O auge da produção nacional de filmes de protesto é registrado em 1979, com 15 obras, a maior parte documentários e curtas, mas há longas de ficção como "Paula, a História de uma Subversiva". Produzido com recursos da extinta Embrafilme, o drama de Francisco Ramalho Junior analisa as consequências da ditadura para quatro gerações.
Morettin, o professor, diz que o fechamento da Embrafilme, em 1990, impactou o cinema no país. Apesar disso, há obras de destaque na década, caso de "O Que É Isso, Companheiro", de 1997, dirigido por Bruno Barreto e indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro. Com Fernanda Torres entre as protagonistas, mostra o sequestro do embaixador americano Charles Burke Elbrick.
Novos picos de produção foram registrados no decorrer dos anos 2000, o último em 2013, com nove filmes, o que os especialistas relacionam aos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade, concluída em 2014.
Professor do departamento de História da Universidade Federal do Paraná, Fernando Seliprandy afirma que, por muito tempo, o cinema sobre a ditadura foi centrado nas ações de resistência e testemunhos. Nos anos 2000, surgiram filmes sobre perpetradores e sobre outros perfis de vítimas que não as da classe média branca. "No campo historiográfico do cinema, 'Ainda Estou Aqui' é vinculado a uma pauta de memória que já não era a da vez, mas se torna um fenômeno social".
Na Argentina, os golpes de 1955 e 1966 antecederam a tomada do poder pelos militares em 1976, instaurando um regime que vai até 1983. No mesmo ano do golpe, ao menos cinco filmes críticos sobre o tema foram lançados como "Bandidos como Jesus", de Cristina Ruiz e Giampiero Tartagni, sobre a militância progressista na igreja católica.
Enquanto no Brasil a retomada dos filmes sobre a ditadura ocorreu em gestões petistas, a produção sobre a ditadura argentina tem maior fôlego sob os governos Cristina Kirchner, com cerca de 200 obras feitas de 2007 a 2015. Os picos de lançamentos foram registrados em 2016 e 2018, já sob Mauricio Macri, com 27 filmes em cada ano. "Os Kirchner adotaram a política de memória relacionada à ditadura como uma pauta. Foi criado um espaço de memória onde funcionava a Escola Superior de Mecânica da Armada, usada como centro de tortura na ditadura. O Brasil sempre teve uma política de memória mais tímida", afirma Seliprandy.
Depois de conquistar dois prêmios Oscar, a produção sobre a ditadura argentina recebeu uma nova indicação em 2022, com "Argentina, 1985", baseado na história de procuradores responsáveis por processar autoridades da ditadura, obra estrelada por Ricardo Darín e Peter Lanzani.
No Chile, a ditadura de Augusto Pinochet começou em 1973, com o golpe ao governo de Salvador Allende, e terminou em 1990. Em 1975, críticas ao regime passam a aparecer em obras como "Chove Sobre Santiago", de Helvio Soto.
O professor Ignácio Del Valle-Dávila, do Instituto de Artes da Unicamp, afirma que muitos cineastas exilados em razão da perseguição do regime Pinochet produziram filmes sobre o Chile em outros países, o que permitiu que a ditadura do país se tornasse mais conhecida. "Há uma relação forte com políticas de memória desenvolvidas por outros agentes culturais, que formam uma espécie de diplomacia cultural. Essas sinergias podem se traduzir em uma política pública que fomenta discursos sobre a memória histórica, favoráveis a surgimento desse tipo de filme."
O audiovisual chileno passou a receber investimentos apenas nos anos 2000, somando ao menos 155 filmes sobre o regime militar desde então. O pico foi registrado em 2015 e 2020, com 15 obras, o que Dávila relaciona a datas importantes sobre o tema no país. Em 2013, o filme "No", de Pablo Larraín, sobre a campanha pelo "Não" no referendo que questionava a permanência do general Augusto Pinochet no poder, conquistou uma indicação ao Oscar. Dez anos depois, o tema ainda rendeu "O Conde", também de Larraín, melhor roteiro no Festival de Veneza, que retrata Pinochet como um vampiro de 250 anos.