhorar essas condições. Mais profissionais foram treinados, espaços foram criados no cinema e, nos canais, produzimos séries e longas-metragens. No entanto, com a chegada do atual governo e suas políticas culturais nulas, a indústria cinematográfica sentiu o ataque, e a animação, que vinha lutando contra moinhos de vento, ficou quase paralisada. Felizmente, nos últimos anos, começou a surgir uma rede latino-americana, com fortes vínculos entre os países e coproduções cada vez mais frequentes, o que, em tempos difíceis para alguns (nós agora), ajuda a manter a atividade viva na região.
Quais são seus projetos de animação atuais? Há algum longa-metragem em andamento?
Sim, tenho um projeto de longa-metragem com seu desenvolvimento pronto para entrar em pré-produção, intitulado "Soy Nina". É uma coprodução com o estúdio Zumbástico do Chile, meu estúdio, em associação com a Infinity Hil. Será um filme em stop-motion sobre a relação entre culturas e camadas sociais. É um filme para toda a família. Estamos todos muito animados com o projeto e pretendemos começar a produção em breve. Também tenho um projeto de curta-metragem em desenvolvimento, chamado "Anamorfia", que combina pixilation (técnica de animação que usa atores ou objetos reais, captados foto a foto, para criar uma sequência animada) com dança contemporânea. Portanto, tenho um pé em cada lado, um no comercial/industrial e outro no experimental.
Como você definiria os temas que movem seus filmes? De que fala o seu cinema?
Eu não saberia dizer. Nunca escrevo a partir de temas. Começo com imagens, situações e, aos poucos, vou expandindo e construindo um universo e sua narrativa. Gosto de descobrir temas, porque a abordagem se torna mais poderosa quando eles brotam do inconsciente. O mesmo acontece com mensagens e sensos morais. É muito desconfortável pregar, não me sinto nessa posição. Prefiro contar situações.
O Anima Mundi foi interrompido em 2019 sob os vetores econômicos do governo Bolsonaro, mas influenciou gerações. Como foi sua experiência no festival?
Foi linda! Sempre gostei muito do Anima Mundi. Um espírito único, um formato bem latino-americano, descontraído, super aberto à sociedade em geral. Eles conseguiram massificar um evento de animação independente. Sinceramente, torço pelo retorno do Anima Mundi. De alguma forma temos que trazer de volta esse festival, esse espírito bonito e festivo que tanto influenciou muitos da minha geração.