Cannes sem Isabelle Huppert não é Cannes, por isso, a badalada estrela francesa vai desfilar na Croisette, de 13 a 23 de maio, à frente de "La Femme La Plus Riche Du Monde", um ensaio de tons tragicômicos sobre o Poder. Antes disso, quem se delicia com seu talento é o Brasil, onde ela está em cartaz com "As Aventuras De Uma Francesa Na Coreia" ("A Traveler's Needs"), que deu ao prolífico Hong Sangsoo o Grande Prêmio do Júri da Berlinale de 2024. Custou, mas essa joia (palavrosa) chegou ao circuito nacional.
Por ter positivado num teste de covid-19 dias antes de embarcar para o Festival de Berlim de 2022, Isabelle foi impossibilitada de comparecer à cerimônia de entrega do Urso de Ouro Honorário que receberia pelo conjunto de sua carreira, uma das mais prolíficas da indústria audiovisual. Agora, a atriz parisiense de 72 anos vai às forras e se delicia com um saldo dos mais positivos no evento germânico, onde emplacou faz pouco o delicioso policial "As Pessoas Do Lado" ("Le Gens d'à Côté"), exibido na Mostra de São Paulo, em outubro passado.
"Eu fiquei feliz ao saber que "A Dona do Barato', que eu protagonizo, foi o filme francês de maior sucesso no Brasil durante a pandemia, e sei que tenho convites pendentes para visitar vocês, mas ainda não tive chance de dar um pulo no país de vocês. O cinema tem muitas vozes novas ativas, criando mundos próprios. Eu vivo em busca dessas vozes", disse Isabelle ao Correio, durante o Festival de Berlim, onde pode ajudar o diretor sul-coreano Hong Sangsoo, que faz tantos filmes quanto ela, a sair da Alemanha premiado.
Os dois fizeram juntos "A Visitante Francesa", em 2012, e "A Câmera de Claire", em 2017. Eles retomam o convívio agora, em "A Traveler's Needs", no qual Isabelle interpreta uma abilolada professora de Francês que engata em conversas e bebedeiras com artistas para quem leciona. Um jovem poeta e sua mãe bem intrujona integram a fauna de personagens de Sangsoo.
"Neste novo encontro nosso, eu até levei a roupa da personagem. O problema foi ter que tomar o Makgeolli, uma bebida típica com aspecto de leite, doce, mas... forte. Eu não bebo... quer dizer, só bem pouco", disse a atriz ao Correio, na capital alemã. "Hong não trabalha com roteiro, nem com enredo definido. A gente vai criando no processo, em tramas bem-humoradas, mas carregadas de uma certa melancolia".
Já em "As Pessoas do Lado", a estrela europeia é dirigida por um titã da França nas telas: André Téchiné. O aclamado realizador de "As Testemunhas" (2007) destila elegância nesse suspense, narrando a saga de uma policial que se afeiçoa por seus novos vizinhos até entrar em dilema ao descobrir que um deles tem um passado de crimes.
São dois artesões autorais, duas escolas da arte de filmar. "Respeito o olhar de cineastas, mas não encaro a parceria que tenho com realizadores como um aprendizado, pois eu não me vejo como estudante e nem trato diretores como mestres. São colegas. Cada colega tem um olhar específico, que me alimenta. Filmei muito com Claude Chabrol, que me deu papéis em grandes filmes. Mas eu não encarava sua doce figura como um professor. Chabrol foi o criador de um universo. É o que admiro nele".
Em setembro passado, Isabelle presidiu o júri do Festival de Veneza que concedeu o prêmio de Melhor Roteiro a "Ainda Estou Aqui", o oscarizado drama de Walter Salles, hoje no Globoplay.