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Movimentos de um corpo-memória

Iara Cassano: 'Espero provocar o público a refletir e questionar os padrões dessa sociedade que pune mulheres negras que dispõem de sua beleza como querem e julga a passista como um estereótipo sexualizado' | Foto: Aline Dias/Divulgação

O espetáculo inédito "Em Gira: Ela Encruzilhada", com Iara Cassano, coreógrafa e passista do Salgueiro, Estreia na quinta (16), às 19h, na Sala Multiuso do Sesc Copacabana. A apresentação põe em evidência a ancestralidade do samba e do carnaval.

Nesta coregrafia, Iara, com seu corpo-memória, se faz campo de conhecimento e convida o público a um mergulho nas travessias do corpo feminino afro-carioca em seus ciclos espirais, aprofundando-se em reflexões sobre identidade, resistência e pertencimento, além de questionar os padrões normativos da sociedade.

Em cena, ela navega por caminhos pelas águas da sua ancestralidade. "Eu nasci em uma família de sambistas, de Guadalupe, me formei em dança na UFRJ e hoje sou passista do Salgueiro. Então, para mim, era um sonho construir um espetáculo onde eu possa compartilhar minha travessia por todas essas encruzilhadas, falando sobre as coisas que eu acho importantes serem ditas e questionadas", conta.

Antes mesmo de se tornar um espetáculo completo, "Em Gira: Ela Encruzilhada" já havia cruzado fronteiras internacionais. "Esse espetáculo nasce como uma performance, que construí junto a diretora Cátia Costa a convite de um festival em Istambul. Apresentei ela primeiro no Quilombo Casa do Nando, no Rio, depois seguimos para uma tour onde passamos pela Turquia, França e Cabo Verde", conta a passista.

A partir de suas mitologias pessoais, Iara segue seu curso por encruzilhadas que revelam, como possibilidades, energias sagradas, performadas por uma poética do corpo-água. "Dessa forma, o espetáculo traz à cena os encantamentos e sagacidade de Oxum, sapiência de Iansã, a desobediência de Menina e a combatividade de Mulambo", destaca.

O samba e o carnaval encharcam os saberes desse corpo-memória. Através da dança dos improvisos, faz dos desequilíbrios, gingas e sincopes, estratégias de resistência dos corpos negros na diáspora africana no Rio na busca por preencher os violentos vazios provocados pelo sistema colonial.

"Eu espero provocar o público a refletir e questionar os padrões dessa sociedade que pune mulheres negras que dispõem de sua beleza como querem e julga a passista como um estereótipo sexualizado", defende Iara.

Sob a direção de Cátia Costa, o espetáculo propõe um mergulho na afro dramaturgia ancestral e nas poéticas do corpo-tempo. Através de macumbarias e giras insurgentes constrói caminhos como possibilidade, ou seja, não só um único sentido ou direção, fazendo do improviso um princípio de sabedoria e resiliência.

Com trilha sonora composta por Bruno Barreto, ele se inspira no samba e nos batuques de terreiro, criando um ambiente sonoro fluido, repleto de melodias ancestrais. As giras, espirais e encruzilhadas permeiam não apenas a performance, mas também pela Luz assinada por Brisa Lima e cenário e figurino, com peças feitas artesanalmente pela artista Vânia Soares, que transformam o espaço em uma arena fluida, onde a barreira entre público e cena se tornam líquidas.

O espetáculo é uma realização do Sesc Pulsar e integra a programação da quarta edição de "O Corpo Negro - Festival de dança e protagonismo". Os ingressos são gratuitos e serão distribuídos 30 minutos antes de cada apresentação.

SERVIÇO

EM GIRA: ELA ENCRUZILHADA

Sala Multiuso do Sesc Copacabana (Rua Domingos Ferreira, 160 - Copacabana)

De 16 a 26/5, de quinta a domingo (19h) | Grátis, com distribuição de senhas 30 minutos antes de cada apresentação